Festival do Rio: bons
filmes para acompanhar – parte 2
A 27ª edição do Festival
do Rio continua até o dia 12 de outubro na capital carioca, trazendo mais de
300 filmes para o público. Dentre os títulos, longas premiados nos principais
festivais do mundo, como Cannes, Sundance, Veneza e Berlim, e alguns
pré-selecionados ao Oscar de 2026. Vitrine do cinema brasileiro e um dos
festivais mais importantes do país, o Festival do Rio, criado em 1999, é
apresentado pelo Ministério da Cultura, Shell e Prefeitura do Rio. Tem
patrocínio master da Shell através da Lei Federal de Incentivo à Cultura, e
apoio especial da Prefeitura do Rio – por meio da RioFilme, órgão que integra a
Secretaria Municipal de Cultura. Realização: Cinema do Rio e Ministério da
Cultura/Governo Federal. Confira abaixo mais títulos que conferi no festival e
recomendo.
Couture
Angelina Jolie é a
estrela do novo filme da cineasta francesa Alice Winocour, de ‘Transtorno’ (2015)
e ‘A jornada’ (2019), que acaba de estrear no Festival do Rio – ainda sem data
para entrar nos cinemas brasileiros e sem título em português (‘Couture’
significa ‘Alta costura’). Angelina está lindíssima e bem fotografada,
interpretando o papel de uma diretora de cinema que viaja a Paris para filmar a
temporada do Fashion Week. Enquanto prepara o estúdio e as modelos, aguarda
ansiosamente os resultados de um exame médico que fez nos Estados Unidos (de câncer).
Os fragmentos da trajetória dessa mulher se entrelaçam com os de outras duas
personagens femininas: uma modelo sul-sudanesa de 18 anos (Anyier Anei), que
está no mesmo evento, em seu primeiro trabalho na passarela, e uma maquiadora (Ella
Rumpf) que trabalha sem descanso. Cada uma a seu modo enfrenta os incansáveis
dias da Semana de Moda ao mesmo tempo em que lidam com questões íntimas. Um bonito
e correto filme sobre o universo feminino no mundo da moda, energicamente
interpretado pelo trio central de atrizes. No elenco vemos Vincent Lindon como
um médico e Louis Garrel como o par romântico de Angelina. Selecionado para a
competição do Festival Internacional de Cinema de San Sebastián 2025, foi exibido
nos festivais de Toronto e Roma. Ainda em exibição do Festival do Rio nos dias
10 e 12/10.
Alpha
Depois de despontar no
cinema francês com seus filmes visceralmente violentos e indigestos, Julia
Ducournau retorna ao body horror neste trabalho mais pessoal, com menos sangue
e com alta carga de densidade dramática. Exibido em Cannes, onde concorreu à Palma
de Ouro e ao Queer Palm, o filme faz uma alegoria a Aids ao contar a história
de Alpha (Mélissa Boros), uma garota de 13 anos que mora com a mãe, uma médica (Golshifteh
Farahani) que cuida de pacientes com uma estranha doença, um vírus
transmissível que os transforma em mármore. A cidade registra uma epidemia
desta doença cruel, que petrifica as vítimas. Certo dia, Alpha retorna para
casa com uma tatuagem no braço, que infecciona. Ela passa a ser cuidada pela
mãe e por um tio usuário de drogas, Amin (Tahar Rahim – num papel assustador, em
que perdeu bastante peso). Alpha sofre bullying na escola devido àquela inflamação
no braço, que sangra a todo momento. Ela também se apaixona por um colega de
classe. Não é tão chocante quanto ‘Grave/Raw’ e ‘Titane’, pra mim os dois
melhores trabalhos de Ducournau, porém ainda impacta nos causando desconforto. Os
elementos visuais são um destaque a parte tanto aqui quanto em seus outros filmes,
uns bizarros e outros trágicos. Ainda em exibição do Festival do Rio no dia
10/10.
Valor sentimental
Mais um filme da Mubi que
teve sessões lotadas no Festival do Rio e é forte candidato ao Oscar de 2026 –
acho que receberá indicações de filme estrangeiro, diretor, roteiro original e
elenco (Renate Reinsve, Stellan Skarsgård e Elle Fanning, que estão formidáveis).
Produção Noruega/Suécia do renomado diretor e roteirista dinamarquês Joachim
Trier, de ‘Oslo, 31 de agosto’ (2011), ‘Thelma’ (2017) e ‘A pior pessoa do mundo’
(2021), é um filme de drama em torno de duas gerações de uma família ligada ao
mundo do cinema. As irmãs Nora e Agnes reencontram o pai distante, Gustav, que
no passado foi um exímio diretor de filmes. Ele deve retornar em uma nova
produção, que contará com Nora num dos papeis. A filha acaba recusando a
proposta, e o trabalho é entregue a uma jovem estrela de Hollywood, que viaja até
a casa da família para ler o roteiro. A dinâmica familiar é alterada com a
presença da garota americana, que passa a conviver com os problemas diários dos
Borg. Um filme de sentimentos aflorados, reconciliação e metalinguagem - em que
o mundo do cinema se confunde com o real, num trabalho certeiro do primoroso
elenco. Fotografia estupenda, e um Trier que sabe explorar as expressões do
elenco, desde os olhares tortos aos gestos corporais que ajudam a entender as
angústias de cada integrante daquela família em crise. Vencedor do Grand Prix no
Festival de Cannes, foi exibido também nos festivais de Locarno, Toronto e San
Sebastián. Ainda em exibição do Festival do Rio nos dias 10 e 12/10.
The mastermind
Drama com elementos de
suspense que acompanha a ascensão no mundo do crime de um ladrão de quadros na
Nova Inglaterra dos anos 70. Josh O’Connor vem brilhando em filmes como ‘Rivais’
e ‘La Chimera’, e aqui bem interpreta o protagonista, um ágil criminoso amador que
tem bom gosto e sabe como ninguém surrupiar objetos de arte em museus. Ele é o ‘cabeça’,
o ‘mastermind’ de um pequeno grupo de assaltantes – na verdade três, sendo ele
e dois atrapalhados comparsas. Ele tem uma família e até utiliza um dos filhos
para ajudar nos atos infracionais. Não fica claro o período que transcorre a
trama, porém reconhecemos os anos 70 pelo contexto da Guerra do Vietnã e do
movimento hippie que aparece nos diálogos e em sinais dos figurantes; aliás,
boa composição de direção de arte e figurinos. A fotografia de época com paletas
de cores suaves é uma excelência artística da cineasta autoral e que vem do
cinema independente Kelly Reichardt, a mesma de ‘Movimentos noturnos’ (2013) e ‘First
cow’ (2019). Josh está muito bem, num de seus melhores trabalhos no cinema, ao
lado de um elenco afinado, mesmo em participações especiais, como Alana Haim (como
a esposa), Hope Davis e Bill Camp (que interpretam os pais dele). Observo muito
o design dos créditos, e o de abertura, aqui, todo verticalizado, é o máximo.
Lançamento da Mubi em parceria com a Imagem Filmes, tem mais uma exibição no
Festival do Rio, no dia 12/10. Estreará nos cinemas em 16/10 e mais pra frente
na plataforma da Mubi.
Órfão
Um dos filmes mais
emocionantes exibidos no Festival do Rio, o complexo drama biográfico húngaro disputa
uma vaga na categoria de filme estrangeiro no Oscar 2026. Também produção da
Mubi, traz a desafiadora jornada de um garoto judeu chamado Andor na Budapeste
do fim dos anos 50. Ele mora sozinho com a mãe, não sabe quem é seu pai e,
decidido a encontrar uma resposta, sai em busca de seu paradeiro. Os dias serão
cansativos e cruéis, já que a sociedade em que ele vive é cerceada e vigiada,
após uma longa revolta contra o regime comunista. Até que o menino recebe uma
informação preciosa – de que seu pai possa ser um açougueiro violento, ligado
ao comunismo e que coordena um grupo da resistência clandestina – uma
performance fenomenal do ator francês Grégory Gadebois. Assista com atenção redobrada
nos diálogos, pois são infinitas as informações que vão chegando sobre esses
personagens repletos de camadas e situações de encontros e desencontros. Indicado
ao Leão de Ouro em Veneza, é assinado pelo diretor húngaro László Nemes, de ‘O
filho de Saul’ (2015), que ganhou o Oscar de filme estrangeiro – repare que ele
utiliza aqui a mesma fotografia em tom de amarelo e cinza. Ainda em exibição do
Festival do Rio no dia 12/10.
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