quarta-feira, 8 de outubro de 2025

Especial de cinema

 
Festival do Rio: bons filmes para acompanhar
 
A 27ª edição do Festival do Rio continua até o dia 12 de outubro na capital carioca, trazendo mais de 300 filmes para o público. Dentre os títulos, longas premiados nos principais festivais do mundo, como Cannes, Sundance, Veneza e Berlim, e alguns pré-selecionados ao Oscar de 2026. Vitrine do cinema brasileiro e um dos festivais mais importantes do país, o Festival do Rio, criado em 1999, é apresentado pelo Ministério da Cultura, Shell e Prefeitura do Rio. Tem patrocínio master da Shell através da Lei Federal de Incentivo à Cultura, e apoio especial da Prefeitura do Rio – por meio da RioFilme, órgão que integra a Secretaria Municipal de Cultura. Realização: Cinema do Rio e Ministério da Cultura/Governo Federal.
Confira abaixo títulos que conferi no festival e recomendo.
 
 
Rua do Pescador, nº 6
 
Segundo longa, e também em formato de documentário, da atriz e cineasta Barbara Paz, que faz aqui uma reflexão sobre as tragédias das enchentes no Rio Grande do Sul em 2024. Exibido no Festival ‘É Tudo Verdade’, o filme tem dois tempos – durante as enchentes, com cenas impactantes da destruição de casas, de animais e pessoas sendo resgatados, e pós-catástrofe, quando moradores da Ilha da Pintada tentam se reerguer semanas depois das inundações. A câmera de Barbara percorre os quatro cantos da Ilha da Pintada (por isso é um road movie) e vai direto ao ponto: capta detalhes da inundação, trazendo cenas precisas daquele pesadelo que afetou quase 500 municípios e atingiu mais de 2,3 milhões de pessoas. Quem fala no documentário são os moradores, em especial pescadores de uma vila daquela ilha. Assim como no longa anterior, em que presta uma homenagem ao exímio diretor e ex-marido, ‘Babenco: Alguém tem que ouvir o coração e dizer parou’ (2019), tudo é rodado num sublime preto-e-branco. Assistam até o último segundo dos créditos, pois o filme continua. Distribuição da Lança Filmes, entra em breve nos cinemas brasileiros. Ainda em exibição do Festival do Rio nos dias 08 e 10/10.
 

 
Twinless
 
Exibido nos festivais norte-americanos de Tribeca e Sundance, onde ganhou dois prêmios especiais, dentre eles o do público, a comédia dramática escrita, dirigida e protagonizada por James Sweeney aborda um relacionamento gay confuso e cheio de nuances. Ele interpreta Dennis, um jovem inteligente, mas muito irônico, que tem dificuldade em relacionamentos; em um grupo de apoio para pessoas que perderam seu irmão gêmeo, conhece Roman – papel de Dylan O’Brien, da franquia ‘Maze runner’, um rapaz solitário, em processo de luto. De uma amizade colorida surge um forte vínculo nesse momento delicado em que passam. Com humor negro e cenas engraçadas de sexo, o filme trabalha, de forma humana e espirituosa, temas como reconhecimento e pertencimento, além, claro, da ressignificação do luto. Sem título em português, a tradução seria ‘Sem o gêmeo’. A dupla está muito bem, e o longa conta com participação da atriz Lauren Graham, protagonista da premiada série ‘Gilmore girls’. Ainda em exibição do Festival do Rio no dia 08/10.

 
 
Um poeta
 
Longa colombiano, coprodução Alemanha e Suécia, é um dos bons destaques do Festival do Rio 2025, uma comédia dramática com um personagem azarado e sofredor – a fita foi concebida como comédia, a gente ri muito das situações, mas no fundo, no fundo, é um drama pesado o que se sucede na vida do coitado personagem central. Em Medellín, um professor cansado e também um poeta sem sucesso chamado Óscar Restrepo (Ubeimar Rios – grande revelação neste filme) encontra esperanças quando descobre que uma aluna sua, Yurlady, é uma exímia poetisa. Afundado no álcool e sempre cobrado pela mãe idosa, ele faz de tudo para que a menina mostre seu talento para o mundo, incentivando-a a participar de concursos de literatura e poesia. A família dela reluta, mas aceita o professor se aproximar da jovem, até que uma malfadada noite terminará em caos. O personagem do professor transita entre a emoção e o humor, uma figura cheia de camadas numa história intensa. Filmado em 16mm, com câmera na mão balançando, tem essa estética mais pessoal e independente, do mesmo diretor de ‘Amparo’ (2021), Simón Mesa Soto. Recebeu prêmio especial do Júri na mostra Un Certain Regard do Festival de Cannes 2025. Ainda em exibição do Festival do Rio no dia 09/10.


 
Se eu tivesse pernas, eu te chutaria
 
Aguardadíssimo filme no Festival do Rio, o drama com humor negro e mistério é um show de interpretação da atriz Rose Byrne, que pelo papel ganhou o prêmio de atriz no Festival de Berlim – e deve ser, até que enfim, indicada ao Oscar. Outro filme em que o humor está ali, instalado, dentro de uma história altamente dramática, de uma personagem que se depara com uma sucessão de problemas e quase enlouquece - quando rimos, é de um riso nervoso.  Rose Byrne interpreta uma terapeuta que vê sua vida desmoronar em poucos dias. Ela cuida sozinha da filha pequena (nunca aparece o rosto da garotinha, apenas voz e mãos) que está doente e utiliza uma sonda gástrica para se alimentar. O marido está em viagem e também nunca aparece. A casa onde mora inunda, então ela se muda para um motel onde inicia um conflito com a recepcionista do lugar. Uma paciente em crise a deixa aflita, seu psicólogo tem comportamento agressivo, um acidente de carro a deixa confusa e por aí segue uma lista enorme de problemas diários, que tiram o sono da terapeuta. O filme, como muitos da A24, traz algo sobrenatural simbólico na história – aqui é uma fenda no teto que inunda o quarto da personagem. Olhando por um prisma mais central, é um drama pesadíssimo, sobre as complexidades de uma mulher que tem de lidar sozinha com tudo ao mesmo tempo. Uma história que nos angustia, com um trabalho impecável e certamente memorável de Rose. Ainda em exibição do Festival do Rio nos dias 10 e 12/10.
 

 
Vida privada
 
Jodie Foster falando francês em seu novo trabalho, uma fita francesa independente da diretora e roteirista Rebecca Zlotowski, de ‘Grand Central’ (2013) e ‘A prima Sofia’ (2019). Ela está super bem, destacada na tela, num papel vigoroso de uma psiquiatra, Lilian Steiner, obcecada em entender os motivos da morte de uma antiga paciente, Paula (papel em flashbacks de Virginie Efira). A causa foi apontada como suicídio, mas ela desconfia e inicia uma investigação pessoal sobre o ocorrido. A busca pelas respostas a leva a uma série de situações novas, como a reaproximação com o ex-marido, também médico (papel do grande ator francês Daniel Auteuil) e com o filho distante que acabou de ter um bebê (Vincent Lacoste). Ela suspeita que a paciente tenha sido assassinada, e descobre que pessoas próximas da falecida tinham motivos para matá-la. Um filme que vai em crescente dentro de uma teia de investigação e mistério, com momentos de suspense e um sofisticado humor francês. Além dos já mencionados, outros nomes de peso do cinema europeu aparecem em cena, como Mathieu Amalric, Irène Jacob e a veterana Aurore Clément. Até o documentarista Frederick Wiseman surge numa pontinha. A abertura é um barato, tocando Psycho Killer, de Talking Heads, com créditos em letra cursiva que parecem rastro de sangue. Exibido no Festival San Sebastián e Hors Concours no Festival de Cannes 2025, o filme está previsto para estrear ainda neste ano pela Sony Pictures. Ainda em exibição do Festival do Rio no dia 12/10.


 
La grazia
 
Seis filmes da Mubi integram a programação 2025 do Festival do Rio: ‘La grazia’, ‘Órfão’, ‘Valor sentimental’, ‘Alpha’, ‘The mastermind’ e ‘Morra, amor’ – vi os cinco primeiros e verei o último no sábado. A Mubi é uma das queridinhas dos cinéfilos que percorrem festivais de cinema, provedora que traz em seu catálogo filmes independentes e outros premiados – dos seis da lista do Festival do Rio, cinco são fortes candidatos a disputar vaga no Oscar de 2026. ‘La grazia’ é o novo Paolo Sorrentino, diretor italiano celebrado, cultuado pelo mundo, de ‘A grande beleza’ e ‘Parthenope’, que vi no Festival do Rio do ano passado. Seu novo longa é mais uma sátira social inteligente repleta de metáforas e referências diretas ao mundo da política. O grande ator Toni Servillo, parceiro frequente de Sorrentino, interpreta o presidente da Itália, Mariano de Santis, um homem indagador e que observa tudo ao seu redor. Viúvo, sente diariamente a falta da esposa; católico ferrenho, abre uma crise consigo e com o partido quando é forçado a assinar a lei de eutanásia e dois pedidos de perdão relacionados a homicídios do passado – por isso, ele tem de dar a ‘graça’ aos envolvidos. Dilemas morais e éticos tiram seu sono nos últimos dias de seu governo, enquanto tem de escolher nomes para sua sucessão. Filme de abertura do Festival de Veneza, onde ganhou sete prêmios, dentre eles melhor ator para Servillo, é uma obra complexa, assim como todo filme de Sorrentino – aqui ele está mais contido com as exuberâncias nos personagens, pisando mais no chão, mas nunca deixando seu estilo inusitado de contar grandes histórias. Ainda em exibição do Festival do Rio nos dias 10 e 12/10.



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