sábado, 11 de outubro de 2025

Especial de cinema

 
Festival do Rio: bons filmes para acompanhar – parte 4
 
A 27ª edição do Festival do Rio termina amanhã, dia 12/10, porém haverá, como de praxe, a repescagem – entre os dias 13 e 16/10. Neste ano foram exibidos mais de 300 filmes de 87 países, muitos deles em première. Vitrine do cinema brasileiro e um dos festivais mais importantes do país, o Festival do Rio, criado em 1999, é apresentado pelo Ministério da Cultura, Shell e Prefeitura do Rio. Confira abaixo mais títulos que conferi no festival e recomendo.
 
 
Conselhos de um serial killer aposentado
 
Vencedor do prêmio do público no Festival de Tribeca de 2024, este é o primeiro filme americano do diretor turco Tolga Karaçelik, que lá em sua terra fez fitas policial e comédia ousadas. Aqui ele junta os dois gêneros e salpica pitadas de horror, num resultado mega curioso, que merece atenção. Na mirabolante trama, um escritor com bloqueio criativo (John Magaro, de ‘Amores materialistas’) se aproxima de um homem que descobre ser um assassino aposentado (Steve Buscemi, de ‘Fargo’). O encontro casual se transforma numa amizade, e da noite para o dia o velho serial killer vai ajudar o escritor com conselhos terapêuticos para casais em crise. A relação entre os dois se transforma numa espécie de pesadelo – que nunca sabemos como vai terminar. Com humor ácido e por vezes macabro, o filme é marcado por bons diálogos e um crescente clima de tensão – ainda mais quando surge na história a esposa do escritor, interpretado pela vencedora do Emmy Britt Lower, num papel excepcional. Buscemi, especializado em vilões, arrasa no papel-título, um serial killer que se transforma, sem querer, em terapeuta. Ainda haverá sessão hoje no Festival do Rio, dia 11, e na repescagem, no dia 13. Estreia nos cinemas brasileiros pela Synapse Distribution a partir do dia 16/10.
 


O pavão
 
Exibido na Semana da Crítica do Festival de Veneza de 2024, a produção Áustria/Alemanha, da Mubi, é uma comédia dramática cult que marca a estreia em longa-metragem do roteirista e diretor Bernhard Wenger – que demonstra ter boas ideias. O alemão Albrecht Schuch, ator de ‘Transtorno explosivo’ e ‘Nada de novo no front’, protagoniza como Matthias, um rapaz que tem um emprego inusitadíssimo: ele é diretor de uma agência de aluguel de amigos chamada ‘MyCompanion’. E também é o funcionário do próprio negócio – apesar de tímido, ele assume o papel que seus clientes contratam, como um namorado, um motorista ou um colega de treino de academia. Mudando constantemente de personalidade para satisfazer as pessoas que precisam de alguém, Matthias agora precisa autoafirmar a própria identidade. É um barato esse filme que estreou no Festival do Rio, uma sátira social sobre alguém em busca de aprovação na era da rede social – e que por causa disso, deixa o seu ‘eu’ de lado. A comédia rola solta e rimos muito porque o ator é bom, fazendo o filme acontecer. Terá ainda uma última sessão no festival amanhã, dia 12. E a partir de amanhã entra na Mubi, para assinantes.
 

 
O estrangeiro
 
François Ozon, aclamado diretor francês que realiza até dois filmes por ano, fez uma belíssima e atualizada versão para o cinema do clássico livro ‘O estrangeiro’, de Albert Camus, publicado originalmente em 1942. Ultimamente Ozon roda seus filmes em PB e aqui repete a dose, recorrendo a uma fotografia de brilhar os olhos – situada na Argélia da década de 30, quando ainda colônia da França. Observador, Meursault (Benjamin Voisin, que trabalhou com o diretor em ‘Verão de 85’) é um rapaz fechado em seu mundo próprio, sem empatia pelos outros. Faz sexo com uma jovem e diz a ela que não sente atração nem desejo por ninguém. Num dia de sol, comete um assassinato na praia e vai para julgamento. Pensativo sobre a morte recente da mãe, ele se põe a questionar seus feitos, trancado numa cela enquanto aguarda seus dias finais – já que ele pode ser guilhotinado, caso seja culpado pelo crime. Tanto livro quanto a versão de Ozon trabalham temas comuns no universo de Camus, como alienação e indiferença ao mundo e aos outros. Filosófico, na linha do existencialismo, é uma obra madura do cineasta, que marca sua nova fase de criação. Voisin, o ator principal, compila a essência do personagem Meursault com seus olhares apáticos e constante desinteresse pelas pessoas que cruzam seu caminho. Sessão na repescagem do Festival do Rio no dia 14/10.
 

 
Madre
 
Saí de queixo caído da sessão esvaziada de ‘Madre’ ontem à noite no Estação Net Rio, pra mim um dos melhores filmes do Festival do Rio deste ano. Que atuação grandiosa de Noomi Rapace, atriz sueca que ainda não recebeu o devido reconhecimento pela carreira. Exibido na seção Horizons do Festival de Veneza deste ano, o drama se inspira na vida de Madre Teresa antes de se tornar ‘de Calcutá’. São sete dias decisivos na vida da religiosa, trancada numa comunidade que fundou, de ajuda aos pobres na Índia, enquanto aguarda a liberação do Papa para froamlizar sua congregação de irmãs missionárias. Serão sete dias onde conheceremos Teresa e suas complexidades – o trabalho árduo nas ruas levando comida aos esfomeados, curando feridas dos andarilhos e um conflito com uma noviça em que questionará a fé e a moral da igreja. Nascida na Macedônia do Norte e de família albanesa, Madre Teresa tornou-se símbolo da Igreja Católica e da justiça social. Rapace entrega um trabalho perfeito com os altos e baixos da madre, com humanidade e sensatez. Não é uma cinebiografia tradicional, os lances originais estão na estética criada pela diretora, natural da terra de Madre Teresa, a macedônia Teona Strugar Mitevska, de ‘Deus é mulher e seu nome é Petúnia’ – ela escreve e dirige com uma linguagem peculiar, captando ângulos imperfeitos, por baixo e por cima, colocando a atriz fora do quadro, cortando o rosto dela, algumas cenas em stop-motion com trilha de rock e por aí vai. Um filmão que merece exibição nos cinemas. Ainda em exibição no Festival do Rio no dia 12/10.


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