domingo, 30 de março de 2025

Estreias da semana – Nos cinemas - Parte 1


Quando chega o outono

 

François Ozon já provou ser um cineasta autoral dos mais sensíveis com seus filmes intensos que mesclam gêneros. Para mim um diretor formidável, exímio representante do atual cinema francês. Festivais renomados como Cannes, Berlim e Veneza, e até o Bafta, já exibiram seus longas-metragens nos últimos 25 anos. Tenho boa memória de obras como ‘8 mulheres’ (2002), ‘Swimming pool – À beira da piscina’ (2003), ‘O tempo que resta’ (2005), ‘Potiche – Esposa troféu’ (2010), ‘Dentro de casa’ (2012), ‘Jovem e bela’ (2013), ‘Uma nova amiga’ (2014), ‘O amante duplo’ (2017), ‘Graças a Deus’ (2018), ‘Verão de 85’ (2020) e ‘Está tudo bem’ (2021) – veja que ele faz de um a dois filmes por ano, de comédia dramática a suspense, e seus trabalhos continuam atuais, sempre com algo a nos contar. ‘Quando chega o outono’ (2024) é seu novíssimo trabalho, exibido no festival de San Sebastian e lançado nesse fim de semana nos cinemas brasileiros pela Pandora Filmes. Bucólico, dramático, com vieses de um humor que arranca estranhos risos, o filme transcorre num vilarejo distante em Borgonha, na França, onde vive uma solitária senhora, que se dedica à casa e ao extenso jardim com horta, Michelle (papel da veterana atriz Hélène Vincent, aos 81 anos, de ‘A liberdade é azul’). Ela espera ansiosa a chegada da filha e do neto, que vem de Paris passar alguns dias no campo. Sua melhor amiga é Marie-Claude, uma idosa cujo filho, que cumpre pena na prisão, está para ser solto (papel de outra veterana, que gosto muito, a septuagenária Josiane Balasko, de ‘Uma cama para três’). Aposentadas, as duas moram perto e passam tempo juntas na tranquilidade daquela cidadezinha campestre. Michelle acaba em atritos com a filha, Valérie (Ludivine Sagnier, do seriado ‘Lupin’), que repudia o passado da mãe – que será revelado depois. No jantar, a mãe idosa serve para a filha e para o neto cogumelos, sem saber que são venenosos - somente Valérie consome, passa mal e vai para o hospital, e a partir daí uma sucessão de acontecimentos desgastará a relação daquela família e da amizade de Michelle com Marie-Claude, inclusive haverá um crime brutal.
Nesse filme cheio de idas, vindas e reviravoltas, com momentos brilhantes, outros charmosos e com um elenco maravilhoso com personagens repletos de camadas, Ozon constrói uma trama que parece uma fábula moderna sobre relação de pais e filhos, que carregam sentimento de culpa/remorso e com o passado que arromba a porta. É uma obra fascinante que começa como um filme leve, nas lindas paisagens de campo, e aos poucos a tensão aumenta o tom para um retumbante drama familiar. Mais um Ozon a se conhecer e admirar.




Mário de Andrade: O turista aprendiz

 

Documentário e drama com leve humor se fundem nesse interessantíssimo filme sobre uma parte da vida do escritor, poeta, crítico e musicólogo paulistano Mário de Andrade (1893-1945), fundador do movimento modernista de 22. Mente brilhante, homem multifacetado e romancista de uma das obras mais festejadas daquele período, ‘Macunaíma’, Andrade escreveu um romance menos lembrado, ‘O turista aprendiz’, publicada um ano depois de ‘Macunaíma’, em 1929. Nele, faz uma viagem pelo Brasil, para regiões remotas do Norte, mostrando a variedade cultural do extenso país. O filme se apoia nos manuscritos, espécie de diários, de um Andrade inquieto, quando de uma expedição que participou em 1927 pelo Amazonas e culminaria nos textos do livro ‘O turista aprendiz’. Na longa viagem, conheceu e registrou as comunidades indígenas e ribeirinhas, além da arte, da fauna e da flora do lugar. Essas anotações só seriam públicas dois anos antes da morte dele, em 1943. Aqui, há uma adaptação dessa aventura por lugares exóticos, que recontam a História do Brasil. É o ponto de vista de Mário de Andrade, como se o filme estivesse onisciente, dentro da cabeça do escritor, numa mistura poética de realidade e ficção. Enquanto os minutos correm, vemos fotos de Andrade no rio Amazonas, pinturas sobre ele, o escritor em frente ao microfone contando causos, cantando estirado numa espreguiçadeira, datilografando e recebendo indígenas. É um Andrade de malas prontas para viajar a fim de redescobrir os grotões de um Brasil imenso, profundo e pouco falado. Vi o filme com fascínio e curiosidade, um trabalho de mestre de Murilo Salles, cineasta veterano, de ‘Nunca fomos tão felizes’ (1984), ‘Como nascem os anjos’ (1996) e ‘Nome próprio’ (2007). A grande intepretação do ator Rodrigo Mercadante como o protagonista vai além dos limites do filme – o ator é muito parecido com o escritor e há 25 anos o interpreta em peças, performances, shows musicais e projetos audiovisuais. A estética do longa também é um ponto alto, alternando cor, preto-e-branco, telas divididas, montagens inusitadas, com Andrade falando para a câmera e até ele num fundo rosa com faixa de miss num desfile de moda! Conheçam. Nos cinemas brasileiros com distribuição da Cinema Brasil Digital.




O bom professor

 

A Mares Filmes surpreende com seu catálogo, maior parte dele com fitas europeias de festivais. Nesse ano a Mares lançou nos cinemas brasileiros dois longas-metragens do Oscar 2025, ‘Flow’ (2024), animação da Letônia ganhadora na categoria, e ‘A semente do fruto sagrado’ (2024, vencedor de cinco prêmios em Cannes), indicado como melhor filme estrangeiro; e para os próximos meses já anunciou a distribuição de ‘Memórias de um caracol’ (2024 – também indicado ao Oscar de animação) e ‘Bolero – A melodia eterna’ (2024 – exibido no Festival de Rotterdã). O novo filme em cartaz da Mares Filmes é ‘O bom professor’ (2024), contundente drama franco-belga que teve première no Brasil na última edição do Festival Varilux, em novembro passado. Estrelado pelo ator François Civil, de ‘Amor à segunda vista’ (2019), conta a história de um dedicado professor de Ensino Médio indevidamente acusado de assediar uma estudante. A acusação é em decorrência de uma má interpretação dos alunos, após Julien tentar criar vínculos com a turma e dar atenção especial à sala. Julien, que esconde ser gay, vira alvo dos estudantes, inclusive dos pais dos alunos e de parte dos colegas de trabalho. A escola fica dividida com uma questão: o professor cometeu ou não assédio contra a jovem?
Civil, um ator convincente e fotogênico, traz nas expressões faciais todo o dilema dramático vivido com os boatos de ser assediador – desde o início do filme sabemos que ele é inocente, mas pelo olhar dos alunos e da sociedade, ele já foi ‘julgado e condenado’, sendo, portanto, um criminoso que não pode mais pisar na escola. É um filme sobre uma realidade dura, a do ensino público na França, com alunos de contextos familiares adversos, e como os professores estão sujeitos a julgamentos e abandono – aos poucos o protagonista é rejeitado até pelo próprio namorado diante da crise que se instala. Escrito e dirigido por Teddy Lussi-Modeste, de ‘O preço do sucesso’ (2017, com Tahar Rahim), o filme é um soco no estomago, que nos faz refletir muito. O título original, ‘Pas de vagues’, alude à expressão escolar ‘Sem tumulto’, uma forma de controlar os alunos no instante de gritarias e brigas.



sábado, 29 de março de 2025

Resenhas especiais

 
Um estranho no lago
 
No verão francês, um grupo de homens de diferentes idades se encontram em um lago escondido para encontros sexuais. Franck (Pierre Deladonchamps) conhece Michel (Christophe Paou), e se apaixonam. Só que Michel tem um passado assombroso, que aos poucos vem à tona, colocando a relação dos dois homens em perigo.
 
Um filme de arte polêmico, para adultos (classificação 18 anos), que gerou muitos comentários em Cannes, quando foi exibido em 2013 e lá ganhou dois prêmios, o Queer Palm (entregue a filmes com temática gay) e o de direção no ‘Um certo olhar’, a principal mostra paralela do festival. O filme é dentro de um mesmo espaço, um lago que serve de ponto de encontros sexuais de homens gays. Eles flertam, sentam nas pedras para conversar sobre a vida e depois adentram uma pequena mata onde transam ao ar livre. O verão é quente, as relações são despudoradas e fugazes, os frequentadores de lá trocam de parceiros ao longo da semana. Tudo acontece na orla do lago e na mata, nunca vemos os personagens fora dali – há apenas uma cena exterior, no estacionamento da entrada do lago, na abertura do filme. O longa conecta-se ao primeiro trabalho do diretor, um curta-metragem chamado ‘Les héros sont immortels’ (1990), com o próprio diretor Alain Guiraudie atuando – é a história de um jovem que vai todas as noites até uma mesma praça encontrar-se com um rapaz, e sentados passam horas conversando. Em ‘Um estranho no lago’, o protagonista Franck, vivido por Pierre Deladonchamps, de ‘Conquistar, amar e viver intensamente’ (2018), também se senta na beira do lago à espera de alguém. Um deles é o carismático personagem do solitário Henri, que acaba de se separar da namorada, diz ser hétero, mas começa a sentir prazer em ver Franck nu - papel do ótimo veterano Patrick d'Assumçao, de ‘Normandia nua’ (2018). De repente chega ao local um jovem atraente, Michel (Christophe Paou, de ‘Como um chef’, de 2012), que é casado; ele sentirá forte atração pelo protagonista, e juntos iniciam um tórrido relacionamento. Um corpo aparece boiando no lago, então a trama assume um lado policial, uma espécie de thriller psicológico, que provoca uma boa guinada no filme. Enquanto o mistério em torno da morte ronda os frequentadores do lugar, Franck e Michel se sentem cada mais atraídos um pelo outro.




É o quarto filme do diretor depois de médias e curtas-metragens, talvez um dos mais sofisticados e especiais dele, com uma história particular do cineasta – na juventude diz ter frequentado um lago de pegação gay na França, e parte dos personagens são inspirados em gente que ele teve contato. Atenção para duas cenas de sexo explícito, bem ousadas, que são provocadoras.
Gravado na Garganta de Verdon, uma região de desfiladeiros, ilhas e cortada pelo rio Verdon, no sudeste da França, local cenograficamente belo, com imagens paradisíacas. Não há trilha sonora alguma, só ouvimos sons de vento e riachos, que foram captados nesse ambiente aberto, o que torna o filme ainda mais misterioso. Tem um final-surpresa e ao mesmo tempo ambíguo.
Dois meses atrás, o novo filme do diretor entrou nos cinemas, ‘Misericórdia’ (2024), comédia dramática com humor negro indicada ao Queer Palm, também com personagens gays e trama ousada – aliás, em seus filmes há sempre gays e momentos inusitados de sexo, como fez em ‘Na vertical’ (2016). Disponível em bluray pela Imovision, com extras no disco, dentre eles um final alternativo - um desfecho mais redondo e menos simbólico que o original. Também está na plataforma online Reserva Imovision.
 
Um estranho no lago (L'inconnu du lac). França, 2013, 100 minutos. Drama/Suspense. Colorido. Dirigido por Alain Guiraudie. Distribuição: Imovision


O Babadook
 
Enlutada pela morte do marido, Amelia (Essie Davis) cuida sozinha do filho pequeno, Samuel (Noah Wiseman). Ela tem depressão, e seu comportamento começa a ser autodestrutivo. Certo dia, aparece em sua casa um livro infantil chamado ‘Sr. Babadook’, e todas as noites ela lê as histórias para Samuel dormir. O garoto fica fissurado pela leitura, só que a mãe percebe que o livro está afetando negativamente o garoto. Até que a misteriosa criatura da obra literária se manifesta como uma entidade maligna, colocando em risco a integridade de Amelia e Samuel.
 
Apontado, pela crítica e pelo público, como um dos filmes de terror mais assustadores daquele ano, 2014, ‘O Babadook’ é uma fita tensa, de dar arrepios na espinha, fugindo do óbvio e do explícito. As coisas são subentendidas, é um filme de atmosfera, com presente clima de angústia e medo, que torna o longa um terror psicológico de primeira linha. Com um ar de filme de arte/cult, tem elementos aproveitados de grandes clássicos do horror, como ‘O iluminado’ (quanto ao enlouquecimento da mãe que aprisiona o filho em casa) e ainda obras do Expressionismo Alemão – em especial ‘O gabinete do Dr. Caligari’ (1920), nas sombras, no adorno e no preto-e-branco da concepção de Babadook. Há poucos, mas eficientes jumpscares, que fazem o coração pular fora do peito.
É um projeto pessoal da diretora australiana Jennifer Kent, que nasceu quase dez anos antes, com o curta-metragem ‘Monstro’ (2005), sobre uma mãe que luta para proteger o filho após um monstro aparecer no armário. Com esse mote original em mãos, Jennifer redimensionou a história para o longa-metragem, apresentando uma mãe viúva e depressiva, que perdeu o marido num acidente de carro. Ela cuida do filho pequeno, de seis anos de idade. Para distrair o menino, começa a ler com ele um estranho livro que encontra na casa onde vivem. É a história de Babadook, uma criatura de chapéu preto e dentes afiados, como se fosse o bicho-papão, que dá lições e faz sutis ameaças. Porém, Babadook não fica só nas páginas – ele sai do livro como uma entidade diabólica, ameaçando mãe e filho.
Não é um terror sangrento, violento, nada disso; aliás, não é só terror:  é um aflitivo drama íntimo, de uma mãe que rejeita o filho, faz torturas psicológicas com ele, como forma de culpá-lo pela morte do esposo - ela estava grávida, a caminho do hospital para dar à luz, quando houve o acidente que vitimou fatalmente o marido. Ou seja, o terror é o da vida real também, do luto, da paranoia, da depressão pós-parto.





Um filme com apenas dois atores em cena, mãe e filho, muito bem interpretados, respectivamente, por Essie Davis, atriz australiana de ‘A verdadeira história de Ned Kelly’ (2019), casada com o diretor Justin Kurzel, e Noah Wiseman, que só fez participações em séries. E preste atenção, ainda mais no final, que é simbólico e trata dos nossos monstros interiores.
Estilizado, cheio de enquadramentos diferentes e uma fotografia formidável, tornou-se cultuado ao longo dos anos. Ganhou prêmios em muitos festivais, foi exibido em Sundance, vitrine do cinema independente, ficou por muito tempo no catálogo da Netflix e recentemente saiu numa luxuosa edição em bluray pela Versátil Home Video – em luva reforçada, com livreto e mais de 1h30 de extras.
 
O Babadook (The Babadook). Austrália/Canadá, 2014, 94 minutos. Terror/Drama. Colorido. Dirigido por Jennifer Kent. Distribuição: Versátil Home Video

sexta-feira, 28 de março de 2025

Resenhas especiais


Cinema anos 80: dois filmes para ver em casa em DVD e bluray.


Amores eletrônicos
 
Aficionado por computação, o arquiteto Miles (Lenny von Dohlen) desenvolve uma paixão avassaladora pela vizinha, uma jovem violoncelista (Virginia Madsen). Mas para que o romance entre eles dê certo, Miles terá de encarar o ciúme doentio de seu próprio computador, que adquire vida e não o deixa em paz.
 
Uma comédia romântica sci-fi – olhe que inusitado - das mais divertidas dos anos 80, uma verdadeira pérola resgatada em DVD pela Versátil Home Vídeo, que agora pode ser vista e revista em casa. E veja que o filme não é apenas um entretenimento engraçadinho - ele já tocava em temas sensíveis que culminariam no que vivemos hoje, do vício em computador e como a máquina nos controla a ponto de causar alienação. O filme já discutia a complexa relação da interação do homem com o computador, numa época pré-internet e bem antes de Inteligência Artificial; no filme o computador do arquiteto só interage com texto, com imagens e rabiscos verdes pouco nítidos, porém ele entra em parafuso quando o jovem derruba champagne no sistema. A máquina passa a controlar a vida do rapaz, e de aliado, torna-se um tormento, quando começa a ter ciúmes de sua tentativa de aproximação com a vizinha violoncelista.
O irlandês Steve Barron dirigiu clipes de bandas famosas, como a-Ha, The Jam e Toto, além de Madonna e Michael Jackson, e estreou aqui na direção, aproveitando a linguagem de videoclipes para fazer esse filme adorável e moderno - depois faria ‘As tartarugas ninja’ (1990), ‘Cônicos e cômicos’ (1993) e ‘Esse rato é um espanto’ (2000), além de episódios de seriados variados.
Conta com trilha sonora do pioneiro da eletromusic Giorgio Moroder, que fez muitas composições para cinema, e aqui fez uma música dançante com Phil Oakley, outro bambambam da música eletrônica, ‘Together in electric dreams’. Duas outras canções de sucesso de 1984 entraram no soundtrack do filme, ‘Love is love’, de Culture Club, e ‘Video!’, de Jeff Lynne.





Traz um bom trabalho de Lenny von Dohlen – o ator faleceu novo, aos 63 anos, em 2022, depois de longa doença, e de Virginia Madsen, irmã mais nova do ator Michael Madsen, em seu segundo filme, aos 22 anos, e depois ficaria conhecida por ‘O mistério de Candyman’ (1992).
Filme disponível no box ‘Clássicos Sci-fi – Anos 80’, da Versátil Home Video, junto de cinco filmes – ‘O domínio do olhar’ (1981), ‘Estranhas metamorfoses’ (1982), ‘A noite do cometa’ (1984), ‘As aventuras de Buckaroo Banzai’ (1984) e ‘Drive-in da morte’ (1986).
 
Amores eletrônicos (Electric Dreams). EUA/Reino Unido, 1984, 95 minutos. Comédia/Romance. Colorido. Dirigido por Steve Barron. Distribuição: Versátil Home Video



La Bamba
 
Cantor e compositor de descendência mexicana, Ritchie Valens (Lou Diamond Phillips) surge na onda inicial do rock and roll no final dos anos 50, despertando a atenção do mundo para suas músicas agitadas e seu estilo próprio no palco. A carreira durou pouco, apenas dois anos, encerrando-se com sua morte trágica e prematura em um acidente de avião em 1959.
 
Cinebiografia do cantor e compositor de família mexicana Ritchie Valens, um filme que fez sucesso nos cinemas e nas reprises da TV. Orçado em U$ 6 milhões, teve uma bilheteria avassaladora para esse estilo de filme, U$ 55 milhões, lançando o ator Lou Diamond Phillips, também de descendência mexicana, e que seria um rosto frequente no cinema americano daquela época – faria, por exemplo, ‘Os jovens pistoleiros’ (1988) e a continuação, ‘Jovem demais para morrer’ (1990). Escrito e dirigido por Luis Valdez, de ‘Bailes mexicanos’ (1981), que fez pouquíssimos filmes, sendo esse seu longa mais conhecido.
O filme abriria as portas para as cinebiografias musicais modernas, resultando numa obra irresistível, de muita energia. Mostra todas as fases da vida de Valens, do nascimento na pobreza, em 1941, numa área rural do subúrbio de Los Angeles, até a morte de avião aos 17 anos. Richard Steven Valenzuela era descendente de mexicanos, foi abandonado pelo pai, criado pela mãe e tinha como melhor amigo o irmão, Bob, que arrumava confusão e o arrastava para as tretas – papel de Esai Morales. Tinha sonho em ser cantor, até que aos 15 anos comprou uma guitarra e formou uma pequena banda. Após 60 tentativas em gravadoras, foi descoberto por um empresário e gravou o primeiro hit, "Come on let's go", em 1958 – ele tinha 16 anos. Meses depois, com o surgimento do rock and roll no mundo, Valens aproveitou o momento e gravou dois outros hits, ‘Donna’, que fala de uma paixão da escola, e ‘La bamba’, releitura de uma música folclórica mexicana. A carreira terminou cedo – no dia 3 de fevereiro de 1959, Valens, com apenas 17 anos, morreu em um acidente aéreo ao lado de dois jovens astros do rock, Buddy Holly e The Big Bopper – o monomotor conduzido por um piloto inexperiente saiu de Iowa com destino a Dakota do Norte, enfrentou uma forte nevasca logo após decolar e caiu em um milharal, matando todos os ocupantes. A tragédia ficou conhecida como "O dia em que a música morreu".





Recebeu indicação ao Globo de Ouro de melhor filme de drama e ao Grammy de melhor canção (‘La Bamba’, cantada para o filme pela banda Los Lobos). É um filme marcante, que na época alegrou e emocionou muita gente, e ainda provoca esse sentimento. Nos primórdios do DVD, em 2003, foi lançado pela Columbia Pictures, e nesse ano saiu numa ótima cópia em bluray pela Classicline, com quase duas horas de extras.
 
La Bamba (Idem). EUA, 1987, 108 minutos. Drama/Musical. Colorido. Dirigido por Luis Valdez. Distribuição: Columbia Pictures (DVD de 2003) e Classicline (Bluray de 2025)

quinta-feira, 27 de março de 2025

Nota de cinema

 

Cine Debate traz inusitado filme ganhador de quatro Oscars que fala da figura da mulher ao longo do tempo

 

O Cine Debate do Imes Catanduva promove nesse sábado, dia 29/03, mais uma sessão do projeto, que conta com parceria do Sesc Catanduva. Dessa vez será exibido o premiado filme do diretor grego Yorgos Lanthimos ‘Pobres criaturas’ (2023), que ganhou quatro Oscars e mistura uma série de temas e gêneros. Coprodução Irlanda, Reino Unido e Estados Unidos, tem no elenco Emma Stone, Mark Ruffalo e Willem Dafoe. A sessão é gratuita e aberta ao público, a partir 14h, no Espaço de Tecnologia e Artes do Sesc Catanduva – atenção apenas para a classificação desse filme, que é 18 anos. A mediação do debate será feita pelo idealizador do Cine Debate, o jornalista, professor do Imes e do Senac e crítico de cinema Felipe Brida.
Sinopse: Jornada incrível e incessante de Bella Baxter (Emma Stone), uma jovem trazida de volta à vida por um cientista brilhante e nada convencional. Em busca das experiências que lhe faltam, Bella parte em uma aventura pelos continentes. Livre dos preconceitos de sua época, ela se fortalece em seu propósito de lutar por igualdade e emancipação.

 



Cine Debate

 

O Cine Debate é um projeto de extensão do curso de Psicologia do IMES Catanduva em parceria o SESC e o SENAC Catanduva. Completa 13 anos em 2025 trazendo filmes cult de maneira gratuita a toda a população. Conheça mais sobre o projeto em https://www.facebook.com/cinedebateimes

terça-feira, 25 de março de 2025

Estreias da semana – Nos cinemas - Parte 2

 

Milton Bituca Nascimento

 

Monstro sagrado da MPB, Milton Nascimento anunciou a aposentadoria em 2022, ao completar 80 anos de idade e 60 de carreira. O documentário ‘Milton Bituca Nascimento’ nasce dessa declaração de pausa dos palcos, pois acompanha a última turnê mundial do consagrado cantor e compositor, mente por trás de clássicos emocionantes como ‘Canção da América’, ‘Cais’, ‘Maria, Maria’, ‘Travessia’ e ‘Coração de estudante’. Entre 2022 e 2023, Nascimento, apelidado de ‘Bituca’, percorreu países como Inglaterra, Estados Unidos e Itália para um show de despedida, além do Brasil. Enquanto há os preparativos para receber o numeroso público, ele, dos quartos de hotéis, andando pelas ruas e dentro do carro conta sobre a longa jornada musical que o trouxe até aqui. Nascimento abre as páginas de sua vida, relembra o passado na época de garoto, a formação do Clube da Esquina em Minas Gerais e o sucesso de suas canções nas vozes dele, de Elis, de Simone e de tantos intérpretes. Amigos como Caetano Veloso, Simone, Ronaldo Bastos, Gilberto Gil, Djamila Ribeiro, João Bosco e os irmãos Lô e Márcio Borges homenageiam o artista com depoimentos precisos, tentando responder como Milton representa um Brasil profundo com sua voz potente e composições singulares. Nomes internacionais aparecem na tela, como Quincy Jones, Spike Lee e Paul Simon – ao todo são 40 entrevistados. Eu, como fã de Milton, curti e me emocionei – além de uma bela narrativa, a parte técnica do longa é excepcional, incluindo montagem, fotografia e as letras dos créditos. Exibido na 28ª Mostra de Cinema de Tiradentes, o documentário é uma produção do Canal Azul, Gullane, Nascimento Música e Claro em associação com Why? Stories Matter, Vital Studios e MoonSailor. Está em exibição nos principais cinemas pela Gullane+.

 


 

Tempo suspenso

 

Exibido no Festival de Berlim de 2024, o último trabalho do diretor e roteirista francês Olivier Assayas é mais um exercício do cineasta para tratar de um tema caro em sua obra: as complexidades amorosas. É uma comédia dramática cujo contexto é a pandemia da Covid- 19. Em abril de 2020, no lockdown na França, dois irmãos se isolam na casa de campo da família, um lugar afastado de qualquer traço social. No meio de bosques e riachos, Etienne (Micha Lescot), diretor de cinema, e Paul (Vincent Macaigne), um jornalista musical, curtem o momento ao lado de suas namoradas. Os dois pensam diferente, têm comportamentos opostos e trancafiados na mesma casa, estranham-se. Os conflitos surgem entre eles e respingam nas namoradas, enquanto o mundo está paralisado na quarentena por causa do terrível vírus. É um filme autoral e com traços autobiográficos, do isolamento do diretor durante a pandemia. Ao assistir ao filme no Festival do Rio de 2024, lembrei-me de dois longas anteriores de Assayas, ‘Horas de verão’ (2008) e ‘Vidas duplas’ (2018), e eles parecem formar uma interessante trilogia, pelas histórias entrelaçadas de um grupo de personagens distintos e aspectos experimentais. Assayas é um diretor de altos e baixos, carrega na filmografia fitas boas e alguns desastres, no entanto ‘Tempo suspenso’ é um de seus melhores trabalhos. Um filme de puro diálogo, com momentos ternos e outros engraçados, voltado para um público cinéfilo que segue fitas cult. Está em exibição nos cinemas das principais capitais brasileiras pela Zeta Filmes.



domingo, 23 de março de 2025

Estreias da semana – Nos cinemas - Parte 1

 

O melhor amigo

 

Depois do sucesso nos cinemas da graciosa comédia inspirada em uma história real ‘Pacarrete’ (2019), o diretor e roteirista cearense Allan Deberton apresenta ao público agora seu novo trabalho, um moderno e agradabilíssimo conto de fadas gay/queer, ‘O melhor amigo’. Rodado na bela região praieira de Canoa Quebrada, no Ceará, o romance musical não passará despercebido, pois contagia e é um sopro de vida com seus personagens carinhosos. Em Canoa Quebrada, os jovens Lucas (Vinicius Teixeira) e Felipe (Gabriel Fuentes) se reencontram, anos depois de um relacionamento nos tempos da faculdade. A paixão entre eles reacende em meio ao calor escaldante da praia, ao som do mar e ao lado de novas pessoas que cruzarão suas vidas. Uma fita solar, de cores vivas e pra cima, que não esconde nem disfarça seu lado brega e altamente romântico. Deberton é um bom contador de histórias e conduz seus personagens que ora nos tocam ora nos causam risos. Os dois atores centrais marcam bem suas presenças, e o elenco coadjuvante traz participações bem legais, como Cláudia Ohana, Mateus Carrieri e a cantora Gretchen como ela mesma, além de nomes do novo cinema cearense, como Dênis Lacerda – na pele da drag queen Deydianne Piaf, Souma, Muriel Cruz e Rodrigo Ferrera. Há canções brasileiras marcantes dos anos 80 e 90 regravadas para o longa, como ‘Amante profissional’ e ‘Conga Conga’. Uma delícia de ver na tela grande e se envolver nessa trama novelesca e bem moderna. Produzido pela Deberton Filmes em coprodução com o Telecine e produção associada da Mistika, está nos cinemas brasileiros pela Vitrine Filmes. PS – O longa é inspirado no curta-metragem homônimo de Deberton, lançado em 2013.

 


 

Girassol vermelho

 

Estreia nos cinemas brasileiros no próximo dia 27 esse filme experimental que dialoga com o absurdo e que antes se chamaria ‘A casa do girassol vermelho’. Uma fita onírica e simbólica, sobre uma longa viagem de trem de um personagem solitário em crise existencial, que também é uma viagem pela sua mente. Chico Diaz, sempre perfeito em seus papeis, sejam eles em comédia ou drama, é um viajante de trem, de nome Romeu. Um homem em busca de liberdade, mas também de respostas. Ele procura se desprender de algo que o perturba. O trem para numa plataforma, e ele desce e anda pelos arredores. É noite, o ambiente está esfumaçado, como um sonho. Não há ninguém, somente ele por ali. Até que é tragado para uma câmara fechada, onde será interrogado e passará por tortura física e psicológica. Sem poder falar o que pensa, percebe que sua liberdade foi tolhida nesse novo mundo opressor. Até que uma mulher misteriosa surge em sua frente.
Filme de abertura da Mostra de Cinema de Tiradentes de 2025, foi inspirado em dois contos do escritor mineiro Murilo Rubião, representante máximo do Realismo Fantástico no Brasil, e tem direção assinado por uma dupla, o multiartista mineiro Eder Santos e codireção de Thiago Villas Boas. De acordo com os diretores, ‘Girassol vermelho’ integra uma trilogia de título "RGB", sigla utilizada no mundo do design e da publicidade que faz referência às cores ‘Red, green, blue’, ou seja, ‘Vermelho, verde e azul’; elas fazem parte de um sistema de combinação de cores fundamentais para os espectros cromáticos. ‘Girassol’ é a parte 2 da trilogia, antes houve ‘Deserto azul’ (2014), e o terceiro capítulo está em desenvolvimento. Eder Santos, conhecido artista gráfico e videoartista, experimenta linguagens tanto em seus trabalhos de artes visuais como no cinema, e faz desse filme um laboratório altamente criativo e inusitado. Quase tudo acontece no mundo real e parte na cabeça do protagonista, e quando as imagens se fundem, não sabemos se o que Romeu vê/presencia é verdade ou ficção.
Filmado em 2023 em uma fábrica de cimento desativada, tem aspectos de teatro; a trama ocorre em ambientes fechados, com cores acinzentadas e a névoa encobrindo os personagens – a fotografia é assinada pelo alemão Stefan Ciupek, segundo diretor de fotografia de filmes como ‘Anticristo’ (2009), de Lars Von Trier, e que já fez trabalhos no Brasil, como ‘Deserto azul’. Traz participações especiais de Daniel de Oliveira e Bárbara Paz e de membros da ‘Mundana Companhia’, de teatro.
Um filme complexo para o público desavisado, que aborda temas como alienação, violência do Estado e repressão, representativos para o Brasil e para o mundo dos últimos anos, de fortalecimento da extrema-direita e do constante ataque à democracia. Gostei, reconheço a importância da obra e recomendo aos cinéfilos de filmes cult. Distribuição nos cinemas pela Pandora Filmes.




sábado, 22 de março de 2025

Especial de Cinema


Festival de documentários ‘É Tudo Verdade’ completa 30 anos e tem início em 03 de abril

A 30ª edição do Festival Internacional de Documentários ‘É Tudo Verdade’ tem início no dia 03 de abril com uma extensa programação. O festival completa 30 anos e exibirá até o dia 13 de abril, de forma gratuita, 85 filmes de 30 países. As sessões serão no Rio de Janeiro e em São Paulo, além de exibições em streaming. Haverá ainda conferências e debates.


O pôster da edição de 2025 do ETV traz o documentarista Vladimir Carvalho - foto abaixo - com uma claquete na mão, durante as filmagens da versão original de ‘Cabra marcado para morrer’, de Eduardo Coutinho, em que era assistente de direção – filmado em 1964, o filme foi interrompido com o Golpe Militar de 31 de março. 20 anos depois, Coutinho continuaria o projeto e lançaria esse que é considerado um dos docs mais importantes do Brasil. Vladimir Carvalho, que faleceu no ano passado, ganhará uma retrospectiva no ETV 2025.
A sessão de abertura do festival em São Paulo será na Cinemateca Brasileira, às 20h30 do dia 02/04, com o filme “Ritas” (2025), de Oswaldo Santana, que traz um outro olhar sobre a cantora e compositora Rita Lee; a de abertura no Rio será no Estação Net Botafogo, às 20h30 do dia 03/04, com a sessão de “Viva Marília” (2024), de Zelito Viana, sobre o início da carreira da premiada atriz Marilia Pêra durante a ditadura militar - ambas premières e voltadas apenas para convidados. O filme ‘Trens’ (2024), do polonês Maciej Drygas, irá encerrar o festival, tanto em São Paulo quanto no Rio de Janeiro – vencedor de dois prêmios no Festival de Amsterdã, o filme resgata imagens de arquivo de viagens de trem pela Europa ao longo do século 20.



O ETV conta com Mostras Competitivas de Longas/Médias-metragens Brasileiros, Longas/Médias-metragens Internacionais, Curtas-metragens Brasileiros e Curtas-metragens Internacionais, e em Mostras Não-competitivas, que são Programas Especiais, O Estado das Coisas, Foco Latino-Americano e Clássicos ‘É Tudo Verdade’.
A premiação será realizada em 12/04, às 19h30, na Cinemateca Brasileira, em São Paulo. As produções premiadas pelos júris oficiais terão reapresentações em SP e no RJ no dia seguinte. Pelo reconhecimento de “Qualifying Festival” pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, os quatro filmes vencedores dos prêmios dos júris oficiais para as Competições Brasileiras e Internacionais de Longas/Média-metragens e de Curtas-metragens estarão classificados para apreciação à disputa do Oscar do ano que vem em ambas as categorias.




Programação: Filmes e retrospectivas

Dentre os longas-metragens internacionais exibidos em competição esse ano no ETV destacam-se o suíço “Culpar” (2025), o cubano “Crônicas do absurdo” (2024 – exibido no Festival de Havana), o holandês “O propagandista” (2024) e a coprodução França/Holanda/EUA do premiado diretor Sergei Loznitsa “A invasão” (2024 – exibido em Cannes). E dos longas brasileiros em competição destacam-se “Bruscky: Um autorretrato” (2025, de Eryk Rocha), “Rua do Pescador, nº6” (2025, de Bárbara Paz) e “Um olhar inquieto: O cinema de Jorge Bodanzky” (2024, de Liliane Maia e Jorge Bodanzky).
No ‘Programas Especiais’ haverá a exibição do novo trabalho de Lucia Murat, “Hora do recreio” (2025), e no ‘Clássicos É Tudo Verdade’, diversos títulos lançamentos e antigos, como “Quem não conhece o Silva?” (1979).
O ETV de 2025 homenageia Vladimir Carvalho (1935-2024) com uma retrospectiva, trazendo nove longas-metragens realizados por ele em 50 anos, como “O país de São Saruê” (1971), “O homem de areia” (1981), “O evangelho segundo Teotônio” (1984) e seu último trabalho, “Giocondo Dias - O ilustre clandestino” (2019). Na retrospectiva internacional, uma celebração à obra do diretor britânico Humphrey Jennings (1907-1950) – serão exibidos oito de seus trabalhos, como “Fires were started” (1943) e “Family portrait” (1950 – indicado ao Bafta), além do documentário que revive sua trajetória, dirigido por Kevin Macdonald, “Humphrey Jennings – O homem que ouvia a Grã-Bretanha” (2000).
Para celebrar os 30 anos ininterruptos do festival, fundado em 1996, os organizadores trazem projeções e encontros especiais. Serão exibidos três docs marcantes de edições passadas do evento: “Cabra marcado para morrer” (1984), de Eduardo Coutinho - que inspira a capa do catálogo; “O velho – A História de Luiz Carlos Prestes” (1997), de Toni Venturi, e “Noel Field – A lenda de um espião” (1996), do suíço Werner Schweizer.


Encontros, conferências e debates

Além da exibição dos filmes, o ETV promove outras ações. Dentre elas estão a ‘22ª Conferência Internacional do Documentário’, em co-realização com a Cinemateca Brasileira, em São Paulo; encontros da Formação ‘Spcine Convida’ e um seminário com os cineastas vencedores da mostra competitiva do festival em edições passadas Eliza Capai, Joel Zito Araújo, Paulo Sacramento e Roberto Berliner – as datas serão definidas em breve.


Salas de exibição e streaming

Em 2025, as salas participantes que exibirão os filmes são: em São Paulo, CineSesc, Cinemateca Brasileira (Salas Grande Otelo e Oscarito), Instituto Moreira Salles/IMS Paulista e o Centro Cultural São Paulo; e no Rio, as sessões ocorrem nos Estações NET Botafogo e NET Rio e na Sala José Wilker, do recém-inaugurado CineCarioca.
Mais uma vez, pensando em democratizar o acesso ao festival, os organizadores lançarão parte da programação em plataforma de streaming, no caso o Itaú Cultural Play, com exibições entre 14 e 30 de abril – serão seis curtas-metragens da competição brasileira de 2025 e quatro curtas antigos de Vladimir Carvalho.
O ‘É Tudo Verdade’ conta com patrocínio do Itaú, parceria do Sesc-SP, e Apoio Cultural da Spcine, da RioFilme, do Galo da Manhã e do Itaú Cultural. Realização: Ministério da Cultura do Governo Federal, através da Lei de Incentivo à Cultura (Lei N. 8313).
Mais informações pelo site do evento, em https://etudoverdade.com.br/br/home/

sexta-feira, 21 de março de 2025

Cine clássico



Terra dos faraós

No Antigo Egito, o faraó Khufu, conhecido por Quéops (Jack Hawkins), planeja a construção de uma pirâmide grandiosa para ser enterrado quando morrer. Para isso, mobiliza arquitetos e dezenas de escravos para erguê-la. Egocêntrico, Quéops exige segurança máxima na pirâmide, pois junto de seu corpo será enterrado todo seu tesouro, à espera da próxima vida. Conhece então uma princesa, Nellifer (Joan Collins), jovem enigmática que tem planos traiçoeiros.

Drama histórico com ares aventureiros filmado no Cairo e em outras cidades do Egito, um clássico de Hollywood feito no auge das superproduções épicas, com milhares de figurantes – participaram cerca de 10 mil pessoas, além de um elenco de peso e figurinos luxuosos. É um espetáculo visual que foca no reinado de Quenum Khufu, o monarca Quéops, no Antigo Egito, que governou o Império egípcio entre os anos de 2589 a 2566 a.C., principalmente na ideia megalomaníaca dele de construir a maior pirâmide do mundo, para ser enterrado quando morresse. O projeto deu certo, demorou 20 anos a construção, houve inúmeros conflitos e mortes – a Pirâmide de Quéops, chamada de Grande Pirâmide de Gizé, é a mais antiga das Sete Maravilhas do Mundo Antigo e a maior das três pirâmides na Necrópole de Gizé, na fronteira de Gizé com Cairo, com quase 150 metros de altura.
É puro suco de entretenimento, não reconstitui precisamente a História real do Egito, assim como muitos filmes épicos norte-americanos da época, e vemos o ponto de vista dos americanos sobre o Egito. Mas a história é intensa, curiosa e que vale a assistida. Tem o inglês Jack Hawkins, de ‘Ben Hur’ (1959), Joan Collins, de ‘Esther e o rei’ (1960), Dewey Martin, de ‘O monstro do Ártico’ (1951) e o filho de Charles Chaplin, Sidney Chaplin, de ‘Luzes da ribalta’ (1952).





Roteiro do premiado Harry Kurnitz, com contribuição do escritor prêmio Nobel William Faulkner, e trilha retumbante do russo Dimitri Tiomkin. Quem dirige é Howard Hawks, de ‘Rio vermelho’ (1948), o mestre do faroeste psicológico, em sua única incursão em filmes épicos. O filme fracassou nas bilheterias da época e depois foi muito reprisado na TV aberta. Em DVD pela Versátil e pela Classicline.

Terra dos faraós (Land of the pharaohs). EUA, 1955, 105 minutos. Aventura/Drama. Colorido. Dirigido por Howard Hawks. Distribuição: Versátil e Classicline


Krakatoa – O inferno de Java

Em 1883, durante uma missão no mar, o capitão Hanson (Maximilian Schell) leva a tripulação do navio Batavia para resgatar embarcações naufragadas nas Índias Orientais Holandesas. A ideia é encontrar tesouros perdidos. Só que no percurso, o vulcão Krakatoa, na ilha de Java, entra em erupção destruindo tudo pela frente.

Disaster movie dos anos 60 inspirado no trágico e famoso caso do vulcão de Krakatoa, na ilha de Java, nos arredores da Indonésia, que em 1883 erupcionou matando 35 mil pessoas – é até hoje a maior tragédia natural envolvendo vulcões. Lava e detritos foram arremessados a quilômetros de distância, atingindo o mar e dizimando pequenas ilhas nos arredores. Também causou tsunamis que devastaram cidades e foram percebidos até na Inglaterra. O estrondo, segundo relatam, pôde ser ouvido a cinco mil quilômetros das ilhas de Java e Sumatra, localização do vulcão, e o efeito pós-erupção ocasionou uma mudança drástica na temperatura da região. Pois bem, esse é o contexto em que se baseou o filme de ação/aventura/drama indicado ao Oscar de efeitos especiais, uma fita popular com grande elenco e visual um pouco brega para os padrões de hoje. A história acompanha a jornada do capitão Hanson pelos mares das Índias em busca de navios naufragados, para caçar ouro e tesouros. Isso ocupa mais da metade da trama, com os conflitos entre tripulação e a equipe de resgate do navio, até chegar o momento ápice do Krakatoa, na meia hora final apenas, quando a tragédia toma conta da tela. Boa parte das cenas da destruição pelo vulcão foram feitas em miniatura, com maquetes e explosivos - há alguns erros visíveis de continuidade, mas não atrapalha no espetáculo visual que o filme proporciona.





Rodado em Cinerama, uma tela enorme e pioneira na época, foi precursor do chamado ‘Disaster movie’, que ficaria popular na década seguinte e traria sempre elenco de famosões – em ‘Krakatoa’ temos premiados e indicados ao Oscar, como Maximilian Schell, Sal Mineo, Diane Baker e Brian Keith. Antigamente saiu em DVD numa cópia sofrível, mas há poucos anos a Classicline o relançou no enquadramento correto de tela – procure essa versão se for ver, que é a de cinema, com 131 minutos – isso porque há uma versão estendida de 147 minutos, só distribuída no Reino Unido.


Krakatoa – O inferno de Java (Krakatoa – East of Java). EUA, 1968, 131 minutos. Aventura/Drama. Colorido. Dirigido por Bernard L. Kowalski. Distribuição: Classicline

quarta-feira, 19 de março de 2025

Resenhas especiais

 

Dicas de filmes no streaming

 

Softie (2020)

 

Documentário produzido no Quênia sobre o trabalho do fotojornalista Boniface Mwangi, apelidado de Softie, um jovem engajado na luta por justiça social de seu país. Ativista, perseguido pela polícia e pelo governo, Softie retrata por meio de suas lentes a violência política no Quênia – nos últimos 15 anos as ruas da capital, Nairobi, são constantemente tomadas por protesto contra o aumento de impostos e a concentração de renda. Centenas de manifestantes foram mortos na última década e outros tantos feridos nas mobilizações. O documentário, corajoso por natureza e que revela uma grave denúncia social, acompanha a vida de Softie não só na fotografia, mas quando decidiu concorrer às eleições regionais para o Parlamento, em 2017. Nesse percurso vivenciou um jogo sujo e perigoso ao enfrentar os poderosos para fazer uma campanha correta e ter o povo como aliado. Em 2019 foi preso por subversão e agitação popular. Gostei do filme, todo feito com imagens das ruas e depoimentos de Mwangi com sua visão de mundo. Escrito, dirigido, roteirizado e montado pelo cineasta queniano Sam Soko, que acompanhou Softie por cinco anos – ele realizou outros docs sobre a situação político-social em sua terra natal, como ‘Free money’ (2022). Disponível gratuitamente na plataforma Sesc Digital, em https://sesc.digital

 


 

Surto (2020)

 

Funcionário de um aeroporto de Londres enlouquece e entra numa espiral de autodestruição. Essa é a trama central desse thriller dramático, um tour-de-force do ator britânico Ben Whishaw, que costuma se desafiar em papeis complexos de assassinos e espiões – ele ficou conhecido como o protagonista sombrio de ‘Perfume: A história de um assassino’ (2006). Um personagem que vai do desespero ao caos e aos poucos vai enlouquecendo - com manias, ele é testado todo dia em situações-limite no aeroporto onde trabalha na revista de viajantes; ele um dia explode, briga no aeroporto, abandona o cargo e segue durante um dia inteiro perambulando pelas ruas, envolvendo-se em brigas e cometendo delitos - chega a ser espancado, visita os pais e lá uma notícia o abala, até atingir o ápice de uma jornada degradante. O filme se passa em 24h, nas ruas de Londres, na vida desse indivíduo complexo. Experimental, com câmera correndo e tremida, o filme usa e abusa de closes magníficos – eu gosto de filme assim, tem gente que não suporta. Selvagem, sujo, um filme que pulsa de forma vibrante. Exibido no Festival de Berlim, ganhou o prêmio de ator para Ben em Sundance. Esteve em exibição na plataforma Sesc Digital até semana passada.

 


 

Velas escarlates (1961)

 

O Centro Popular de Cultura da União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo (CPC-UMES) lançou, há uns bons anos, dezenas de filmes soviéticos e russos em DVD e bluray, e durante a pandemia, um canal no Youtube onde semanalmente entra um longa-metragem cult gratuito para o público assistir. O título da semana passada foi esse nada conhecido ‘Velas escarlates’ – aliás, o cinema russo e soviético quase não foi visto ou lançado no Brasil, exceto clássicos de diretores famosos, como Sergei Eisenstein e Andrei Tarkovsky. ‘Velas escarlates’ é uma perola do cinema de aventura soviético, um tipo de cinema popular que existiu lá nos anos 60 e 70. É baseado num livro da década de 20 de Alexander Grin (1880-1932), ou A.S. Grin, escritor de romances com toques de fantasia, parte deles em viagens por alto-mar, como é o caso aqui. Na trama, a garota Assol (papel de Anastasiya Vertinskaya, atriz de cinema famosa pelas versões russas de ‘Hamlet’ e ‘Guerra e paz’) encontra um velho mago que diz a ela que em breve se encontrará com um príncipe, com quem vai viver. Esse príncipe virá em um barco de velas escarlates. Enquanto ela aguarda, o jovem marinheiro Arthur (Vasiliy Lanovoy), filho de um nobre cruel apartado do pai, chega no vilarejo em seu navio mercante, apaixonando-se por Assol. Aventura, romance, humor não faltam nessa preciosidade soviética, um filme com cara de ‘Sessão da Tarde’. O diretor é Aleksandr Ptushko (1900-1973), de ‘A lenda do rei Saltan’ (1967). Disponível no canal CPC-Umes no Youtube.



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