sábado, 15 de março de 2025

Estreias da semana – Nos cinemas e no streaming


Quatro paredes (2024)

 

Exibido no festival ‘É Tudo Verdade’ de 2024 com o título ‘Diários da caixa preta’ (tradução ao pé da letra do original em inglês, ‘Black box diaries’), o documentário indicado ao Oscar esse ano acaba de entrar no streaming brasileiro, para aluguel, com novo nome, ‘Quatro paredes’. Nessa coprodução EUA/Reino Unido/Japão, a jovem cineasta e jornalista japonesa Shiori Itô dirige sua própria história, resgatando, com lucidez, memórias do estupro sofrido em 2017. O acusado: o diretor de TV onde ela trabalhava, um homem de forte influência e com ligação com a política. O caso ajudou a expandir o movimento #MeToo no Japão e demorou três anos para ser concluído. O filme investiga a fundo os abusos da vítima e de como políticos e a mídia tradicional trataram o caso - tentando a todo custo abafá-lo, já que o acusado do crime era o biógrafo e assessor do primeiro-ministro do Japão, o populista de direita e membro do maior partido nacionalista de lá, Shinzo Abe. É um filme-denúncia com narrativa que mistura o clássico e o moderno, reunindo vídeos caseiros, gravações escondidas, reportagens da época, entrevistas atuais, trechos de um diário pessoal, imagens de câmera de vigilância da noite do estupro e partes do julgamento no tribunal. Tem gravações de câmera em selfie, cortes de redes sociais, tudo muito dinâmico e preciso. Foi um caso espantoso que chacoalhou o Japão anos atrás, e o filme aproveita para criticar duramente a mídia, a política e o judiciário daquele país, cujas falhas e imperfeições de um sistema falido são evidentes. Também é chocante ver como as mulheres japonesas são silenciadas quando vítimas de abusos sexuais.
Além do Oscar, foi indicado ao Bafta de melhor documentário e ao Grande Prêmio do Júri em Sundance. Um retrato íntimo e corajoso sobre mulheres estupradas e formas de combate – com a repercussão do filme, o Japão vem num processo de reavaliar as leis de violência contra mulheres. Disponível para aluguel na plataforma online Filmelier, em https://www.filmelier.com/ - o streaming pode ser acessado pelo Prime Video e é administrado pela Sofa Dgtl.

 


 

Deu preguiça (2024)

 

Leve as crianças para se divertir com a nova animação que está em cartaz nos cinemas brasileiros, ‘Deu preguiça’, uma produção de médio-orçamento australiana que arranca risos com uma história agitada e personagens adoráveis. Os bichos-preguiça, nativos do Brasil, dominam a tela com graça, fofura e muita dose de sabedoria. O filme é a jornada de sobrevivência de uma família de bichos-preguiça - após uma forte tempestade, perdem a casa e pegam a estrada para morar na cidade grande, onde viverão aventuras e novidades. A família preguiça, com seus traços inconfundíveis, é um barato: tem a preguiça adolescente, protagonista da história, o pai, com bigode, a mãe, uma senhorinha preguiça de óculos e avental, e o irmão de gorro de lã com suas crises de adolescente, todos a bordo de um velho food truck. Um livro de receitas centenário da família será alvo de disputa de uma empresária, uma chita gananciosa que veste terno colorido. Cativante, tem um visual de computação gráfica moderno e inventivo. Com vozes originais de Leslie Jones e Remy Hii, o filme vem dublado para o Brasil, com vozes de Heloisa Périssé e de sua filha, Tontom. Nos cinemas pela Imagem Filmes.

 


 

A lien (2023)

 

Curta-metragem indicado ao Oscar na categoria de ficção, ‘A lien’ é um instigante filme sobre a deportação de imigrantes na nova Era Trump, produzido por Adam McKay, diretor de ‘A grande aposta’ (2015) e ‘Não olhe para cima’ (2021), e com direção de fotografia do ítalo-brasileiro Andrea Gavazzi. Conhecemos a história de um casal e a filha pequena em um dia comum para obter o tão sonhado Green Card – ele é imigrante e ela, norte-americana. O processo é demorado e burocrático, e separadamente eles passam por entrevistas. A todo tempo são observados por policiais. São momentos cruciais, angustiantes, de uma família à espera. Até que o homem é barrado e conduzido à força até uma viatura da polícia. Enxuto com seus 15 minutos, é um grande trabalho sobre imigração, distanciamento, separação, num contexto de forte tensão social que contamina os Estados Unidos hoje. O título carrega ambiguidade – ‘Lien’ significa o direito de possuir e usufruir títulos e propriedades, enquanto ‘A lien’, com a sonoridade ‘Alien’, pode ser interpretado como a visão de muitos americanos sobre os imigrantes, um outro ser, um alienígena invasor... Em breve no streaming.

 


 

Rheingold: O roubo do sucesso (2022)

 

O streaming Reserva Imovision, parceria entre o cinema Reserva Cultural e a distribuidora Imovision, é um dos canais mais curtidos dos cinéfilos de filmes cult. Sou assinante e recomendo, e o catálogo conta com centenas de longas distribuídos pela Imovision, uns que passaram despercebidos nos cinemas, outros que foram parar diretamente lá. ‘Rheingold: O roubo do sucesso’ (2022) é um desses filmes da Imovision a não perder de vista, um drama com ação de um diretor que costuma polemizar, o alemão de ascendência turca Fatih Akin, dos viscerais e trágicos ‘Em pedaços’ (2017) e ‘O bar luva dourada’ (2019). ‘Rheingold’ volta-se ao mundo da música para traçar uma história verídica complexa, explosiva, quase surreal: a trajetória do rapper Giwar Hajabi, conhecido como ‘Xatar’, iraniano de origem curda que se naturalizou alemão. Pobre, nascido nos guetos do Irã, em uma região de cavernas bombardeadas, era filho de um notório professor. Ainda criança vivenciou os horrores em uma penitenciária iraquiana, quando os pais foram presos, torturados e quase mortos. Mudou-se para a Alemanha, e jovem envolveu-se com pequenos delitos, depois o tráfico. Apadrinhado por um magnata das drogas, ameaçou os negócios de carteis rivais com algo inédito – cocaína líquida. Preso aos 28 anos em 2009 pelo roubo de carga de ouro, na cadeia escreveu músicas de hip hop e rap, e de dentro da cela gravou as músicas com equipamentos nada profissionais. Elas foram nas rádios, atingindo paradas internacionais, transformando Xatar em um músico consagrado. O filme, de maneira humorada, mas também dramática, monta todo esse perfil de Xatar, figura dúbia, querida e odiada. É uma história buliçosa de altos e baixos, e que de tão grande e incrível, parece pura ficção. Um filme bem feito, que só podia ter saído da cabeça de Akin. Recomendo a experiência cinematográfica – o filme é baseado na autobiografia de Xatar, ‘Tudo ou nada’, e o ator que o interpreta é bom e se parece com ele, Emilio Sakraya. Exibido nos festivais de Roma e Hamburgo.


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