Um limite entre nós
Pittsburgh,
década de 50. Troy Maxson (Denzel Washington), um homem difícil e amargurado,
luta com toda sua força para sustentar a família num bairro de periferia. Beberrão,
mora com a esposa, a compreensiva Rose (Viola Davis), ajuda a cuidar de um
irmão doente, até que uma notícia abalará para sempre a relação do casal.
Um drama
amargo e lírico feito em estilo teatral sobre a dura realidade dos negros nos
Estados Unidos na década de 50, o filme é uma adaptação fiel da peça “Fences”,
de August Wilson, publicada em 1983. Integrou uma série de dez obras de teatro
do referido autor chamada de “Pittsburgh Cycle”, que rendeu a ele o Pulitzer e
o Tony Award em 1987, quando da primeira encenação na Broadway - em todas as
peças Wilson analisa criteriosamente a relação dos negros na sociedade
americana, antes e depois da Segunda Guerra, de forma realista e vívida. Em
2010, ou seja, duas décadas depois da primeira encenação, Denzel Washington e
Viola Davis subiram aos palcos para uma nova temporada de “Fences” na Broadway;
a dupla ganhou o Tony, e Washington comprou os direitos para transformá-la em
filme. Rapidamente assumiu a direção do projeto, lançando o longa em 2016, que
recebeu quatro indicações ao Oscar – melhor filme, roteiro (póstumo, para August
Wilson, que havia deixado o texto para cinema escrito), ator para Denzel e atriz
coadjuvante para Viola (que finalmente ganhou pelo papel de Rose, recebendo
também os principais prêmios da temporada, como Globo de Ouro, Bafta e SAG). Ambos
os atores arrebentam com atuações memoráveis e emocionantes, as mais
importantes de suas carreiras.
Denzel
Washington dirige pela terceira vez um filme (antes vieram “Voltando a viver” e
“O grande debate”), aqui se apropriando dos elementos centrais da peça original,
como personagens, cenários, época e diálogos, onde manteve o estilo de teatro.
São poucos ambientes, muita discussão inserida em diálogos primorosos, impactantes,
para traçar a história de quatro gerações de uma família de negros operários, os
Maxson, suas dificuldades, os comportamentos e suas emoções. Eles descendem de
africanos marginalizados na periferia, espremidos na cidade grande, sem
oportunidades. Troy é o patriarca, um cidadão simples, desiludido, hoje
trabalha como coletor de lixo. Bebe para sufocar as angústias, não tem relação amigável
com os filhos. Em certos momentos age com agressividade, descontando raiva e
frustração nos moradores da casa. No passado tentou carreira como jogador de
beisebol, mas não seguiu o caminho, pois alegava que eram poucos os negros que
conseguiam espaço no esporte. Dentro da simplória residência dos Maxson, um
microcosmo da sociedade americana da época, Troy convive com outros personagens,
como a esposa solidária, uma mulher de fibra, Rose, a única que o suporta, além
do velho amigo íntimo Bono, que o visita para discutir sobre a vida, o irmão Gabe,
que teve graves ferimentos na Segunda Guerra e hoje vive desorientado, e os
filhos - um é músico, e outro, mais novo, ele não aceita, por ser promissor no
beisebol (Troy não suporta ver o filho melhor que ele no esporte). Quando os
ânimos parecem melhorar na casa, um fato obscuro será revelado, gerando uma
explosão de sentimentos no seio da família.
O
cenário principal é o quintal da frente da residência da família Maxson, num
bairro periférico de uma cidade grande, com uma cerca sempre presente – o
título original é “Fences” (“Cercas”), e uma frase simbólica do livro permeia a
história: “Você pode construir uma cerca para afastar ou unir uma família”.
Denzel
e Viola estão brilhantes, como falei, um brinde de interpretações fortes num drama
visceral e íntimo.
Além
do filme, recomendo também a leitura da peça – eu a li numa boa tradução pela
Única Editora, lançada em 2016.
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