sábado, 22 de junho de 2019

Resenha Especial



A festa

Para comemorar a promoção de um novo cargo político, Janet (Kristin Scott Thomas) reúne amigos em seu apartamento em Londres. O dia aparentemente festivo vira de cabeça para baixo, com discussões acirradas, brigas, revelações terríveis e extrema polarização de ideias entre os convidados.

Com uma legítima estrutura de teatro, este drama indicado ao Urso de Ouro em Berlim em 2017 traz um elenco de nomes aclamados do cinema, dois deles já indicados ao Oscar. É uma fita cult para público restrito, que se desenrola em apenas um dia na vida de sete personagens, dentro de um apartamento fechado.
Na abertura a anfitriã da festa, Janet (Kristin Scott Thomas), aponta uma arma para receber alguém na porta de seu apartamento. Não sabemos onde isto vai dar... Ela é a líder política da oposição na Grã-Bretanha, que convida amigos para celebrar um cargo que acabou de receber para o Ministério da Saúde. É casada com o acadêmico Bill (Timothy Spall), um homem calado, aparentemente doente. Chegam lá o casal de lésbicas Jinny (Emily Mortimer) e Martha (Cherry Jones), a melhor amiga de Janet, a cínica April (Patricia Clarkson), e o marido alemão Gottfried (Bruno Ganz), adepto da meditação e da medicina alternativa. E Tom (Cillian Murphy), um almofadinha neurótico, viciado em drogas. A tranquilidade cai por terra quando Bill abre a boca para uma notícia estarrecedora. A fala abala a relação de todos os presentes, dando início a um turbilhão de sentimentos e discussões calorosas. Na mesa são colocados segredos obscuros, há bate-boca, choro, guerra de opiniões, cada um defendendo a sua verdade de maneira efusiva ao ponto de cometerem atos violentos. O que era para ser festa vira uma tragédia humana.
Difícil classificar o filme apenas como drama, pois tem humor negro e momentos de uma comédia atípica que provoca risos nervosos. Chamam a atenção a fotografia preto-e-branco puxado para a sépia, a duração curtíssima, de apenas 71 minutos, e o timing preciso entre os vigorosos atores. Traz clara analogia ao momento político atual do Reino Unido; os personagens se dividem com suas opiniões polarizadas, simbolizando a divisão política na Inglaterra (como se fosse direita versus esquerda), desde a crise do Brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia, planejado por partidos políticos há quarenta anos (repare no título do filme em inglês, “The party”, que significa tanto “Festa” quanto “Partido”).


A diretora e roteirista inglesa Sally Potter (de “Orlando, a mulher imortal", “Porque choram os homens” e “Ginger e Rosa”) fez um filme inteligente, com uma mise-en-scène maravilhosa do elenco em harmonia com o espaço - é notável o esforço fora do comum dos atores em situações verossímeis e ao mesmo tempo burlescas, como se estivessem no palco da vida. Lembrei na hora de “Deus da Carnificina” (2011), de Roman Polanski, com pitadas de Woody Allen. Saiu há pouco tempo em DVD pela Focus Filmes, do grupo A2 Filmes.

A festa (The party). Reino Unido, 2017, 71 minutos. Drama. Preto-e-branco. Dirigido por Sally Potter. Distribuição: Focus Filmes

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