domingo, 17 de agosto de 2025

Estreias da semana – Nos cinemas e no streaming - Parte 1


O pior homem de Londres
 
O mais recente trabalho do português Rodrigo Areias, diretor que teve praticamente todos os filmes lançados na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, como “Tebas” (2007), “Estrada de palha” (2012), “1960” (2013), “Ornamento e crime” (2015), “Hálito azul” (2018), “Surdina” (2019 – exibido em Cannes) e “Vencidos da Vida” (2020), chega aos cinemas. Na edição de 2024 da Mostra de SP, Areias foi júri e apresentou lá seus dois últimos longas, “A pedra sonha dar flor” (2024) e esse “O pior homem de Londres” (2024), que conta com um elenco de nomes como Albano Jerónimo, Edward Ashley e Victoria Guerra. Falado quase que inteiramente em inglês, com poucos diálogos em outras línguas, como francês e português, o filme é um novo exercício autoral que abre outra frente estética na vasta carreira de Areias – é diferente de tudo o que fez. É um drama de época inspirado num caso real, com ambientação na Londres da época vitoriana, onde conhecemos um homem misterioso que circula entre a arte e a política, Charles Augustus Howell (1840-1890), apelidado de ‘O Português’. Nascido em Porto, de mãe portuguesa e pai inglês, era um cidadão de boa lábia, que atuava como agenciador e vendedor de obras de arte e tinha uma identidade oculta – era um agente secreto que fazia todo tipo de chantagem. Virou inspiração para que o escritor Arthur Conan Doyle criasse o vilão Milverton das histórias de detetive de Sherlock Holmes e foi o mesmo Doyle quem apelidou Howell de ‘o pior homem de Londres’. Com muitos diálogos, figurino bonito, uma fotografia sombria (em tons azulados, em interiores de grandes salões de festas), com enquadramentos distanciados, sem closes ou foco em rostos, o filme de arte é um complexo mergulho na figura excêntrica desse homem enigmático, um personagem forte, de mil camadas e muitos segredos. Para os inseridos no cinema de Areias, vale com certeza conhecer. Distribuição pela Leopardo Filmes.
 


Faz de conta que é Paris
 
Prazerosa comédia italiana que acaba de estrear nos cinemas pela Pandora Filmes, distribuidora especializada na curadoria de bons filmes europeus – neste ano lançaram, por exemplo, ‘O brilho do diamante secreto’ (2025 – exibido no Festival Berlim), ‘Ponto oculto’ (2021 – exibido em Berlim) e ‘Na teia da aranha’ (2023 – exibido em Cannes). Escrito, dirigido e estrelado por Leonardo Pieraccioni, de ‘Il ciclone: Amor e paixão’ (1996), o filme é inspirado numa emocionante história real que parece algo do mundo da fantasia, e trata de temas como reconexão de laços familiares e o poder da imaginação. Nos anos 80, os irmãos Michele e Gianni Bugli disseram para o pai doente que iriam levá-lo para uma inesquecível viagem a Paris, já que era o sonho dele. Porém, inventaram cenários e lugares, locomovendo o idoso de um ponto a outro da cidade italiana onde viviam – e o senhor, no leito de morte, acreditou. A comédia dramática segue essa linha, sobre três distantes que se reúnem criar o ambiente parisiense e assim dar ao pai seu último desejo em vida. Eles forjam tudo em um haras, na área rural da cidade onde moram, perfazendo um trajeto do campo de Florença até Paris. No meio do caminho, paradas para cafés e conversas íntimas. Lembra ‘Adeus, Lenin!’ (2003), só que mais leve e passageiro. Divertido e cativante, conta com uma fotografia ensolarada e momentos de puro ânimo. Participação vigorosa do veterano ator Nino Frassica, como o patriarca da família. Assistam.
 

 
Tóxico
 
Com uma infinidade de filmes cult no catálogo, a Mubi, que se tornou queridinha dos cinéfilos, lança mais um filme europeu diferente no streaming. Se não fosse na Mubi, essa obra talvez nunca chegaria ao Brasil, já que é um filme cult de festival – ganhou, ano passado, o principal prêmio do Festival de Locarno, o Leopardo de Ouro. O drama retrata uma juventude marcada por traumas e desafios. No filme, duas garotas de 13 anos, Marija (Vesta Matulyte) e Kristina (Ieva Rupeikaite), refletem a possibilidade de deixar a cidade industrial onde vivem, na Lituânia, para buscar novos rumos. As duas enfrentam problemas familiares, uma delas foi abandonada pela mãe e é criada pela madrasta, enquanto a outra é fechada, sem amigos. Ligadas por um forte vínculo na escola de modelos onde tentam carreira, atritam-se com colegas da turma enquanto se entregam de corpo e alma para o corpo perfeito, ultrapassando todos os limites de dieta e exercícios físicos. Escrito e dirigido pela lituana Saulė Bliuvaitė, jovem cineasta em sua estreia no cinema, que antes só fez curtas, o filme é um estudo impactante sobre as dores da adolescência e a desgastante indústria da moda que explora crianças e jovens. As duas atrizes, também estreantes, são ótimas e são a essência dessa juventude desamparada. A diretora trabalha bem a paleta de cores claras, com uma inebriante fotografia do interior da escola de moda, e há sacadas caprichadas que misturam coreografia de dança contemporânea com ensaios de passarela onde as personagens ficam frente a frente com a câmera e, portanto, olhando para o espectador, que somos nós – ou seja, a proposta estética é desafiadora.

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