quarta-feira, 6 de agosto de 2025

Cine clássico


Especial ‘Bravura indômita’

 
Bravura indômita *
 
O xerife texano Rooster Cogburn (John Wayne), velho e beberrão, auxilia a garota Mattie (Kim Darby) a encontrar os assassinos de seu pai. Para isso, terão de percorrer longas caminhadas a cavalo pelo Oeste selvagem, terra dos indígenas.
 
Faroeste classe A da Paramount, protagonizado pelo lendário ator John Wayne, o velho cowboy do cinema, ícone dos westerns americanos. Por esse filme ele ganhou o único Oscar da carreira, em 1970 – ele havia sido indicado duas vezes antes, por “Iwo Jima – O portal da glória” (1949) e “O álamo” (1960). Na pele de um destemido xerife que vive alcoolizado e que usa um tapa-olho, Wayne conduz a trama de vingança no Oeste selvagem. Toma a causa de uma menina, cujo pai foi assassinado por pistoleiros, e segue no encalço dos bandidos. Só que terão pela frente os indígenas.
O personagem Rooster Cogburn ficou célebre pelos detalhes cômicos (beberrão, falar irritado), carregando o estereótipo dos velhos xerifes (chapéu, jaqueta surrada, lenço vermelho no pescoço, pistolas nos coldres, tapa-olho e botas com esporas). Apesar do jeito truculento do grandalhão, no fundo, no fundo, seu coração é piedoso para com as pessoas de boa índole – já os maus ele manda para a cova.
Há uma sequência famosa onde o xerife, montado em seu cavalo, segura as rédeas pelos dentes, nas mãos segura uma pistola e uma espingarda, e com um olho só mira um bando de matadores, também a cavalo, e sai atirando para todos os lados. Violento (não chega a ser sanguinário como os faroestes de Sam Peckinpah) e ao mesmo tempo descontraído, o filme tem, como diretor, Henry Hathaway, especialista no gênero e parceiro de trabalho de John Wayne - juntos fizeram também “A lenda dos desaparecidos” (1957), “A conquista do Oeste” (1962) e “Os filhos de Katie Elder” (1965).


No elenco há participação de futuros astros, como Robert Duvall e Dennis Hopper, além de rostos conhecidos do faroeste, como Strother Martin e Jeff Corey, e ainda do cantor country Glen Campbell. A jovem atriz Kim Darby, na época com 22 anos, interpreta uma personagem bem mais nova, super carismática - pelo papel recebeu indicação ao Bafta. Bravura indômita” foi indicado também ao Oscar de melhor canção, “True grit”. Seis anos depois de “Bravura indômita”, em 1975, houve uma continuação menor, mas bem produzida e movimentada, intitulada “Justiceiro implacável”, novamente com John Wayne, fazendo par com Katharine Hepburn. E em 2010, os irmãos Coen rodaram o remake homônimo, totalmente descartável, sem motivo cabível para existir, protagonizado por Jeff Bridges – devido a uma alucinação coletiva da Academia, concorreu a 10 Oscars, incluindo melhor filme, direção, roteiro adaptado e ator, não vencendo nenhuma categoria.
Recentemente a Classicline lançou o filme em DVD juntamente com a continuação – e ambas as versões já haviam sido lançadas em DVD muito tempo atrás.
 
* Reedição do texto publicado por mim em 06/03/2013

Bravura indômita (True grit). EUA, 1969, 129 minutos. Faroeste. Colorido. Dirigido por Henry Hathaway. Distribuição: Classicline (DVD de 2024) e Paramount Pictures (DVD de 2004)
 
 
Justiceiro implacável
 
Rebaixado por cometer excessos, o veterano xerife "Rooster" Cogburn (John Wayne) está prestes a se aposentar. Quando é informado que uma perigosa quadrilha roubou um carregamento de nitroglicerina no Arkansas, Cogburn obtém de volta o distintivo para voltar em cena e enfrentar o bando de algozes, liderado por Hawk (Richard Jordan) e Breed (Anthony Zerbe). No caminho se juntará à filha de um reverendo assassinado pelo grupo, que deseja vingança, Eula (Katharine Hepburn).
 
Com uma brilhante fotografia das reais montanhas do Oregon, essa continuação de ‘Bravura indômita’ (1969) é um faroeste bem-humorado, veloz e com dois monstros sagrados fazendo a única parceria de suas carreiras, Katharine Hepburn, única atriz a ganhar quatro Oscars e que não tem nada de parentesco com Audrey, e a lenda do cinema western John Wayne, em seu penúltimo filme – ele estava com 68 anos, e morreria quatro anos depois. É uma mistura de ‘Uma aventura na África’ (1951) com ‘Os abutres têm fome’ (1970) no melhor estilo bangue-bangue, com o retorno triunfal do xerife zangado, bebum e grosseiro, mas de bom coração, Cogburn, papel que rendeu a Wayne o Oscar de melhor ator na obra original, em 1970. Ele agora encara uma missão derradeira, de capturar um bando que roubou nitroglicerina para explodir um carregamento de ouro e roubar a enorme carga. Há momentos engraçadíssimos dos dois personagens improváveis, que vivem se cutucando, brincam com a velhice e tentam elaborar armadilhas criativas para caçar os criminosos. Há uma cena de ação particularmente muito boa, nas corredeiras de um rio violento, bem filmada, com os atores idosos substituídos por dublês, devido aos riscos. Quem, como eu, curte faroeste, irá se divertir. Segundo e último filme dirigido por Stuart Millar, três anos depois de ‘Quando morrem as lendas’ (1972), que era produtor e depois só rodou seriados.



Recentemente a Classicline lançou o filme em DVD juntamente com a primeira parte, ‘Bravura indômita’ (foto abaixo) – e ambas as versões já haviam sido lançadas em DVD muito tempo atrás pela Universal e Paramount Pictures.
 
Justiceiro implacável (Rooster Cogburn). EUA, 1975, 108 minutos. Faroeste. Colorido. Dirigido por Stuart Millar. Distribuição: Classicline (DVD de 2024) e Universal Pictures (DVD de 2005)



terça-feira, 5 de agosto de 2025

Estreias da semana – Nos cinemas e no streaming – Parte 2


Filhos
 
Nova estreia da Mares Filmes nos cinemas brasileiros, distribuidora que trouxe esse ano excelentes longas, como o ganhador do Oscar de animação ‘Flow’, ‘O bom professor’ e ‘Stella – Vítima e culpada’. Agora chega às salas das principais praças do país o drama com suspense psicológico ‘Filhos’ (2024), coprodução Dinamarca, Suécia e França. É o novo trabalho do diretor do sufocante thriller ‘Culpa’ (2018), o sueco Gustav Möller, realizador de obras angustiantes. Concorrente ao Urso de Ouro no Festival de Berlim, o filme aborda questões como dilemas morais e senso de justiça, a partir de uma trama entremeada por diversas camadas. Em uma cadeia, a dedicada agente penitenciária Eva (Sidse Babett Knudsen, das séries ‘Borgen’ e ‘Westworld’, em uma atuação magistral) tem um baque ao descobrir que um dos detentos que acaba de ser levado para lá, Mikkel (Sebastian Bull), esteve envolvido em uma tragédia em sua família. Atordoada, ela pede transferência para a ala de segurança máxima, para ficar próximo do rapaz, iniciando com ele um jogo de obsessão e vingança. O segredo entre os dois nos é revelado na metade do filme – algo até possível de prever, mas a construção do suspense é de deixar qualquer um com nervos à flor da pele. A relação dos personagens Eva e Mikkel é visceral, com momentos tensos. A fotografia casa como uma luva na história, com cores azuladas e enquadramento fechados em que os dois ficam sempre frente a frente. É um bom filme, de teor realista, que abre uma forte discussão sobre moralidade.

 
 
Humphrey Bogart: A vida vem em flashes
 
Um convite para a trajetória do premiado ator novaiorquino Humphrey Bogart (1899-1957), rosto típico do cinema noir dos anos 40 e 50, é o mote desse bom documentário britânico de 2024 que foi exibido nos festivais de Roma e do Rio do ano passado. O longa acompanha os primeiros passos de Bogart até o auge da carreira, que o levou ao panteão da Sétima Arte e tornou-o ídolo da era de ouro de Hollywood. Seus quatro casamentos, a relação com os filhos e a perseguição no Macarthismo são momentos-chave do doc. Bogart, aos 22 anos, trabalhava na bilheteria de um teatro, e lá conheceu sua primeira esposa, a atriz Helen Menken, já famosa. Ficaram juntos apenas um ano, e em seguida foi fazer teatro e cinema. O estrelato veio imediatamente, fazendo com que Bogart, em 25 anos em Hollywood, participasse de 80 filmes, dentre eles clássicos absolutos, como ‘O falcão maltês’ (1941), ‘Casablanca’ (1942), ‘À beira do abismo’ (1946), ‘O tesouro de Sierra Madre’ (1948), ‘A condessa descalça’ (1954) e ‘Horas de desespero’ (1955). Indicado a três Oscars, ganhou um, pela estupenda atuação em ‘Uma aventura na África’ (1951). A vida conjugal do ator teve altos e baixos – ele se casou com quatro mulheres, todas atrizes, Helen Menken, depois Mary Philips, Mayo Methot e o último e mais conhecido, com Lauren Bacall, também o mais duradouro – Bogart e Bacall fizeram dupla em vários filmes noir, ficaram casados por 12 anos, de 1945 até a morte dele em 1957, e tiveram dois filhos. O filme conta com imagens raras de arquivo e depoimentos antigos de Lauren Bacall, Helen Hayes e John Huston. É narrado pelo filho, que é produtor de cinema, Stephen H. Bogart, cuja voz rouca e anasalada lembra o pai. Está disponível no Prime Video.
 


Comportamento apropriado
 
Filme experimental que marcou a estreia na direção da cineasta autoral norte-americana de origem iraniana Desiree Akhavan. Ela faria em seguida seu trabalho de maior repercussão, a adaptação para o cinema do livro ‘O mau exemplo de Cameron Post’ (2018). Lá e aqui a diretora e roteirista trata de temas correlatos pertinentes a ela, com teor autobiográfico: identidade de gênero, descoberta sexual e opressão da sociedade a grupos LGBTQIAPN+. Também intitulado no Brasil de ‘Uma boa menina’, a comédia dramática, de 2014, acompanha a luta de Shirin por reconhecimento. Ela vem de uma família persa com costumes conservadores, mas se reconhece como bissexual. Mora no Brooklyn, tem amizades com homens e mulheres hetero e queer, e se apaixona por uma mulher madura igual a ela. Porém, questionamentos vem a sua mente, o que a faz esconder seus sentimentos e ocultar o relacionamento com a jovem com quem pretende namorar. Feminino, misturando momentos emotivos com outros alto astral e com boas reflexões, o filme é uma joia do cinema indie, que já demonstrava a sensibilidade para a direção de Desiree – que, aliás, é uma ótima atriz. Ela voltaria ao tema da bissexualidade na minissérie escrita e produzida por ela ‘The bissexual’ (2018), em que volta a atuar na pele de uma personagem semelhante ao do filme ‘Comportamento apropriado’. Exibido nos festivais de Sundance, Sydney e do Rio, foi indicado ao Film Independent Spirit Awards, na categoria ‘Melhor primeiro roteiro’. Está em exibição no Sesc Digital, gratuitamente até hoje, dia 05/08.

domingo, 3 de agosto de 2025

Estreias da semana – Nos cinemas e no streaming - Parte 1


Atena
 
Em seu novo trabalho, o diretor brasileiro Caco Souza retorna às origens do cinema que o lançou, o policial, nos moldes do filme realizado por ele 15 anos atrás, ‘400 contra 1: Uma história do crime organizado’ (2010) - só que com mais timidez e pouco afinco. ‘Atena’ foi rodado em 2023 na cidade de Gramado (RS), um lugar charmoso e ponto turístico do país, só que aqui mostrada em seu lado sombrio, praticamente desconhecido da pequena cidade gaúcha. Lá, uma mulher chamada Atena (Mel Lisboa), marcada por abusos cometidos pelo pai na infância, combate a violência contra as mulheres de outro jeito: caçando abusadores e os levando a um tribunal próprio, clandestino. Até que um jornalista, Carlos (Thiago Fragoso), é pautado para investigar a justiceira. O filme é prejudicado pela direção frágil, que não conduz corretamente o elenco, e pela fotografia extremamente escura, que atrapalha identificarmos personagens e o andamento da história – grande parte das cenas se passa no período da noite, com baixa iluminação. Ao mesmo tempo em que toca em assuntos sérios, como abuso infantil e violência contra mulheres, abre espaço para situações complicadíssimas, como justiça com as próprias mãos e criação de tribunais independentes para julgar estupradores. Está em exibição nos cinemas brasileiros com distribuição da A2 Filmes.
 

 
Nada
 
Filme independente e experimental brasileiro que marca a estreia de Adriano Guimarães na direção, e que chega com exclusividade aos cinemas pela Embaúba Filmes. É um drama com molde de teatro, já que tudo se passa num mesmo ambiente, no caso uma casa na fazenda, e duas personagens apenas. Vemos uma artista plástica de nome Ana que, nos preparativos finais para uma exposição de seus trabalhos, é convocada às pressas para retornar à fazenda onde passou a infância. Sua irmã, Tereza, está gravemente doente e com problemas de memória. Ana e Tereza, isoladas as duas naquelas terras no fim do mundo, mergulhará nas próprias lembranças e nas da irmã. Protagonizado por Bel Kowarick e Denise Stutz, que está muito bem nos papeis das irmãs de meia-idade, o filme dá a sensação de confinamento, com planos fechados, e trabalha todo o tempo com a dualidade presença/ausência e memória/esquecimento, a partir de duas irmãs que se reaproximam quando uma estranha doença atinge uma delas. Segundo o diretor, o argumento e a estética do drama, principalmente quanto ao enquadramento, vieram após a leitura de poesias do poeta mato-grossense Manoel de Barros e das peças do dramaturgo modernista irlandês Samuel Beckett. Exibido em festivais na Espanha, Rússia, Índia, Argentina, México e Colômbia, recebeu prêmio especial no Festival de Cinema de Tiradentes, em 2022, no Festival de Málaga, naquele mesmo ano, e os troféus de melhor direção, direção de arte e edição de som no 57º Festival de Brasília.
 

 
Super happy forever
 
Mais uma boa estreia no streaming da Mubi, que tem no catalogo importantes filmes cult antigos e produções recentes premiadas em festivais como Cannes e Berlim. ‘Super happy forever’ é uma coprodução Japão/França, exibida nos festivais de Veneza e San Sebastián de 2024. É um filme cíclico, de narrativa leve, que mescla cenas com muitos diálogos entre amigos e outras de puro silêncio e contemplação na beira da praia. No novo trabalho do diretor Kohei Igarashi, de ‘Takara – A noite em que nadei’ (2017), uma história de amizade e compreensão – em 2023, Sano (Hiroki Sano) e seu amigo de infância Miyata (Yoshinori Miyata) visitam um resort na pequenina cidade litorânea de Izu. Cinco anos atrás, Sano conheceu lá sua falecida esposa, Nagi (Nairu Yamamoto). Ela morreu muito jovem, no auge da carreira e da vida. Sano então percorre lugares por onde esteve com ela, como a praia, minas de água, becos da cidade, redescobrindo o lugar e assim dando novo sentido ao luto. Uma história de recomeço e ressignificados, com imagens belamente fotografadas na cidade de Izu – as melhores são aquelas que retratam a solidão do protagonista, quando sentado refletindo nas pedras. O título faz referência a um congresso que ocorre em Izu durante a passagem do personagem, que seria algo como ‘Superfelizes para sempre’.

Cine clássico

Especial ‘Bravura indômita’   Bravura indômita *   O xerife texano Rooster Cogburn (John Wayne), velho e beberrão, auxilia a garota Mattie (...