Stella – Vítima e
culpada
Drama biográfico sobre Stella
Goldschlag (1922-1994), judia alemã que na Segunda Guerra Mundial colaborou com
a Gestapo, a polícia secreta nazista. Rodado na Alemanha, coprodução Áustria,
Reino Unido e Suíça, o bom filme mostra a personalidade dupla dessa jovem
mulher nascida e crescida em Berlim, que tinha o sonho de ser cantora de jazz.
Porém tudo foi interrompido quando, durante a expansão nazista na guerra, ela
foi capturada com a família pelas forças alemãs; Stella passou dias sob tortura,
humilhada pela Gestapo, e por um triz não morreu. Para que ela e a família não fossem
mandadas para os campos de concentração, acabou colaborando com os oficiais alemães
denunciando esconderijos judeus, de vizinhos e amigos. Ela tornou-se uma delatora,
vendo amargamente seu povo ser massacrado em Auschwitz. A atriz alemã Paula
Beer, rosto importante da atual safra de filmes do país, que trabalhou em
vários filmes de Christian Petzold, premiado diretor e roteirista alemão, como ‘Em
trânsito’ (2018) e ‘Afire’ (2023), entrega com seriedade e sensatez um trabalho
impecável, de uma protagonista de muitas camadas, capaz de provocar diversos
sentimentos ao espectador. Entendemos, com sua biografia complexa, as razões de
Stella ser tanto vítima do nazismo quanto culpada pela morte de dezenas de
judeus. O roteiro idealizado por Kilian Riedhof, que dirige o filme, faz um
recorte cirúrgico da vida de Stella Goldschlag, entre os anos 1943 e 1944, a
partir de fontes de jornais, livros e pesquisa histórica. Exibido nos festivais
de Málaga, Zurique e Gotemburgo, o drama tem uma boa reconstituição de época, com
figurinos e direção de arte precisos. Está em exibição nos cinemas, com
distribuição da Mares Filmes.
A odisseia de Eneias
Eis um belo drama com
pitadas de fantasia que dialoga com o cinema de Fellini do final dos anos 80 e
com o de Paolo Sorrentino, um longa de trama curiosa produzido por Luca
Guadagnino e dirigido por Pietro Castellitto, filho do grande ator italiano
Sergio Castellitto, que juntos aqui atuam no longa. Tem livre inspiração no
poema épico ‘Eneida’, do romano Virgilio, que tratava de um viajante errante
pelo mar Mediterrâneo chamado Eneias, resgatado pelo seu povo e levado por ele
até uma região para ser o novo líder do grupo. Na trama, agora moderna, Enea (Pietro
Castellitto) é um jovem de classe alta, que frequenta festas elegantes ao lado
de um amigo aviador. Assim como nos mitos grego e romano de Eneias - um
guerreiro sobrevivente da Guerra de Troia, amparado pelos deuses do Olimpo, ele
cruza as noites agitadas de uma Itália em transformação, cercada pelo crime e corrupção,
envolvendo-se em assassinatos pelas ruas, tráfico de drogas, disputas de
território e paixões avassaladoras. Ele e o amigo desafiam a sociedade e os
próprios pais para viver a liberdade intensamente. Nesse filme para público específico,
há uma mistura alquímica de realidade com delírios dos personagens – por isso o
filme assume um tom de fantasia e mais para o fim atinge o surrealismo, com um
visual ardente e sedutor, cuja direção de fotografia é do o polonês Radek
Ladczuk, de ‘O Babadook’ (2014). Um filme estiloso, libertário e carregado de metáforas,
que merece ser descoberto. Em seu segundo longa na direção, Pietro, de apenas
33 anos, demonstra versatilidade em tocar temas ousados e profundos – ele aqui
escreve, dirige e protagoniza. Na trilha
sonora, Loretta Goggi imortaliza a canção que a ergueu nos anos 80, ‘Maledetta
primavera’, tema central que tem tudo a ver com a obra. Concorreu ao Leão de
Ouro no Festival de Veneza de 2023. Chega aos cinemas brasileiros pela Pandora
Filmes.
Titan: O desastre da
OceanGate
Mais um bom documentário
da Netflix em torno de tragédias recentes, no caso uma investigação sobre o fracassado
projeto Titan, da empresa OceanGate, que culminou num incidente trágico em junho
de 2023, quando um submersível do grupo implodiu matando os cinco ocupantes da ousada
missão que iria visitar os destroços do Titanic no Oceano Atlântico. A
OceanGate é uma empresa privada que há 15 anos oferece submersíveis para
explorações em águas profundas e pesquisas submarinas. Desde 2021 faz viagens para
visitar os destroços do Titanic, que está a 3850 metros de profundidade numa
das regiões do Atlântico, no território do Canadá, com ingressos a US$ 250 mil
por pessoa. Numa das viagens com o Titan, modelo mais novo da empresa, a
tragédia aconteceu, repercutindo na mídia mundial – após a capsula submarina
sumir dos radares, ela implodiu, matando cinco pessoas, dentre elas o bilionário
Stockton Rush, criador e CEO da OceanGate. O doc da Netflix recria o passo a
passo da tripulação naqueles dias, os erros estratégicos e logísticos da
empresa, a malfadada operação para resgatar os destroços do Titan e como a empresa
lida com a segurança atualmente para fazer as viagens no fundo do mar. Exibido no
Festival de Tribeca de 2025, o filme do diretor premiado duas vezes com o Emmy Mark
Monroe está no catálogo da Netflix.
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