domingo, 7 de dezembro de 2025

Estreias da semana – Nos cinemas e no streaming - Parte 1

 
 
Cyclone
 
Diretora e roteirista de ‘Deslembro’ (2018), Flávia Castro lançou nesse ano dois longas, ‘As vitrines’, que está percorrendo festivais e ainda não estreou nas salas, e ‘Cyclone’, que acaba de chegar aos cinemas brasileiros. Inspirado em história verídica, o filme é uma reimaginação em torno de uma mulher à frente de seu tempo que esteve ligada ao movimento modernista do Brasil da virada da década de 10 para a 20. O contexto é uma São Paulo no auge da industrialização, e a tal personagem é uma jovem operária e escritora nata que tenta galgar no universo das artes. Ela é Dayse Castro, a Cyclone, que ganha uma bolsa para estudar teatro em Paris, a cidade que emergia no cenário cultural da época, porém que encontrará uma série de obstáculos pessoais e profissionais para entrar no disputado mundo da literatura e das artes cênicas, dominado pelos homens. A atriz Luiza Mariani, que interpretou Cyclone no teatro e aqui assina como uma das produtoras e auxiliou no roteiro, até que se esforça e entrega um papel decente, só que para um filme que infelizmente não causa emoção e fica estacionado. Um roteiro que falta clímax e ânimo. A escolha da composição das cores do filme é outro erro, com uma palheta desbotada, luzes estouradas e que de repente assume um ar punk e contemporâneo demais. Há uma mistura de linguagens que me incomoda, com teatro filmado, declamações, cinema, um tempo histórico que vai para a década de 10 e ao mesmo tempo vira algo moderno, ou seja, uma anarquia cinematográfica ruim. A obra é inspirada em Maria de Lourdes Castro Pontes (1900-1919), chamada de Miss Cyclone pelos pensadores modernistas paulistas, uma mulher operária que escrevia postais poéticos e cartas e que subitamente faleceu aos 19 anos, sem deixar obras publicadas nem reconhecimento – o nome dela seria estudado décadas após sua morte. Exibido no Festival do Rio e na Mostra de Cinema de SP, tem no elenco Eduardo Moscovis, Karine Teles, Luciana Paes, Magali Biff e Ricardo Teodoro. Produção da Mar Filmes e Muiraquitã Filmes, em coprodução com a VideoFilmes e com a Claro, conta com a distribuição da Bretz Films. Esforcei-me para ter gostado, mas o filme não decolou para mim.
 

 
One to One: John & Yoko
 
Documentário britânico original e com trechos inéditos e reveladores, exibido nos festivais de Veneza, Telluride e BFI London, e no Brasil no In-edit e Festival do Rio desse ano. A obra tem sentido pela assinatura do diretor, o britânico Kevin Macdonald, que dedicou a maior parte da vida em filmes ficcionais inspirados em fatos reais, como ‘O último rei da Escócia’ e ‘O mauritano’, e ultimamente se volta ao cinema que o lançou no início dos anos 90, o documentário – ele já biografou para o cinema e a TV uma dezena de personalidades, dentre eles os músicos Bob Marley, Whitney Houston e Mick Jagger e os diretores de cinema Howard Hawks e Errol Morris. Agora ele explora a relação pessoal e profissional de John Lennon e Yoko Ono, recortando um período específico, entre 1971 e 1972, após o fim dos Beatles e a mudança do casal de Londres para Nova York. É uma época de agitação popular, uma quase convulsão nas ruas com a contracultura e as manifestações pedindo o fim da Guerra do Vietnã, momento histórico que influenciar várias músicas de Lennon e Yoko. Foi em Nova York que o casal lançou um novo tipo de música, que marcaria a carreira de ambos e seria influência para outros. As canções falavam do amor dos dois, do ativismo social focado na paz do mundo, na liberdade sexual e na emancipação da mulher, além das mensagens contra a Guerra do Vietnã. Eles produziram um show memorável, ‘One to One Concert’, único realizado por Lennon após os Beatles com duas apresentações – uma diurna outra noturna, em que trajando jaqueta verde do exército cantou ‘Instant karma’, ‘Power to the people’ – que viraria símbolo da luta nas ruas, ‘Mother’, ‘Come together’ – que era dos Beatles, e as emblemáticas ‘Give peace a chance’ e ‘Imagine’. Ele e Yoko cantaram ao lado de amigos, como Stevie Wonder, no Madison Square Garden, para 40 mil pessoas, em 30 de agosto de 1972. O show se tornou beneficente com o montante de dinheiro doado para crianças com deficiência da instituição Willowbrook State School. No filme as imagens do show foram restauradas, e o doc é todo em cima de entrevistas e reportagens da época, sem nada de gravação atual. Dois antes do show Lennon e Yoko lançaram um álbum histórico juntos, que utilizaram como base para o concerto ‘One to One’, ‘Some time in New York City’. Ao longo do filme imagens históricas raras compõe a crítica embutida no documentário - dos protestos contra a Guerra do Vietnã pelas ruas de Nova York, a prisão de Lennon e Yoko por porte de maconha, a luta racial, a repressão policial e a polarização política. Um ótimo documentário para ser visto e revisitado.


 
Nos seus sonhos
 
Daquelas animações que emocionam e ao mesmo tempo divertem, o novo filme da Netflix é assinado por dois ex-Disney, Erik Benson e Alexander Woo, à frente de um dos primeiros longas do novo estúdio da produtora especializado em obras para crianças, a Netflix Animation. Com vozes de Craig Robinson, Cristin Milioti e Omid Djalili, o filme acaba de ser indicado ao Critics Choice na categoria de melhor animação e deve ser finalista ao Oscar do ano que vem. É uma aventura repleta de significados, dentro dos sonhos de criança. Stevie e o irmão Elliot são absorvidos para seus próprios sonhos com um propósito: encontrar-se com uma figura mítica que lembra o Papai Noel, chamado Sr. Sandman, um idoso de areia com longas barbas brancas, que vive num enorme castelo iluminado por uma forte luz brilhante. As crianças buscam uma família perfeita, já que a deles enfrenta problemas de relacionamento. Misturando uma estética de cores vibrantes com tons pasteis e minimalismo, a animação deverá agradar crianças, jovens e adultos – eu me joguei de cabeça torcendo pelos irmãos e refletindo a mensagem humana por trás daquela aventura mirim. A Netflix erra muito em filmes para adultos, mas acerta quase sempre nas animações infantis, e este é um bom exemplo.
 

 
A garota artificial
 
Fita de drama, suspense e ficção científica que tenta abrir uma discussão sobre Inteligência Artificial, assunto em voga na mídia e no cinema, só que nada segue conforme o anunciado, tornando-se um filme patético e desajustado. Dirigido e protagonizado por Franklin Ritch, o longa acompanha uma IA de nome Cherry, cuja forma é de uma garota bem jovenzinha, criação de um rapaz que se intitula ‘vigilante da internet’. Ela foi criada para rastrear pedófilos. Só que Cherry foge do controle assumindo poder próprio, que desafiará a polícia e o próprio criador. A metade inicial do filme se passa numa sala de interrogatório com o vigilante e os investigadores policiais, com cenas de puro diálogo, arrastado e de uma paradeira sem fim; a segunda metade traz Cherry e os objetivos da menina que criará uma série de desafios para os personagens, incluindo uma sequência final que poderia ter sido reavaliada pelos produtores/roteiristas. Filme que fica no limbo, que mais promete do que cumpre. Disponível exclusivamente na plataforma Filmelier+.



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