quinta-feira, 20 de novembro de 2025

Especial de cinema

 
Festival MixBrasil segue até dia 23 gratuitamente em SP
 
Considerado o maior festival de cinema LGBTQIAPN+ da América Latina, que reúne não só exibição de filmes, mas outras expressões artísticas, o ‘33º Festival MixBrasil de Cultura da Diversidade’ segue com extensa programação até o dia 23/11, em diversos espaços da capital paulista. São exibidos 142 filmes de 33 países e de 18 estados brasileiros, além de uma série nacional e oito curtas-brasileiros. Há também oito espetáculos teatrais, experiências XR, artes visuais, literatura, games, conferências, o tradicional Show do Gongo e a novidade desta edição, que é uma mostra competitiva de filmes feitos com Inteligência Artificial. O tema escolhido para esta edição é "A gente quer+".
Destacam-se os seguintes filmes da seção ‘Panorama internacional’ da edição de 2025: ‘Twinless - Um gêmeo a menos’ (2025), vencedor do Prêmio do Público no Festival de Sundance; ‘O olhar misterioso do flamingo’ (2025), vencedor do Prêmio do Júri de melhor filme na mostra Un Certain Regard em Cannes; ‘A sapatona galáctica’ (2024), animação australiana de Leela Varghese e Emma Hough Hobb, vencedora do prêmio Félix de melhor longa internacional no Festival do Rio; ‘Sabbath Queen’ (2024), documentário com animação exibido no festival de Tribeca; e ‘Queens of the dead’ (2025), comédia de zumbi dirigida por Tina Romero (filha do famoso cineasta do cinema de horror George A. Romero).
O Festival MixBrasil 2025 é realizado nos seguintes espaços: CineSesc, Anexo do CineSesc, Museu da Imagem e do Som de SP – MIS, Instituto Moreira Salles (IMS Paulista), Centro Cultural São Paulo (CCSP), Galeria Vermelho, Reserva Cultural, Biblioteca Mário de Andrade, Teatro Sérgio Cardoso, Museu da Diversidade Sexual, SPCine Olido, Tendal da Lapa e Cinemark Cidade São Paulo. Os ingressos, para a maioria das atividades e sessões, são gratuitos, com retirada 1h antes de cada apresentação/sessão. Entrada livre, sem necessidade de ingressos, no MIS, Museu da Diversidade, Galeria Vermelho, Anexo CineSesc e Tendal da Lapa. Ingressos pagos (R$ 20 - meia para todos) para a programação no Reserva Cultural, Cinemark Shopping Cidade São Paulo e Teatro Sérgio Cardoso (Show do Gongo). Também haverá a programação online de filmes, em exibição gratuita nas plataformas Sesc Digital, Spcine Play e Itaú Cultural Play.


O MixBrasil é uma realização da Associação Cultural MixBrasil e do Ministério da Cultura e conta com a iniciativa da Lei de Incentivo à Cultura e patrocínio do Itaú,  Spcine e Prefeitura de São Paulo, com o apoio cultural do SescSP e da Embaixada da França, além da parceria com a Talent —  responsável pela campanha "A gente quer +", Bumblebeat e Surreal. Apoio institucional: Instituto Moreira Salles, Teatro Sérgio Cardoso, Museu da imagem e do Som, Centro Cultural São Paulo, Mistika e DOT Cine, ImpulseSP, Reserva Cultural, Imovision e Cinemark. Promoção: Canal Brasil e Gazeta.
Toda a programação do 33º Festival MixBrasil de Cultura da Diversidade pode ser conferida no site mixbrasil.org.br ou pelo Instagram oficial do evento, em @festivalmixbrasil. Confira alguns filmes que assisti e recomendo.
 
Twinless – Um gêmeo a menos
(EUA, 2025, de James Sweeney)
 
Exibido nos festivais norte-americanos de Tribeca e Sundance, onde ganhou dois prêmios especiais, dentre eles o do público, a comédia dramática escrita, dirigida e protagonizada por James Sweeney aborda um relacionamento gay confuso e cheio de nuances. Sweeney interpreta Dennis, um jovem inteligente, mas muito irônico, que tem dificuldade em relacionamentos; em um grupo de apoio para pessoas que perderam seu irmão gêmeo, conhece Roman – papel de Dylan O’Brien, da franquia ‘Maze runner’, um rapaz solitário, em processo de luto. De uma amizade colorida surge um forte vínculo nesse momento delicado em que passam. Com humor negro e cenas engraçadas de sexo, o filme trabalha, de forma humana e espirituosa, temas como reconhecimento e pertencimento, além, claro, da ressignificação do luto. A dupla está muito bem, e o longa conta com participação da atriz Lauren Graham, protagonista da premiada série ‘Gilmore girls’. Teve a primeira exibição no Brasil no Festival do Rio e agora chega ao Mix Brasil com destaque na programação 2025.

 
 
Scarlet blue
(França, 2024, de Aurélia Mengin)
 
Fita de arte francesa com estética radical num roteiro desafiador, que parece ter saído do cinema scifi B dos anos 80. Com visual estranho juntando cores neon azuladas e lugares fechados, o filme faz uma mistura eclética de gêneros, como drama, romance, ficção científica, terror e ação. Alter (Anne-Sophie Charron) é uma mulher que enfrenta a esquizofrenia e uma crise de depressão. Atormentada por desejos carnais, já tentou duas vezes o suicídio; sem amigos ou família por perto, acaba participando de sessões de hipnose com um homem que mais parece um curandeiro que médico ou psicólogo (papel do ator italiano Stefano Cassetti) – ele faz nela uma espécie de hipnose mística, o que a leva a chafurdar lembranças escondidas, algumas dolorosas envolvendo a mãe. Nesse processo de autoconhecimento, Alter percebe que a realidade se mescla a fantasias, até um dia crucial em que conhece o amor. Diferente, com ousadias técnicas e um roteiro cheio de reviravoltas, o filme integra a seção do Mix Brasil dedicada a obras de novas estéticas – o longa foi premiado em diversos festivais de cinema fantástico. Sessão apenas online no Sesc Digital, disponível até dia 30/11 – no Sesc Digital há também nove curtas-metragens do Festival Mix 2025, todos gratuitos, até dia 30/11.



 

terça-feira, 18 de novembro de 2025

Estreias da semana - Nos cinemas e no streaming

 
Querido trópico
 
Premiada fita de arte produzida no Panamá e Colômbia chega aos cinemas brasileiros, um filme tocante sobre velhice e Alzheimer. Muitos filmes já trataram do tema com certo dissabor e tristeza; aqui a seriedade, com um pequeno toque de humor, toma conta da história, que envolve uma amizade intergeracional. Ana Maria (Jenny Navarrete) é uma jovem imigrante colombiana que trabalha como cuidadora de idosos. Ela atualmente mora na Cidade do Panamá. Sua próxima paciente será Mercedes (Paulina García), uma senhora da classe alta, que enfrenta a demência. Dia a dia Mercedes se atém a lembranças para barrar a evolução da cruel doença. Aos poucos, entre ela e Ana Maria nascerá um vínculo que ultrapassará os limites da relação enfermeiro/paciente. As duas atrizes em cena desenvolvem uma química impressionante, interpretações de uma sinceridade ímpar, com destaque para o discreto charme da atriz chilena Paulina García, protagonista de ‘Gloria’ (2013), papel que rendeu a ela o prêmio de melhor atriz no Festival de Berlim. É um filme de alma feminina, que se constrói nos detalhes, pelos olhares dos personagens, pelo toque entre eles. Escrito e dirigido pela cineasta panamenha Ana Endara Mislov, o filme teve première nos Festivais de Toronto e San Sebastián e aqui no Brasil no Festival do Rio. Está nos cinemas com distribuição do Filmes do Estação.
 

 
Meu pior vizinho
 
A Sato Company, distribuidora especializada em cinema asiático, traz ao Brasil a graciosa comédia romântica sul-coreana ‘Meu pior vizinho’, uma adaptação da fita francesa ‘Blind date’. Com elementos típicos dos doramas que tanto fazem sucesso, o filme se passa em dois apartamentos vizinhos, separados por uma fina parede; no primeiro mora um músico, que acabou de se mudar e precisa de concentração para exercer seu trabalho, enquanto no apê ao lado reside uma jovem designer em crise emocional. A menina chora diariamente, tem poucos amigos, e o barulho das ferramentas que ela usa no trabalho, bem como o chororô, chama a atenção do músico, que passa a ouvir pela parede seus lamentos. Ele então cria coragem para marcar um encontro com a misteriosa vizinha. Os atores, apesar de iniciantes, são carismáticos e entregam o melhor de si numa história leve, apaixonante, mas que não deixa de refletir sobre o isolamento na cidade grande – a parede que separa os dois é uma alegoria para a solidão e o distanciamento da vida moderna. O filme está em circuito em dezenas de cidades brasileiras, dentre elas capitais como Salvador, Brasília, Vitória, Goiânia, Belo Horizonte, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo.
 

 
Lar
 
Bom documentário na linha do novo cinema independente brasileiro, assinado pelo jovem cineasta Leandro Wenceslau. Um trabalho muitíssimo autoral do diretor, que reflete pontos de sua vida ao tratar das novas formas de amor e cuidado. São três famílias LGBTQIAPN+ que partilham suas relações com os filhos, bem como o preconceito enraizado na sociedade e suas formas de enfrentamento. Quem conduz as histórias são os filhos e as filhas daquelas famílias, que falam de afeto, o percurso da adoção, a rotina na escola e os desafios de se viver num lar diverso. A câmera registra o cotidiano dessas pessoas em suas individualidades, mostra conversas reveladoras em que desabafam e também apontam as inseguranças. O diretor aparece como narrador trazendo colaborações sobre sua jornada de descobertas ao relembrar momentos cruciais da infância e juventude e da vontade em adotar um filho com seu companheiro – algo que motivou a realização do documentário. Um bonito filme sobre vínculo familiar e que levanta também discussão sobre enfrentamento ao preconceito de gênero, reunindo uma gama de histórias que se completam no tema proposto. Produtor, roteirista e diretor, Leandro Wenceslau fez aqui seu bom ‘debut’ em longa-metragem após uma série de curtas-metragens de tema LGBTQIAPN+. Entrega um filme reflexivo e importante para os dias atuais. Estreia nos principais cinemas com distribuição da Embaúba Filmes.
 

 
Maldito Modigliani
 
Chega aos cinemas mais um documentário da série de filmes para cinema das produtoras italianas 3D Produzioni e Nexo Digital, com distribuição no Brasil pela Autoral Filmes – elas rodaram 65 trabalhos entre séries e filmes, de 2014 para cá, e a Autoral já distribui alguns como ‘Picasso – Um rebelde em Paris’ (2023). O filme faz um apanhado das obras do artista italiano Amedeo Modigliani (1884-1920) a partir da análise delas por historiadores de arte e curadores de museu, bem como momentos decisivos de sua vida – como a boemia, a pobreza, a fome, a relação com pintores russos, a incorporação do Expressionismo e Fauvismo e a morte prematura por tuberculose aos 35 anos. Um dos comentadores no documentário é o diretor de cinema Paolo Virzì, fã das obras de Modigliani. O filme foi produzido em 2020, no centenário de morte do artista, um gênio vanguardista que teve reconhecimento somente após a morte. A originalidade do doc está na narração – quem conta é a esposa de Modigliani, Jeanne Hébuterne, musa de seus trabalhos e que cometeu suicídio dois dias após a morte de Modigliani. Um filme rico de informações e bem construído, que vale a pena assistir, principalmente aqueles que curtem artes plásticas.
 

 
Corações jovens
 
A Mares Filmes lança, após grande espera do público, a apaixonante fita belga ‘Corações jovens’, coproduzida nos Países Baixos, que fala do primeiro amor, no caso entre dois meninos que moram na mesma rua. Discreto, é um filme emotivo e bem cuidado, de tema LGBTQIAPN+ que leve para a tela dois personagens não causais no cinema, dois meninos na pré-adolescência que se apaixonam – em seu primeiro longa-metragem, o cineasta e roteirista Anthony Schatteman soube entrar nessa seara cinematográfica com muito afinco, sem pieguice ou melodrama barato. Menos dramático e sem aquela carga de tristeza do conterrâneo ‘Close’ (2022), nem tão complexo e com densidade psicológica do japonês ‘Monster’ (2023), ambos filmes sobre jovens na descoberta do amor, o filme é mais terno e atraente para o grande público. Elias e Alexander acabam de se tornar vizinhos e passam a desenvolver um carinho especial um pelo outro. Da amizade entre as brincadeiras de escola e corrida de bicicleta, nasce ali o amor. Elias é mais intenso, precisa resolver aquele estranho sentimento dentro dele, mas tem medo de falar para a família sobre o assunto – ele tem pai, mãe e irmão mais velho. Já Alexander é mais tímido, fala pouco, é um menino curioso e não esconde o carinho que tem pelo novo amigo. A ambientação do filme é um atrativo para a história romântica, pois se passa numa cidadezinha bucólica, cercada por matas e um enorme silêncio. Os atores mirins nos emocionam com tamanha sensibilidade e tato para os papéis, ambos estreantes, Lou Goossens e Marius De Saeger. É bonita a relação que se constrói entre Elias e sua família e as formas de encontro dos dois meninos, como na cena final na festa que movimenta a cidade. Exibido no Festival de Berlim, onde recebeu menção especial dos jurados na seção Generation Kplus, o filme venceu prêmio especial no Cannes Écrans Juniors. Vem fazendo certo sucesso entre os jovens, principalmente após o filme viralizar nas redes sociais. Que o público o encontre, pois é uma obra linda demais, voltada especialmente para quem quer ver na tela uma história romântica sendo construída nos detalhes.
 
 
Eu, Eddie
 
Aos 64 anos, o astro da comédia Eddie Murphy ganha agora um documentário especial na Netflix, um filme que recupera toda a sua carreira, que completou quatro décadas. Com fotos de arquivo, reportagens e vídeos caseiros, o filme mostra o início de Eddie no humor, quando começou no stand up de Nova York no início dos anos 80, até se tornar ator de filmes populares e queridos pelo público, como ’48 horas’, ‘Um tira da pesada’, ‘Trocando as bolas’ e ‘Um príncipe em Nova York’. Eddie é entrevistado pela equipe do diretor Angus Wall, relembra fatos marcantes da carreira, fala de como foi difícil entrar no cinema - um território de brancos, até se consolidar e abrir as portas para jovens atores negros nos anos 80 – já existiu a Blaxploitation que trouxe o ator negro para a tela, mas a vinda de Eddie marcou um novo momento do cinema pós-Nova-Hollywood, um cinema mais moderno e comercial. Em determinado momento Murphy toca em temas espinhosos, como seu lado temperamental no set de filmagem, quando abandonou o Oscar no meio da cerimônia por não ter ganhado a estatueta em sua única indicação – por ‘Dreamgirls: Em busca de um sonho’ (2006), as duras críticas recebidas com seus filmes que andaram na corda bamba nos anos 90, além de entraves que culminaram em mal estar com colegas atores de sua geração. A Netflix produz bons documentários em formato de filme, e este é um deles.



domingo, 16 de novembro de 2025

Cine clássico

 
Tara maldita
 
Gentil e atuante no trabalho, Christine (Nancy Kelly) é casada com um comandante da Marinha, Penmark (William Hopper), com quem tem uma filha, Rhoda (Patty McCormack). A garotinha, de apenas oito anos, tem cara de anjo, mas esconde um perfil sombrio quando está sozinha. Egoísta e mentirosa, Rhoda também pode fazer planos diabólicos e até matar. Até que um dia um crime horrendo ocorre na vizinhança da família Penmark.
 
Ousado na época de seu lançamento, há quase 70 anos, ‘Tara maldita’, também conhecido no Brasil por ‘A semente maldita’, é a adaptação para as telas de um romance sombrio que se tornou cult, ‘The bad seed’, último livro de William March, no Brasil lançado recentemente pela Darskide com o título de ‘Menina má’. Foi um dos primeiros filmes com criança vilã, que esconde um perfil de assassina e sabe como ninguém mentir e fazer planos criminosos. Ela disfarça com seu lado angelical, fala muito bem e tem lábia para ludibriar. Sua mãe não desconfia e até a superprotege, enquanto o pai, comandante da Marinha, é ausente devido ao trabalho. Ela encarna a maldade, o lado mais sombrio do ser humano, capaz de matar com frieza. Certo dia, um amiguinho de classe da menina morre de maneira misteriosa, e ela se torna suspeita – a ponto de a mãe do garoto, uma alcoólatra, ameaçar a família da menina. A construção do filme é de tensão constante, com um clima ameaçador e de neurose – e na nossa mente sempre ecoa a figura perturbadora daquela criança vil. A fotografia do filme, num preto-e-branco único, foi indicada ao Oscar – aliás, o filme teve outras três indicações, no caso o elenco – de melhor atriz para Nancy Kelly, no papel da mãe, a protagonista; atriz coadjuvante para Patty McCormack, a menina, na época com 11 anos, e também coadjuvante, num papel deslumbrante, Eileen Heckart, como a mãe do garoto morto, sempre alcoolizada.



Um estudo sobre crianças com transtornos de personalidade e conduta, que as levam a agir com manipulação, sem remorso e com muita frieza em suas atitudes. Direção grandiosa de Mervyn LeRoy (1900-1987), que captura bons diálogos e cenas fechadas na casa da família Penmark, que são verdadeiras aulas de enquadramento. Saiu há tempos em DVD pela Classicline e recentemente no box ‘Obras-primas do terror - Vol. 22’ pela Versátil, em cópia restaurada – na caixa vem sete filmes, dentre eles ‘A balada de Tam Lin’
(1970) e ‘Herança maldita’ (1974).
 
Tara maldita (The bad seed). EUA, 1956, 129 minutos. Terror/Suspense. Preto-e-branco. Dirigido por Mervyn LeRoy. Distribuição: Versátil Home Video (em DVD no box ‘Obras-primas do terror – vol. 22’, lançado em 2024) e Classicline (DVD lançado em 2020)
 
 
O castelo sinistro
 
Mary Carter (Paulette Goddard) fica rica da noite para o dia ao herdar uma mansão em uma ilha remota de Cuba. Ela decide viajar ao local para conhecer melhor os aposentos, e convida para ir junto o locutor de rádio Larry Lawrence (Bob Hope). Ao chegarem lá, descobrem que o casarão na verdade é um antigo castelo considerado mal-assombrado.
 
Um dos atores mais engraçados e longevos do cinema se junta a uma das atrizes mais charmosas e bonitas de Hollywood nesse filme de comédia com boas doses de suspense, que representou bem o cinema dos anos 40, quando a fantasia e o fantástico se misturavam a temáticas realistas. Estamos falando de Bob Hope (1903-2003), que chegou aos 100 anos, tornou-se embaixador de causas humanitárias em Hollywood, ganhou prêmios especiais pela carreira e apresentou por décadas o Oscar, participando de mais de 100 filmes, e Paulette Goddard (1910-1990), ex-mulher de Charles Chaplin, com quem trabalhou em ‘Tempos modernos’ (1936) e foi indicada ao Oscar de melhor atriz coadjuvante por ‘A legião branca’ (1944). Eles fazem uma dupla que arranca risos e altas emoções em cenas que beiram o terror, como dois cidadãos que viajam a Cuba para inspecionar um castelo mal-assombrado que será herdado pela protagonista. Tem estereótipos típicos da época, como fantasmas envoltos de aura luminosa, uma Cuba mística e momentos pastelão e outros de filmes de gangsters – no meio da trama eles serão perseguidos por mafiosos.



Tornou-se um filme notório nos Estados Unidos e apontado pelos fãs de Bob Hope um de seus melhores filmes – eu gosto muito deste, ao lado de outro clássico de Hope que via quando pequeno, ‘O valente treme-treme’ (1948). Adaptação para o cinema da peça teatral da dupla Paul Dickey e Charles W. Goddard, que escreviam peças e roteiros de mistério com humor, como um outro filme que lembra este, ‘Morrendo de medo’ (1953 – feito pela dupla Dean Martin e Jerry Lewis). Em DVD pela Classicline.
 
O castelo sinistro
(The ghost breakers). EUA, 1940, 84 minutos. Comédia. Preto-e-branco. Dirigido por George Marshall. Distribuição: Classicline (em DVD)

domingo, 9 de novembro de 2025

Estreias da semana – Nos cinemas e no streaming


Dollhouse
 
Um sinistro J-horror (horror japonês), com uma boneca amaldiçoada, chega aos cinemas neste fim de semana, lançamento exclusivo da Sato Company. Quem tem medo com filmes de brinquedos malditos irá curtir a pegada desse terror que também é um drama sobre luto. Yoshie (Masami Nagasawa) entra em depressão profunda após a morte da filha de cinco anos, Mei (Totoka Honda). Ela e o marido tentam, pouco a pouco, superar a perda. Um dia, Yoshie encontra numa loja de antiguidades uma boneca com traços que lembram Mei, então a adquire. Encontra na boneca uma forma de superar o luto, integrando-a como membro da família. Tempos depois nasce a nova filha do casal, Mai (Aoi Ikemura), e a boneca é deixada de lado. Quando Mai completa cinco anos, a garotinha desenvolve uma certa atração pela boneca, dando início a estranhas ocorrências sobrenaturais. Em seu novo projeto, o diretor e roteirista Shinobu Yaguchi muda radicalmente de gênero, saindo das habituais comédias para atingir um outro nível na cinematografia, o horror sobrenatural – ele dirigiu 14 filmes, como o premiado sucesso de público ‘Garotas do balanço’ (2004). Ele se saiu bem, por ser um bom contador de histórias, fazendo uma obra assustadora, com jumpscares de pular da cadeira; o horror se divide com um drama psicológico, uma preocupação do diretor, que trouxe reflexões sobre luto, perda e reparação, com um triste assombroso. Yaguchi conta em entrevistas que sempre quis realizar uma fita de horror, já que é fã do gênero – em alguns aspectos ‘Dollhouse’ lembra ‘Annabelle’, com melhor refinamento artístico, pois trata de uma boneca que, quando jogada fora, retorna de maneira inexplicável e guarda uma maldição. Disponível em vários cinemas brasileiros, incluindo o Sato Cinema - fundada em 1985, a Sato Company é pioneira na distribuição de animes e tokusatsu, referência aos cinéfilos; a Sato lançou no Brasil filmes e séries asiáticos de sucesso de público e crítica, como ‘Akira’, ‘Ghost in the shell’, ‘National Kid’, ‘Ultraman’, ‘Godzilla Minus One’ e ‘O menino e a garça’.
 

 
Meu nome Hitchcock
 
Documentário monumental do diretor, roteirista, pesquisador e professor de cinema Mark Cousins, que esteve no Brasil no ano passado para lançar uma retrospectiva de oito filmes seus e fazer masterclass no festival ‘É Tudo Verdade’. Produção britânica, exibida em festivais como Telluride e Hong Kong e na Mostra de Cinema de SP de 2022, o documentário de Mark Cousins está disponível gratuitamente no Sesc Digital até o dia 19/11. Em 2022 houve a comemoração dos 100 anos de lançamento do primeiro trabalho de Alfred Hitchcock, ‘Number 13’ (também conhecido por ‘Mrs. Peabody’), comédia muda rodada no Reino Unido, considerada perdida, já que os rolos da película foram destruídos, o roteiro datilografado sumiu, e há hoje uma ou outra cena por aí no Youtube, em péssima qualidade. Para celebrar o centenário do primeiro filme de um dos diretores mais conhecidos e influentes do planeta, Cousins lançou este longa que é resultado de uma ampla pesquisa feita por ele ao longo dos últimos anos ele criou um filme super bem montado para estudiosos e fãs de Hitchcock, uma preciosidade que dá prazer em assistir. Com seu olhar crítico e direto, Cousins, só com trechos das 70 obras de Hitchcock, compõe um rico painel sobre os processos de criação do cineasta falecido em 1980; ele divide o filme em pontos de vista de Hitchcock, como o controle e os planos das cenas, a altura da câmera e os elementos escondidos, que se transformaram em obsessões do cineasta, e assim um virtuosismo que inspiraria diretores como Brian De Palma e M. Night Shyamalan. Um recurso curioso, que chama demais nossa atenção, é a narração - quem fala a todo momento em primeira pessoa é o próprio Hitchcock, como se estivesse nos dias atuais – no crédito final é explicado como isto foi feito. É uma viagem supersônica ao cinema de Hitchcock, com 80% do filme composto por imagens de seus filmes, e o restante com fotos raras de Hitchcock em bastidores, dando entrevistas e posando para capas de revistas e matérias jornalísticas. Cousins está no rol dos enormes documentaristas contemporâneos; ele completou 60 anos recentemente, e dele há trabalhos imprescindíveis para quem quer estudar o cinema, como a minissérie ‘A História do Cinema – Uma odisseia’ (2011), e os longas ‘Uma História de crianças e cinema’ (2013), ‘Os olhos de Orson Welles’ (2018), o díptico ‘A História do olhar’ e ‘A História do Cinema – Uma nova geração’  - lançados em 2021, e ‘O cinema tem sido o meu amor: O trabalho e a vida de Lynda Myles’ (2023). Conheçam ‘Meu nome é Hitchcock’.
 

 
Você é o universo
 
Poucos sabem, mas a Ucrânia, bem antes da guerra com a Rússia, tem investido em um cinema autoral, com filmes sobre debate social, conflitos étnicos-culturais e disputa de território. Mesma com a crise financeira que se arrasta há pelo menos três décadas, o país faz coproduções e realiza longas independentes de altíssima qualidade, com uma ampla cinematografia, infelizmente desconhecida – a Ucrânia era uma das 15 repúblicas socialistas da URSS, o país foi invadido pela Rússia e continua sendo devastado desde 2014, com intensificação do conflito a partir de 2022. O cinema ucraniano tem mínima projeção fora da Europa, e talvez os dois filmes mais conhecidos de lá foram os documentários ‘Winter on fire: Ukraine's fight for freedom’ (2015), indicado ao Oscar, e o vencedor do Oscar de doc do ano passado, a coprodução EUA/Ucrânia ’20 dias em Mariupol’ (2023), excelente por sinal. Uma das salvações para ver cinema ucraniano é acessar o catálogo da Reserva Imovision, que apresenta sete produções do país e coproduções de 2019 a 2024, como este curiosíssimo filme de ficção científica ‘Você é o universo’ (2024). É um drama scifi que se passa num futuro próximo. O mundo acabou depois das guerras que assolaram o planeta – dentre ela a Russo-Ucraniana. Só existe um sobrevivente, um astronauta viajando pelo espaço, o ucraniano Andriy Melnyk (Volodymyr Kravchuk). Ele está a trabalho, sozinho na nave, transportando lixo nuclear em um cargueiro para Calisto, uma lua abandonada de Júpiter. Sem saber o que fazer quando a Terra vira cinzas, procura na nave jogos e brincadeiras para ocupar o tempo e planejar um pouso. Até que, por meio de sinais do rádio, descobre que uma astronauta francesa, de nome Catherine (Alexia Depicker), está também em viajando no espaço solitariamente. Andriy se sente aliviado por não estar só, então combina com Catherine uma forma de as naves se aproximarem para se conhecerem. Um personagem em cena, uma ambientação somente, e um vazio absoluto dominam a cena, num filme de esplêndidas fotografia e direção de arte. O drama scifi se torna aos poucos uma pequena aventura espacial em que dois estranhos buscam se encontrar para viver uma história de amor, apesar dos milhares de obstáculos. Destaco a direção de arte bem cuidada do interior da nave espacial do protagonista, além do bom trabalho dele. A direção de Pavlo Ostrikov é segura – é seu filme de estreia, escrito e dirigido por ele, que demorou 10 anos para realizá-lo, devido ao orçamento apertado, a pandemia e a guerra que prorrogaram a produção. Totalmente rodado e produzido na Ucrânia, o filme prende a atenção e é um belo exemplar do cinema autoral do país. Há, da metade para o final, uma reviravolta impressionante que mudará o humor do filme. Vi por acaso após comentários positivos na internet e gostei muito – o longa integrou a seleção oficial do Festival de Toronto e da primeira edição do Festival de Cinema Europeu Imovision, lançado neste ano em São Paulo.



quinta-feira, 6 de novembro de 2025

Especial de cinema

 
Vem aí o ‘33º Festival MixBrasil’
 
Considerado o maior festival de cinema LGBTQIAPN+ da América Latina, que reúne não só exibição de filmes, mas outras expressões artísticas, o ‘33º Festival MixBrasil de Cultura da Diversidade’ será realizado este ano de 12 a 23/11, em diversos espaços da capital paulista. A programação completa acaba de entrar no site; serão exibidos 142 filmes de 33 países e de 18 estados brasileiros, além de uma série nacional e oito curtas-brasileiros, a maioria inédito no Brasil; haverá ainda oito espetáculos teatrais, experiências XR, artes visuais, literatura, games, conferências, o tradicional Show do Gongo e a novidade desta edição, que é uma mostra competitiva de filmes feitos com Inteligência Artificial. O tema escolhido para esta edição é "A gente quer+". A abertura será com o filme exibido em Cannes ‘Me ame com ternura’ (2025), da diretora francesa Anna Cazenave Cambet, que virá ao evento. A atriz Marisa Orth, apoiadora do MixBrasil desde 1999, conduzirá o Show do Gongo, onde será homenageada com o prêmio Ícone Mix.


 
Filmes selecionados
 
Destacam-se os seguintes filmes da seção ‘Panorama internacional’ da edição de 2025: ‘Twinless - Um gêmeo a menos’ (2025), vencedor do Prêmio do Público no Festival de Sundance; ‘O olhar misterioso do flamingo’ (2025), vencedor do Prêmio do Júri de melhor filme na mostra Un Certain Regard em Cannes; ‘A sapatona galáctica’ (2024), animação australiana de Leela Varghese e Emma Hough Hobb, vencedora do prêmio Félix de melhor longa internacional no Festival do Rio; ‘Sabbath Queen’ (2024), documentário com animação exibido no festival de Tribeca; e ‘Queens of the dead’ (2025), comédia de zumbi dirigida por Tina Romero (filha do famoso cineasta do cinema de horror George A. Romero).
Algumas das produções nacionais que integram A ‘Mostra Competitiva Brasil - Longas’ são: ‘A natureza das coisas invisíveis’, de Rafaela Camelo; ‘Morte e vida Madalena’, de Guto Parente; ‘Apenas coisas boas’, de Daniel Nolasco; ‘Apolo’, de Tainá Müller e Ísis Broken; ‘Ato noturno’, de Marcio Reolon e Filipe Matzembacher; e ‘Ruas da Glória’, de Felipe Sholl. Haverá ainda a exibição da série ‘Ayô’, de Yasmin Thayná, com Lucas Oranmian, Caio Blat, Lázaro Ramos, Aretha Sadick e Gilda Nomacce. Este ano, a Mostra Reframe se torna competitiva, trazendo filmes como ‘Gravidade’, de Leo Tabosa, e ‘A artista está online’, de Anna Talebi.
 



Sessões e ingressos
 
O Festival MixBrasil 2025 será realizado nos seguintes espaços: CineSesc, Anexo do CineSesc, Museu da Imagem e do Som de SP – MIS, Instituto Moreira Salles (IMS Paulista), Centro Cultural São Paulo (CCSP), Galeria Vermelho, Reserva Cultural, Biblioteca Mário de Andrade, Teatro Sérgio Cardoso, Museu da Diversidade Sexual, SPCine Olido, Tendal da Lapa e Cinemark Cidade São Paulo. Os ingressos, para a maioria das atividades e sessões, são gratuitos, com retirada 1h antes de cada apresentação/sessão. Entrada livre, sem necessidade de ingressos, no MIS, Museu da Diversidade, Galeria Vermelho, Anexo CineSesc e Tendal da Lapa. Ingressos pagos (R$ 20 - meia para todos) para a programação no Reserva Cultural, Cinemark Shopping Cidade São Paulo e Teatro Sérgio Cardoso (Show do Gongo). Também haverá a programação online de filmes, em exibição gratuita nas plataformas Sesc Digital, Spcine Play e Itaú Cultural Play.
 
Outras programações
 
A grande novidade desta edição do Mix é a ‘Mostra de Inteligência Artificial’, que reúne 24 filmes produzidos com ferramentas de IA, sendo 19 títulos brasileiros e estrangeiros em competição e cinco internacionais com curadoria do Festival Internacional de Vídeo e Inteligência Artificial de Marselha/França - FIVIA.
O ‘Mix Literário’ chega à sua 8ª edição trazendo duas mesas de debate com os jurados dos Prêmios Mix Literário e Caio Fernando Abreu, além de encontros de formação em que escritoras e escritores compartilharão suas experiências de criação literária, de forma presencial, na Biblioteca Mário de Andrade.
A seção ‘Artes Visuais’ ganha seu maior espaço em mais de três décadas de evento com a exposição ‘Kwir Nou Exist’, sobre a comunidade trans reunionense, bem como o encontro entre os coletivos Depois do Fim da Arte e Realidades, na Galeria Vermelho, e a mostra com curadoria da Vórtice Cultural, no Museu da Diversidade Sexual.
O Mix.XR, premiado em 2025 pela WSA Brasil (World Summit Awards, iniciativa ligada à ONU de inovação digital), consolida-se como a principal mostra de experiências imersivas e tecnológicas com foco na diversidade. Nesta edição, o programa apresenta cinco experiências em realidade virtual (VR), dois espetáculos imersivos e uma projeção em domo com o projeto Kancícà — uma estrutura hemisférica de 360° que oferece ao público uma vivência sensorial completa, onde som, imagem e corpo se entrelaçam. Completam a programação: a experiência vinda da França "Another Place"; dos EUA "Blackstar Sanctuary e Unfolding"; do Brasil "Dilemma"; e da Coreia do Sul "Downfall of the Virtual Huma".
Para o diretor do Festival Mix, André Fischer, a 33ª edição reafirma a vocação do MixBrasil como plataforma para além da resistência. "Mesmo com escassez de investimentos públicos e privados e retrocessos em várias frentes, o festival cresce e celebra uma das maiores programações da sua história. A colaboração internacional em ano de menos recursos por aqui viabilizou uma edição potente, através da integração à Temporada França–Brasil 2025 e a seção Mundo Mix que homenageia a Polônia", comentou.


 
O MixBrasil
 
O MixBrasil é uma realização da Associação Cultural MixBrasil e do Ministério da Cultura e conta com a iniciativa da Lei de Incentivo à Cultura e patrocínio do Itaú,  Spcine e Prefeitura de São Paulo, com o apoio cultural do SescSP e da Embaixada da França, além da parceria com a Talent —  responsável pela campanha "A gente quer +", Bumblebeat e Surreal. Apoio institucional: Instituto Moreira Salles, Teatro Sérgio Cardoso, Museu da imagem e do Som, Centro Cultural São Paulo, Mistika e DOT Cine, ImpulseSP, Reserva Cultural, Imovision e Cinemark. Promoção: Canal Brasil e Gazeta.
Toda a programação do 33º Festival MixBrasil de Cultura da Diversidade pode ser conferida no site mixbrasil.org.br ou pelo Instagram oficial do evento, em @festivalmixbrasil.
 

terça-feira, 4 de novembro de 2025

Especial de cinema

 
Festival de Cinema Italiano no Brasil chega à 20ª edição com filmes online gratuitos
 
A 20ª edição do Festival de Cinema Italiano no Brasil teve início na noite de 28 de outubro com a abertura oficial do evento para convidados e a exibição do drama de época ‘Napoli – Nova York’ (2024), de Gabriele Salvatores, realizadas no Auditório Oscar Niemeyer, no Parque Ibirapuera, em São Paulo. A noite de abertura foi apresentada pelo ator Reynaldo Gianecchini e contou com a participação do premiado ator italiano Antonio Catania, que integra o elenco do filme exibido.
Criado em 2005 por Nico Rossini e Erica Bernardini, o festival é um projeto organizado pela Câmara de Comércio Italiana de São Paulo – Italcam, em colaboração com a Embaixada da Itália e com o Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet. Conta com patrocínio da Pirelli, da Persol e do Istituto Italiano di Cultura di San Polo. A cada edição, o festival apresenta uma seleção de longas inéditos e filmes que integram retrospectivas do cinema italiano em cópias restauradas. A iniciativa fortalece os laços culturais e afetivos entre Brasil e Itália, trazendo de forma gratuita ao público uma série de filmes, democratizando o acesso ao cinema.
Gratuito e aberto ao público, o festival é presencial e online e segue até o dia 29 de novembro em mais de 90 cidades brasileiras. No streaming é possível conferir os títulos inéditos e os clássicos da programação 2025 – são 24 longas, e para assisti-los basta acessar o site do festival e dar play no título, em https://festivalcinemaitaliano.com. Abaixo o pôster oficial da 20ª edição do Festival de Cinema Italiano no Brasil.
 



Programação 2025
 
Dentre as produções inéditas no Brasil estão os dramas de época ‘A ilusão’ (2025), de Roberto Andò, e ‘As provadoras de Hitler’ (2025), de Silvio Soldini, e os dramas ‘Diamantes’ (2024), de Ferzan Özpetek, ‘Hey Joe’ (2024), de Claudio Giovannesi, e ‘Irmãos’ (2025), de Greta Scarano. Na lista dos clássicos estão ‘Ladrões de bicicleta’ (1948), de Vittorio de Sica, ‘Antes da revolução’ (1964), de Bernardo Bertolucci, ‘Henrique IV’ (1984), de Marco Bellocchio, ‘Tomara que seja mulher’ (1986), de Mario Monicelli, e ‘O jantar’ (1998), de Ettore Scola.
 
Dica – filme de abertura
 
 
Napoli – Nova York
(2024, de Gabriele Salvatores)
 
Filme de abertura da 20ª edição do Festival de Cinema Italiano no Brasil, o drama de época assinado por Gabriele Salvatores tem inspiração em uma história real de Federico Fellini e Tullio Pinelli (roteirista e parceiro de trabalho de Fellini em clássicos como ‘A doce vida’, ‘A estrada da vida’ e ‘Noites de Cabíria’). Salvatores obteve os direitos da obra, deu novo tratamento ao roteiro engavetado e manteve boa parte das ideias originais de Fellini, que na época não seguiu com o projeto pois estava na fase final da carreira, rodando ‘E la nave va’. Salvatores manteve quase que a totalidade do primeiro ato, que se passa no navio. Com traços de ‘Manhattan’ e ‘Era uma vez na América’ – este, um dos trabalhos preferidos de Salvatores, o drama acompanha a jornada de duas crianças órfãs naturais de Nápoles, Celestina (Dea Lanzaro) e Carmine (Antonio Guerra), que deixam a Itália rumo à América, em busca de lugar melhor para viver. Eles perderam tudo na Itália do pós-guerra, época de terra arrasada, e embarcam clandestinamente num navio que navega por semanas até os Estados Unidos. Até pisarem em solo americano, Carmine e Celestina encontram um esconderijo no navio e acomodam-se provisoriamente nos aposentados dos empregados.



Com delicadeza, o filme mostra a força de duas crianças numa corrida para a sobrevivência, estando no meio de milhares de imigrantes que vieram para a América construir uma nova vida. O diretor, que já teve filme premiado com o Oscar estrangeiro – ‘Mediterrâneo’ (1991), constrói uma história singela, de pano de fundo real, juntando poesia e lirismo, próprios de seu cinema. As crianças estão bem, e no elenco destaque para Omar Benson Miller, recentemente num papel marcante em ‘Pecadores, aqui como George, um funcionário do navio que acolhe o garoto e a garota, e Pierfrancesco Favino, rosto comum do atual cinema italiano, no papel do capitão da embarcação. Disponível gratuitamente no site do festival até o dia 29/11, em https://festivalcinemaitaliano.com/filmes/de-napoles-a-nova-york/


domingo, 2 de novembro de 2025

Estreias da semana - Nos cinemas e no streaming

 
A meia-irmã feia
 
Chega aos cinemas pela Mares e a Alpha Filmes uma das fitas de terror mais impressionantes do ano, para público de estômago forte. O estiloso ‘A meia-irmã feia’ revisita o conto folclórico sombrio de Cinderela dos irmãos Grimm – que não tem nada de belo como no filme da Disney. Só que pelo ponto de vista da meia-irmã dela, Elvira, considerada feia. É uma história cabulosa: a mãe de Elvira, Rebekka, casa-se com um velho rico e leva as filhas para morar com o casal num castelo antigo. O homem logo morre, e a mãe tem de cuidar sozinha das três filhas. Rebekka se endivida, não tem como pagar despesas e comprar comida, então enxerga em Elvira um futuro; ela forçará a menina feia a passar por uma série de tratamentos estéticos brutais para se tornar bela a fim de conquistar o príncipe do condado. Num reino onde a beleza impera, a coitada da garota se sujeitará a todo tipo de tortura para ser vista, como transformação do nariz, que será quebrado e colocado numa forma para ficar redondinho, novos cílios, que serão costurados no olho etc. Sombrio, com homenagens ao cinema de Cronenberg – há uma cena do cirurgião que remete a ‘Gêmeos – Mórbida semelhança’, é um filme indigesto, com cenas fortíssimas de violência e algumas escatológicas, que podem dar ânsia, como a do ovo de tênia e o horrendo desfecho com a machadinha no pé. A personagem de Cinderela, a irmã de Elvira, fica em segundo plano, pois o enfoque é na outra garota. É um tipo de filme que beira o exploitation, com momentos gore. E tem sequências propositalmente bregas, com trilha sonora de conto de fadas e uma fotografia com exageradas tonalidades rosas, em especial nas da imaginação da menina em torno do príncipe encantado. Satiriza o comportamento consumidor que busca o padrão de beleza, os procedimentos estéticos e a imposição da sociedade em busca do corpo perfeito. Foi destaque no Festival de Sundance e no de Berlim, que conta no elenco com Lea Myren, Ane Dahl Torp e Thea Sofie Loch Næss. Escrito e dirigido pela norueguesa Emilie Blichfeldt, em sua vultuosa estreia, que deu o que falar entre o público e por ser terror até que reuniu boa bilheteria – o filme é uma coprodução Noruega, Dinamarca, Romênia, Polônia e Suécia.


 
Brincando com fogo
 
Vincent Lindon ganhou o prêmio de melhor ator no Festival de Veneza por este filme amargo sobre relação de pai e filho, um drama em que ele interpreta um viúvo, pai de dois rapazes, que agora passa a viver sozinho, já que ambos saem de casa; o filho mais novo muda-se para Paris para estudar, enquanto o mais velho envolve-se com grupos de extrema-direita que frequentam clubes clandestinos de luta - interpretado pelo ator Benjamin Voisin. Este afasta-se do pai, que não aceita o novo comportamento do rapaz nem de seus amigos ligados a movimentos extremistas. É um drama tenso, visceral, que circunda a relação entre os dois, com embates e conflitos geracionais, até que um crime mudará o rumo da família. Profundo, traz para discussão um tema complexo extremamente atual, sobre o crescimento de grupos extremistas ligados a práticas criminosas, aqui os clubes de luta proibidos, em que jovens se esmurram até morrer. Lindon brilha em cada cena que aparece, num papel que parece ter sido feito para ele; Voisin também segura o filme numa explosão de interpretações memoráveis. São dois atores franceses de peso, de gerações diferentes – Lindon já é veterano, tem 67 anos, fez mais de 80 filmes, como ‘Tudo por ela’ e ‘Titane’, enquanto Voisin é um rosto novo, com apenas 28 anos já atuou em mais de 20 produções, frequente no cinema de François Ozon, como ‘Verão de 85’ e no recente ‘O estrangeiro’. Com o decorrer da história, pesa um clima de tragédia no ar, e o drama se transforma em suspense, levantando questionamentos importantes. Realizado por uma dupla de cineastas, as irmãs Delphine Coulin e Muriel Coulin, de ’17 meninas’, com roteiro delas, adaptado do livro de Laurent Petitmangin ‘O que é preciso à noite’. Além de melhor ator, o filme ganhou outros dois prêmios em Veneza, onde concorreu à principal categoria, o Leão de Ouro. Está nos cinemas, com distribuição da Imovision.
 


 
Delírio
 
Terror sobrenatural costarriquenho, coproduzido no Chile, que mais deixa subentendido do que explicita, num bom exemplar de horror psicológico. Masha, uma menina de 11 anos, muda-se com a mãe para a casa da avó, que está com demência. Elas sentem ao redor a presença de algo ameaçador, então Masha é isolada num ambiente fechado para que nada aconteça a ela. Será aquilo real ou apenas a manifestação do medo? Partindo de lendas como a do vampiro eslavo Vourdalak, o filme cria um clima de tensão crescente, com apenas três mulheres em cena, trancadas numa velha casa de madeira. O filme se faz justamente na apresentação do vazio da casa, dos móveis, do silêncio e dos sussurros, que cria uma ambientação de isolamento e desconfiança de que alguma presença fantasmagórica possa circular ali. Um filme no mínimo inquietante, feito por uma cineasta no auge da carreira, Alexandra Latishev Salazar. Exibido nos festivais de Shanghai e Guadalajara e na Mostra de Cinema de SP, está nos cinemas brasileiros, distribuído pela Filmes do Estação.
 


 
Se não fosse você
 
Teve estreia com números razoáveis de bilheteria o novo drama romântico do diretor de ‘A culpa é das estrelas’ (2014), Josh Boone, que novamente recorre ao universo literário de uma autora do momento (Colleen Hoover) para levar aos jovens uma história de amor melosa. O filme se centra em dois núcleos de personagens – mãe e filha, com seus respectivos relacionamentos amorosos. A adolescente Clara (Mckenna Grace) se apaixona por um rapaz da mesma escola, Miller (Mason Thames). A mãe dela, Morgan (Allison Williams), não aceita o romance, e as duas se atritam. Até que um dia, uma tragédia toma conta da família Grant – o pai de Clara, marido de Morgan, morre num acidente de carro, juntamente com a cunhada, irmã de Morgan. A suspeita é de que o marido traía a esposa com a irmã, o que desencadeia uma série de conflitos e busca por memórias do passado. Vejo dois grandes problemas no filme – a escolha do elenco e o excesso de tramas paralelas que não são bem desenvolvidas. No primeiro quesito, um elenco fraco, em especial Allison, que não acho boa atriz, Mckenna Grace e Dave Franco, todos sem graça; já o segundo ponto: nos livros há espaço de sobra para se escrever sobre muitos personagens, mas no cinema é preciso condensar de forma que o público entenda, o que não funcionou direito aqui, já que tudo fica perdido – Clara, por exemplo, vai perdendo o foco para a história da mãe, que no segundo ato torna-se mais importante do que a da protagonista. Não curti o resultado, mas filmes como este acabam encontrando seu público, pois dramas românticos ainda estão no top de procura dos espectadores. Está nos cinemas desde o dia 23/10 pela Sony Pictures.
 


 
A vizinha perfeita
 
Todos comentam sobre o novo documentário da Netflix, que estreou na metade de outubro e só ontem pude conferi-lo. Premiado em Sundance, o filme tem uma forma original, com 90% das cenas compostas por imagens de câmeras de gravação do uniforme de policiais americanos. O filme acompanha um caso policial na Flórida, que terminou em tragédia, envolvendo a discussão e os constantes atritos de uma vizinha com os moradores do bairro entre 2022 e 2023. Ela é Susan Lorincz, uma senhora de 58 anos que morava sozinha num pacífico bairro da cidade de Ocala, no condado de Marion, Flórida. Por mais de um ano, quase que diariamente ela fazia ligações para a polícia reclamando de seus vizinhos, especialmente das crianças do bairro; segundo ela, viviam xingando-a e falando alto no terreno vazio ao lado de sua casa. Os atritos crescem, a mulher torna-se uma ameaça, até que em junho de 2023 Susan mata a tiros uma das vizinhas, Ajike Owens, mulher negra, mãe de quatro filhos. Ela é detida, e o caso vai a julgamento. O filme é todo composto por arquivos das câmeras policiais, onde vemos tudo ‘ao vivo’ – são diversos ângulos, que captam momentos ao longo de um ano de trabalho dos policiais quando solicitados para averiguação no bairro de Susan, acusada de diversos crimes, como racismo, comportamento inadequado, calúnia e difamação, além de tentativas de agressão. O roteiro do filme é um compilado sequencial dessas imagens das câmeras, que mostram o bairro, Susan, a vítima, Ajike, até o desfecho trágico – nos últimos 30 minutos, as cenas são das câmeras de vigilância do depoimento da mulher na delegacia e gravações no tribunal do júri. O filme escancara uma questão mal resolvida nos Estados Unidos, que é a liberação de armas e uma tese apontada como sensível, a da ‘legítima defesa ampliada’, que está na constituição de vários estados americanos, e, para alguns, é a liberdade para cometer crimes. ‘A vizinha perfeita’ é um filmão, e não tem como desgrudarmos o olho da TV. Já na Netflix.



Especial de cinema

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