segunda-feira, 9 de agosto de 2021

Cine Lançamento



A casa que Jack construiu

O engenheiro Jack (Matt Dillon) é na realidade um serial killer que ataca mulheres e sofre de TOC. Ele tem um método próprio: após assassinar as vítimas, guarda seus corpos em um frigorífico desativado para um projeto futuro.

Causou indignação com direito a vaias no Festival de Cannes em 2018 o filme mais perverso e polêmico do cineasta dinamarquês Lars von Trier, o mesmo de “Dançando no escuro” (2000), “Dogville” (2003), “Melancolia” (2011) e “Ninfomaníaca – partes 1 e 2” (2013). E é o seu segundo longa na linha de terror psicológico, depois do também controverso “Anticristo” (2009). Na exibição em Cannes, parte da plateia abandonou a sessão, reclamando da violência explícita (exatamente numa das cenas mais chocantes, a caçada em que o protagonista mata crianças com um rifle). O diretor fez esse seu projeto ultrapessoal em resposta às acusações sofridas no festival, de que ele era misógino e nazista. A vingança veio dura, numa fita de arte perturbadora, macabra, indigesta e para público restrito.
Matt Dillon está maduro e super bem no papel difícil do serial killer Jack, um engenheiro que mata mulheres de inúmeras maneiras. O psicopata narra todos seus crimes em cinco capítulos (chamados de “incidentes”) para um interlocutor de nome Virgílio (papel de Bruno Ganz, num de seus últimos trabalhos - ele morreria em 2019 aos 77 anos). Virgílio faz referência ao maior poeta romano, autor de ‘Eneida’, que passa a ouvir as falas e evocações do protagonista, chega a dar conselhos e tramar com ele - Virgílio também teria outras simbologias, como o diabo e até a própria mente de Jack em suas indagações.


Virgílio (com uma voz gutural de amedrontar) e Jack filosofam acerca de obras-primas da História da Arte, falam de momentos históricos (como o Nazismo), onde se discute a grandiosidade e a beleza da arquitetura e das pinturas, e num dado momento até há uma menção ao próprio cinema de Trier, com cenas de seus filmes. E numa belíssima sequência alegórica em slow-motion eles imitam ‘A divina comédia’, de Dante Alighieri, navegando numa barca quando seguem para visitar o inferno.
Enquanto a conversa se desenrola com Virgílio, Jack comete crimes bárbaros, tortura as vítimas, esconde seus corpos em um frigorífico desativado, e até registra fotos dos mortos. Só que ele não é um assassino comum: ele tem TOC, precisa voltar à cena do crime várias vezes para checar se ficou tudo limpo, se nada vai incriminá-lo. E tudo prepara Jack para um objetivo maior: um projeto de engenharia referente à construção de uma casa com materiais únicos (e no desfecho você ficará aturdido com a escolha dele).
Com um humor macabro que chega a ser agressivo, o filme descontrói paradigmas e cria situações incômodas para exibir com sordidez a mente de um psicopata e fazer uma analogia à banalidade da violência no mundo contemporâneo.
Repito que é um filme para poucos, tachado até de doentio, com cenas de mortes brutais (em uma delas ele mutila o seio de uma mulher). Longo em seus 154 minutos e complexo, traz rápidas participações de atores e atrizes em momentos marcantes, como Uma Thurman, Riley Keough, Siobhan Fallon Hogan, David Bailie e Jeremy Davies.


Novamente colabora no roteiro com Trier Jenle Hallund, que haviam feito “Melancolia” e “Ninfomaníaca – volume 1”.
A pedido dos colecionadores, a Versátil lançou o filme em bluray em parceria com a California Filmes; acaba de sair no Brasil em edição especial em disco duplo, contendo, além do filme em BD, um disco em DBD com duas horas de extras, com dois cards, pôster e livreto.

A casa que Jack construiu (The house that Jack built). Dinamarca/ Suécia/ França, 2018, 153 minutos. Drama/Horror. Colorido. Dirigido por Lars Von Trier. Distribuição: Versátil

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