quinta-feira, 17 de abril de 2025

Especial de Cinema

 
‘É Tudo Verdade’ segue até o dia 30 no streaming com 10 curtas-metragens
 
O Festival Internacional de Documentários ‘É Tudo Verdade’ 2025 terminou no último domingo, dia 13, após 11 dias de evento. Nesse ano o festival, que chegou em sua 30ª edição, exibiu gratuitamente 85 filmes de 30 países, em sessões no Rio de Janeiro e em São Paulo. Na cerimônia de encerramento, na Cinemateca, na noite do dia 12, foram apresentados os vencedores do evento 2025. ‘Copan’ e ‘Escrevendo Hawa’ ganharam os prêmios principais, respectivamente nas categorias ‘Competição Brasileira de Longas ou Médias-Metragens’ e ‘Competição Internacional de Longas ou Médias-Metragens’. ‘Sukande Kasáká / Terra doente’ e “Eu sou a pessoas mais magra que você já viu?” foram eleitos, respectivamente, os melhores curtas-metragens brasileiro e internacional. E quem não pode estar presencialmente no festival poderá conferir até o dia 30/04 a uma seleção especial de 10 curtas com exclusividade no streaming Itaú Cultural Play, todos gratuitos. É uma parte do festival disponível ao grande público, com exibição de seis títulos da competição brasileira de curtas nacionais deste ano e quatro curtas antigos dirigidos por Vladimir Carvalho, documentarista homenageado na edição 2025 do ‘É Tudo Verdade’. Segue, abaixo, a programação no Itaú Cultural Play, que pode ser acessado pelo link https://www.itauculturalplay.com.br
 

Competição brasileira de curtas-metragens 2025
 
A Bolha
Direção: Caio Baú
Brasil | 18’ | 2025
 
Cartas pela Paz
Direção: Mariana Reade, Thays Acaiabe e Patrick Zeiger
Brasil | 26’ | 2024
 
Chibo
Direção: Gabriela Poester e Henrique Lahude
Brasil | 18’ | 2024
 
Dois Nilos
Direção: Samuel Lobo e Rodrigo de Janeiro
Brasil | 18’ | 2024
 
Mergulho no Escuro
Direção: Anna Costa e Silva e Isis Mello
Brasil | 28’ | 2024
 
Sobre Ruínas
Direção: Carol Benjamin
Brasil | 17’ | 2025
 
 
Curtas em homenagem a Vladimir Carvalho
 
Romeiros da Guia
Brasil | 15’ | 1962
 
A Bolandeira
Brasil | 10’ | 1969
 
Incelência para um Trem de Ferro
Brasil | 25’ | 1972
 
A Pedra da Riqueza
Brasil | 16’ | 1975
 
 
Filmes conferidos no ‘É Tudo Verdade’ de 2025
 
Abaixo seguem drops de documentários que conferi no festival ‘É Tudo Verdade’ de 2025 – alguns deverão ser lançados nos cinemas e no streaming ao longo do ano.
 
Os ruminantes
 
Estreou no Festival Internacional de Documentários ‘É Tudo Verdade’ ‘Os ruminantes’ (2025), de Tarsila Araújo e Marcelo Cordeiro de Mello, filme em que o roteirista/cineasta Jean-Claude Bernardet relembra a produção que ficou inacabada de ‘A hora dos ruminantes’, uma adaptação cinematográfica do complexo livro do escritor goiano José J. Veiga, idealizado por ele e pelo cineasta Luiz Sergio Person em 1967. No doc, Bernardet relembra o projeto, as dificuldades para o roteiro e para a produção, os entraves com a Ditadura Militar – já que a obra seguiria os passos do livro com sua história simbólica e crítica àquele período, trazendo uma ampla discussão sobre os percalços de se fazer cinema no Brasil, ainda mais numa época rígida de vigilância e censura nos anos 60 e 70. Marina Person, filha do cineasta falecido prematuramente e também diretora e roteirista de cinema e TV, fala em nome do pai, trazendo pontos nunca antes citados sobre Person, alguns deles chocantes quando revela documentos secretos e inéditos de como o pai, alvo de militares no Brasil, foi banido quando tentou fazer cinema em Hollywood, devido ao contato de militares da ditadura com gente influente de Hollywood. Com depoimentos de Bernardet, Marina e de outros nomes que fazem cinema no Brasil, o documentário é um estudo instigante sobre o cinema brasileiro daquele período.
 

 
Lan, o caricaturista
 
De Pedro Vinicíus, o documentário, gravado pouco antes do falecimento do caricaturista ítalo-brasileiro Lanfranco Aldo Ricardo Vaselli Cortellini Rossi Rossini, ou apenas Lan (1925-2020), faz um resgate da trajetória desse incrível artista no Brasil, conhecido pelos desenhos humorísticos de forte teor político. Ninguém escapava das mãos de Lan, cujos traços únicos, poderosos, criavam formas impressionantes. Nômade - por causa do pai instrumentista membro de orquestra sinfônica, morou na infância e juventude em diversos países, como Uruguai e Argentina, lugar este que o acolheu e lá iniciou os primeiros trabalhos como caricaturista em jornais, aos 20 anos de idade. Até se instalar definitivamente em 1952 no Rio de Janeiro, onde colaborou para jornais de grande circulação, como O Globo, Última Hora e Jornal do Brasil. No filme, Lan e sua esposa, a ex-passista da Portela Olívia Marinho, abrem as portas de sua bucólica residência em meio a matas em Petrópolis, no Rio, para relembrar o passado. Lan mostra álbuns antigos de fotografia e recortes de jornais com suas caricaturas. Portanto, é um filme pessoal e íntimo, de extrema leveza, um dos raros filmes que celebram a caricatura como instrumento artístico e também de contestação por meio do humor.
 


Copan
 
O gigantesco edifício Copan, fincado na avenida Ipiranga, no centro de São Paulo, é o personagem central desse filme-mosaico interessantíssimo, que agrega elementos notórios em sua produção, como fotografia, som e edição. Coprodução Brasil e França, dirigido por Carine Wallauer, o filme, grande vencedor do ‘É Tudo Verdade’ desse ano, na ‘Competição Brasileira de Longas ou Médias-Metragens’, acompanha histórias de moradores e funcionários do antigo prédio, inaugurado em 1966, cuja arquitetura singular de linhas sinuosas foi concebida por Oscar Niemeyer. É considerado o edifício com maior estrutura de concreto armado do país, em seus 115 metros de altura, 32 andares e 1160 apartamentos divididos em seis blocos – e lá residem pessoas de diferentes classes sociais, sem contar os mais de 70 estabelecimentos comerciais. A câmera fica estacionada observando a rotina das pessoas no edifício, dentro e fora dos apartamentos – o filme foi gravado durante a campanha presidencial de 2022, e muito traz desse ambiente, tratando da disputa acirrada entre os candidatos Lula e Bolsonaro, e os ânimos exaltados de apoiadores dos dois lados. O filme faz um reflexo sobre desigualdade social e a questão da moradia na maior cidade da América Latina. O início e o término do filme se completam com uma gravação impressionante, acredito eu que de drone, que lentamente se aproxima do edifício e, no desfecho do doc, vai se afastando. Um dos melhores longas do festival ‘É Tudo Verdade’ de 2025, tem como distribuidora a Vitrine Filmes, que deve lançá-lo em breve nos cinemas. Exibido no CPH:DOX, importante festival de documentários, em Copenhagen.
 

 
Estrada azul – A História de Edna O’Brien
 
Doc irlandês de 2024, assinado por Sinéad O'Shea, sobre a escritora feminista Edna O’Brien (1930-2024) e a relação dela com suas tramas polêmicas e engajadas, que dividiam opiniões. Os romances de Edna focavam na libertação da mulher de uma sociedade misógina e machista, e alguns deles ficaram famosos, como ‘The country girls’ - estreia da escritora em 1960, primeira parte de uma trilogia e que foi banido da Irlanda por ser considerado escandaloso ao tratar da vida sexual das mulheres. O filme traz depoimentos de amigos próximos, como o ator e também escritor Gabriel Byrne e o romancista Walter Mosley, e tem a própria Edna contando fatos de sua carreira, bastante debilitada na época da gravação, aos 93 anos – ela faleceria meses depois. Mostra tanto o lado poético e criativo dela ao escrever seus livros e também da agitada vida social adotada, quando fazia festas em sua elegante residência em Londres, onde participavam Marlon Brando, Jane Fonda e Paul McCartney. Edna faleceu endividada e sozinha, deixando um legado na literatura escrita por mulheres. Quem narra o filme é a atriz indicada ao Oscar por ‘A filha perdida’ (2021) Jessie Buckley. Gostei demais do longa e espero que seja lançado no Brasil após o percurso no Festival ‘É Tudo Verdade’.
 
 
Esperando por Liat
 
Para mim, o melhor documentário internacional que conferi no festival ‘É Tudo Verdade’, possível candidato ao Oscar de melhor documentário em 2026. Produção norte-americana ganhadora de dois prêmios no Festival de Berlim, dentre eles o do Júri Ecumênico na seção ‘Forum’, o doc narra a angustiante jornada de uma família israelense, que reside nos Estados Unidos, à espera de notícias da filha, Liat Atzili, uma professora de História sequestrada juntamento com o marido pelo grupo terrorista Hamas, em outubro de 2023. Em meio a telefonemas incessantes em embaixadas e negociação na Casa Branca, o pai de Liat corre contra o tempo para encontrar uma solução para trazer a filha de volta. Em casa, a mãe de Liat cuida dos netos adolescentes, filhos da mulher sequestrada, e é amparada pelos amigos. É um documentário íntimo, dentro do seio de uma família despedaçada numa espera atordoante – durante o longa-metragem, ouvimos, por telefone, informações sobre o Hamas libertando reféns aos poucos, avisando familiares por meio de listas, e o nome de Liat nunca chega. Por isso é um filme duro, aflitivo, que nos prende até o emocionante desfecho, como se fosse um filme de suspense, mas um suspense das tragédias reais da vida.
 
 
A invasão
 
Premiado em dezenas de festivais de cinema pelo mundo, como Cannes, o cineasta russo Sergei Loznitsa acaba de receber indicação à Palma de Ouro pelo novo trabalho, ‘Two prosecutors’ (2025), ainda sem data para estrear no Brasil. Diretor e roteirista criador de filmes históricos, muitos de guerra, como ‘Na neblina’ (2012), ‘Maidan’ (2014) e ‘Donbass’ (2018), Loznitsa alterna filmes de ficção e documentários. A obra anterior a ‘Two prosecutors’ é esse ‘A invasão’ (2024), doc que concorreu ao Golden Eye em Cannes e que analisa a insana guerra da Rússia contra a Ucrânia e os desdobramentos da invasão de um país ao outro. Coprodução EUA/Holanda/França, o filme é composto por breves fragmentos da rotina dos ucranianos, que tentam reconstruir seu território destroçado por um interminável conflito bélico com a Rússia, que começou em 2014, porém se intensificou com a invasão ao país em 2022, episódio que deixou milhares de mortos e milhões de desabrigados – os números são incertos. No filme, que é bem longo (145’) e exige atenção e paciência do público menos inserido em fitas de arte, vemos um longo processo de captação de imagens sublimes, algumas caóticas e outras poéticas – são civis e soldados ucranianos sendo treinados para a guerra, de sobreviventes que voltaram do conflito sem partes do corpo e hoje fazem fisioterapia, professores que preparam os alunos para fugir quando ouvirem sirene de ataque aéreo, manifestações nas ruas pelo fim da guerra, casamentos e cortejos fúnebres, habitantes de cidades sob escombros recolhendo pertences etc. Sem focar em cenas de violência visual como bombardeios e mortos pelo chão, o filme é um estudo psicológico dos traumas de uma guerra, do mal moral de um conflito insano que nunca cessa, de pessoas inocentes reconstruindo suas vidas. O registro das imagens é preciso, algumas cenas são curiosas, outras realmente contundentes e parte delas simbólicas. Filmado num período de dois anos, é uma crônica sobre a resistência ucraniana.
 

 
O jardineiro, o budista e o espião
 
Coprodução Reino Unido/Noruega/Alemanha de 2025, dirigido por um premiado cineasta norueguês, Håvard Bustnes, é um documentário instigante que fala sobre identidade e espionagem. Rob Moore, produtor de programas de comédia na TV britânica, é hoje um cidadão solitário, que mora só, autodeclara-se budista, faz meditações e cuida minuciosamente do jardim de sua residência. Só que seu passado guarda segredos obscuros - por cinco anos forjou ser jornalista se infiltrando num grupo de ativistas que lutavam contra o uso do amianto, um minério cancerígeno usado em diversos produtos industriais, atualmente proibido em vários países. Ele sempre defendeu que lutava contra a corrupção e contra essa indústria milionária que poluía e matava pessoas, porém investigações mostraram que ele agia como espião da máfia da indústria do amianto. Sua versão é contestada a partir de reportagens da grande mídia. Moore, no filme, dá entrevistas para um jornalista, defendendo-se de todas as acusações contra ele. Fica a pergunta: Moore é bandido ou herói? Bom filme do Festival ‘É Tudo Verdade’, que exige atenção pelas reviravoltas uma atrás da outra, compondo uma incrível e estranha história.


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