quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

Cine Especial


Em DVD, dois filmes distribuídos pela The Originals: "O anjo malvado" (1993, com Macaulay Culkin e Elijah Wood) e "The Square - A arte da discórdia" (2017, com Claes Bang e Elisabeth Moss).


O anjo malvado

Após a morte da mãe, o menino Mark (Elijah Wood) é levado para passar uma temporada na casa dos tios. Fica próximo do primo, Henry (Macaulay Culkin) e ambos se divertem à beça caçando, brincando e andando pelas montanhas. Com o transcorrer dos dias, Mark suspeita que Henry tem comportamento violento e ameaçador, o que pode colocar em risco sua vida. 

Originalmente da 20th Century Fox, “O anjo malvado” (1993) repercutiu muito na época do lançamento e depois passou inúmeras vezes na TV. Fala de um menino aparentemente tranquilo que acolhe o primo quando sua mãe morre. Mas com o passar dos dias, ele se demonstra sádico, com comentários ofensivos e violento, mas sempre é visto pela família como um garoto acima de qualquer suspeita. O roteiro é bem construído, com um suspense que cresce e atinge níveis de filme de terror, assinado pelo inglês Ian McEwan, escritor de quatro romances que foram bem adaptados para o cinema, “Uma estranha passagem em Veneza” (1990), “O inocente” (1993), “Amor obsessivo” (2004) e “Desejo e reparação” (2007). McEwan se inspirou no suspense “A semente maldita” (1956), também conhecido como “Tara maldita”, sobre uma garotinha boazinha que esconde um lado psicopata – o filme foi polêmico quando lançado nos anos de 1950 e teve quatro indicações ao Oscar, incluindo a atriz mirim Patty McCormack, então com 11 anos. O resultado dá certo não só devido ao roteiro de impacto, com momentos perturbadores e um desfecho memorável e triste, mas também pelas mãos do diretor Joseph Ruben, que realizou filmes de terror e suspense conhecidos do público, como “Morte nos sonhos” (1984), “O padrasto” (1987), “Dormindo com o inimigo” (1991) e “Os esquecidos” (2004). Outro ponto que mantém a credibilidade é a atuação dos dois atores mirins em início de carreira e que se tornaram astros: Macaulay Culkin e Elijah Wood (eles ficaram muito amigos durante a produção e mantém fortes laços até hoje).



Macaulay Culkin (que está sumido, é pai de uma menina e tem 42 anos) viu a carreira crescer três anos com “Esqueceram de mim” (1990), pelo qual foi indicado ao Globo de Ouro de ator, e depois faria outro sucesso do cinema, “Meu primeiro amor” (1991). Parou de atuar em 1994, com o filme “Riquinho”, e só voltou em 2003, com o polêmico drama “Party monster” (2003). De lá pra cá, fez uma ou outra participação em séries. Publicou um livro autobiográfico em 2006, depois fundou uma banda de rock com humor e atualmente trabalha com podcast. Teve problemas com drogas e álcool, foi preso por posse de maconha e viveu intensas brigas com o pai, que era uma espécie de agente/agenciador, considerado pelo próprio filho um explorador.
Já Elijah Wood também firmou carreira como ator mirim e nunca mais parou: completou 42 anos em janeiro, iniciou no cinema com oito anos e fez mais de 80 filmes, incluindo um dos maiores sucessos da História do cinema, a trilogia “O senhor dos anéis” (entre 2001 e 2003), no papel do principal, Frodo Baggins. Hoje é produtor de cinema, atua bastante em filmes alternativos, fundou uma gravadora de música e ainda é DJ. Em “O anjo malvado” podemos apreciar um trabalho de corpo e alma desses dois atores, quando estavam em formação e já tinham talento de sobra.
Aparecem no filme a irmã e o irmão de Macaulay, Quinn e Rory Culkin – somente Rory seguiu carreira no cinema. O filme teve problemas na produção, principalmente por causa do pai de Macaulay, Kit Culkin, que era ator e levava o filho pra cima e pra baixo interferindo nas cenas e exigindo muito dele e dos contratantes – para se ter uma ideia o diretor original seria Michael Lehmann, de “Atração mortal” (1988), porém houve uma briga entre Michael e Kit, que pediu a substituição imediata do diretor, o que acabou ocorrendo. Houve ameaças de parar as gravações, demorou para terminar as gravações, até que saiu – e isso tudo não interfere no produto final, pois o filme é bom, carregando cenas que nunca mais esqueceremos, como a do boneco arremessado de cima do viaduto que termina em acidentes de carro, a da pista de patinação no gelo e o atordoante final, no desfiladeiro. Revendo hoje, depois de 30 anos que assisti no cinema, continua instigante, e Macaulay permanece sinistro no papel do vilãozinho.
Completam o filme a trilha sonora de Elmer Bernstein, de “Sete homens e um destino” (1960), e a ótima montagem de George Bowers, que trabalhou em vários filmes do diretor, Joseph Ruben, como “Justiça corrupta” (1988), e outros filmes como “Atirando para matar” (1988) e “Do inferno” (2001). No elenco coadjuvante, participações de Wendy Crewson, David Morse e Jacqueline Brookes.
Recém-lançado em DVD pela The Originals, um site de venda de filmes que agora vem lançado DVDs e Blurays de filmes novos e antigos, como “Os monstrinhos” (1989), “The Square – A arte da discórdia” (2017) e “Em chamas” (2018).
O filme em DVD não tem extras, apenas uma luva e dois cards colecionáveis (tem áudio com dublagem em português da época).

O anjo malvado (The good son). EUA, 1993, 86 minutos. Suspense. Colorido. Dirigido por Joseph Ruben. Distribuição: The Originals



The Square – A arte da discórdia

Um curador de arte entra em colapso para lançar uma exposição contemporânea no museu de Estocolmo.

Ganhou, até de maneira inesperada, a Palma de Ouro em Cannes em 2017 esse filme de arte controverso que destila uma crítica feroz ao mundo das artes, ou melhor, do circuito de arte, tanto de quem produz quanto de quem consome (a crítica se faz especificamente às artes visuais contemporâneas, campo em que quase tudo é visto como arte). Em Cannes ganhou ainda um prêmio técnico, e o filme foi indicado ao Oscar e ao Globo de Ouro de filme estrangeiro, representante da Suécia.
Com “The Square” o diretor sueco Ruben Östlund alcançou prestígio fora de sua terra natal, onde havia dirigido pelo menos três fitas independentes – “Involuntário” (2008), “Play (2011) e “Força maior” (2014 – essa indicada ao Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro). Em “The Square” trabalhou com dois nomes do cinema americano, Elisabeth Moss, do filme de terror “Nós” (2019) e das séries “Top of the lake” (2013-2017) e “O conto da aia” (2017-), e Dominic West, do filme “300” (2006) e da série “A escuta” (2002-2008). E agora está vendo o auge da carreira: seu último trabalho, “Triângulo da tristeza” (2022), acaba de receber três indicações ao Oscar, e nas categorias, a de melhor diretor (as outras são melhor filme e roteiro original, escrito por ele também). É o segundo longa de Östlund a ganhar a Palma de Ouro (“The Square” foi o primeiro), e “Triângulo da tristeza” é o mais fora da curva e extremamente escatológico (que dividiu opinião e amores), previsto para estrear nos cinemas do Brasil no dia 02 de março. 
“The Square” está a milhas de ser uma obra de fácil acesso – tem todo um emaranhado de simbologias, é longo demais para grande parte do público (tem 150 minutos) e conta com um humor sofisticado e ácido. Ou seja, um filme particular, típico de festival, de um diretor que experimenta novas técnicas. Quem frequenta museus, galerias de arte e exposições vai rir de piadas como a do título, em referência a uma arte que é um quadrado (“square”) numa praça, que vai gerando situações à beira do ridículo e conflitos diversos, e em outro momento, a da explicação confusa do curador do museu de Estocolmo (Claes Bang - ator dinamarquês, de “Millennium: A Garota na Teia de Aranha”, de 2018), sobre os caminhos da arte para uma jornalista (Elisabeth Moss) durante uma entrevista, ou das várias cenas com os montinhos de terra como uma instalação que ninguém visita... Mas tem sequências mais esculachadas, quase nonsense, como a do homem com Síndrome de Tourette que xinga na plateia quando um artista (Dominic West) vai falar sobre suas obras ou da transa entre os personagens de Moss e Bang com preferências incomuns. Há subtramas que se alongam e permeiam outras histórias, como o sumiço da carteira, e ainda uma em especial que chega a ser angustiante, uma espécie de arte de intervenção com Oleg, um “homem macaco” (papel impressionante e bem rápido de Terry Notary) num jantar cheio de gente rica, que acaba em violência.



É uma sátira provocadora e perspicaz, inteligente, em cima da arte contemporânea e do que é considerado arte hoje. Eu, como professor de artes visuais, curti na primeira vez que assisti, na Mostra de Cinema de São Paulo em 2017, e ontem revi o filme em DVD, recém-lançado pela The Originals em parceria com a Pandora Filmes – a “The Originals” é um site de venda de filmes que agora está lançado DVDs e Blurays de longas novos e antigos, com seu selo próprio; já lançaram em DVD e BD “The Square” e “Em chamas” (2018), e em DVD títulos como “Onda de crime” (1985), “Os monstrinhos” (1989), “O anjo malvado” (1993), “Acertando as contas com papai” (1994) e “Kids” (1995).
O DVD não traz extras, apenas o filme (em ótima cópia) junto com uma luva de proteção.

The Square – A arte da discórdia (The Square). Suécia, 2017, 150 minutos. Comédia/Drama. Colorido. Dirigido por Ruben Östlund. Distribuição: The Originals

Nenhum comentário: