terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Cine Especial



Tentáculos (1977)


Em um balneário em Ocean Beach, pessoas aparecem mortas de forma enigmática. A guarda costeira inicia uma inspeção nas águas do mar e se depara com um enorme polvo sanguinário.

Cineastas do mundo inteiro já produziram filmes com animais assassinos. Já vimos cachorro, gato, leão, rãs, pássaros, coelhos e até vermes caçando gente. Nas águas, “Tubarão” (1975), de Steven Spielberg, “Orca, a baleia assassina” (1977), de Michael Anderson, e “Piranha” (1978), de Joe Dante, marcaram época com predadores de dentes afiados que buscavam proteger seu habitat e por vezes se vingar da interferência humana. “Tentáculos” (1977) veio nessa onda de filmes, uma produção italiana (o título original era “Tentacoli”), em parceria com a American Internacional Pictures (AIP) de Samuel Z. Arkoff, lendário produtor de filmes de suspense e terror como “Terror em Amityville” (1979) e “Vestida para matar” (1980). Foi rodado em grande parte na Califórnia, com orçamento caro para a época, U$ 5 milhões - mais para pagar o cachê de astros que desfilaram em pontinhas, um chamariz para o público, dentre eles Shelley Winters, John Huston, Henry Fonda, Claude Akins e Bo Hopkins, do que para gastar com efeitos especiais, até porque não há efeitos grandiosos no filme. O custo técnico mais alto envolveu a construção de uma réplica de um polvo gigante, no valor de U$ 1 milhão, que acabou afundando nas águas no primeiro dia de gravação! E o polvo mostrado na quase totalidade do filme era um molusco de verdade, gravado em aquário e perto de recifes, e o aproximá-lo da câmera, ele parecia enorme e feio – esses eram os truques de filmagem que fizeram do cinema a indústria da magia e dos sonhos!
A história é bem fraquinha, não dá medo, tem muitos erros de continuidade, mas é nostálgica e marcou o gosto do público que segue terror: um gigante polvo mutante ataca uma cidade costeira na Califórnia, e a população se une à guarda costeira para se salvar. Nas entrelinhas, há uma referência (e crítica) à interferência humana no meio ambiente causando poluição e destruição: aqui, uma empreiteira constrói um duto subaquático, gerando lixo químico, que contamina um polvo; este sofre mudanças genéticas e vira um monstro assassino.
O filme investe em longas cenas debaixo d’água, e nos momentos de suspense, a boa trilha sonora sobe o tom - Stelvio Cipriani compôs e assinou como S.W. Cipriani reaproveitando a trilha que fez para o filme de ação italiano “Resgate”, de 1973.



O produtor de cinema Ovidio G. Assonitis, egípcio de nascença, assina a produção ao lado de Arkoff e também dirige o filme – ele fez duas fitas de terror, “Espírito maligno” (1974) e “A casa da escuridão” (1981), e codirigiu “Piranhas 2: Assassinas voadoras” (1981 – seu nome não foi creditado, apenas James Cameron, estreante no cinema).
“Tentáculos” saiu num box especial em DVD duplo pela Classicline com a versão de cinema, de 102 minutos, em boa cópia. Também está presente na caixa o “Tentáculos” de 1998, uma espécie de refilmagem, mas com outra história, com mais ação e terror.

Tentáculos (Tentacoli/ Tentacles). Itália, 1977, 102 minutos. Ação/Terror. Colorido. Dirigido por Ovidio G. Assonitis. Distribuição: Classicline


Tentáculos (1998)

Um luxuoso transatlântico inaugura seu primeiro cruzeiro levando a bordo centenas de pessoas. No meio do trajeto, bandidos invadem o navio em alto-mar para roubar joias e dinheiro. O grupo percebe que estranhamente o barco está vazio, ninguém nos quartos, nos salões ou nos corredores. As pessoas foram devoradas por um polvo monstruoso que invadiu o transatlântico, e ele agora irá caçar os criminosos um a um.

Mais movimentado e divertido, com mais cenas do polvo mutante e mortes sangrentas, “Tentáculos”, de 1998, seria uma refilmagem do filme de 1977, porém com outra trama, aproveitando apenas a criatura marinha (que aqui é maior, um verdadeiro monstro gigante, com inúmeras garras e que mata pra valer). O roteiro modificado e ainda mais nonsense é de Stephen Sommers, que dirige o filme também. Ele até mudou o título de “Tentacoli/Tentacles” para “Deep rising” para um tom mais autoral e independente. Criou uma trama de assalto em alto-mar, sem a presença de mocinhos, em que os bandidos lideram um plano criminoso e acabam alvo de algo impensável, um polvo mutante que se alimenta de gente – o filme começa com ação e vai aos poucos se transformando em terror com ficção científica.
Sommers realizou antes “O livro da selva” (1994) e depois faria blockbusters como “A múmia” (1999) e a continuação, “O retorno da múmia” (2001), bem como os horríveis “Van Helsing: O caçador de monstros” (2004) e “G.I. Joe: A origem de Cobra” (2009), ambos vencedores de prêmios de piores produções (tanto o Razzie quanto o Stinkers Bad Movie), e por fim, em 2013, faria seu melhor trabalho (ao lado de “Tentáculos”), “O estranho Thomas”, uma fita bem moderna de terror com ação, que ninguém viu e virou cult. “Tentáculos” também virou cult com o tempo: custou caro (U$ 45 milhões), fracassou nos cinemas, rendendo somente U$ 11 mi, e se popularizou em VHS no fim dos anos de 1990 (lembro que na época foi difícil locá-lo, pois muita gente queria assistir).



Escalaram nomes conhecidos como Treat Williams e Anthony Heald, e novos rostos em ascensão, Famke Janssen (que ganhou destaque três anos antes em “007 contra GoldenEye”), Kevin J. O’Connor, Djimon Hounsou (depois seria indicado a dois Oscars), Cliff Curtis e Jason Flemyng. Eles se divertem em cena e fazem o filme acontecer com perseguições bem boladas, tiros para todos os lados, invenção de esconderijos e loucas escapadas do monstro. Traz elementos precisos de um bom cinemão, mas para entrar nele temos de perdoar sequências completamente absurdas e canastrões dando cartadas. Ajuda a trilha de Jerry Goldsmith, que de 18 indicações ao Oscar ganhou pela de “A profecia” (1976) – ele foi um mestre, fez maravilhas como “Planeta dos macacos” (1968), “Papillon” (1973) e “Chinatown” (1974).
O filme saiu mês passado num box especial pela Classicline, em disco duplo, juntamente com o “Tentáculos” original, de 1977.

Tentáculos (Deep rising). EUA/Canadá, 1998, 106 minutos. Ação/Terror. Colorido. Dirigido por Stephen Sommers. Distribuição: Classicline

sábado, 18 de fevereiro de 2023

Cine Cult


Alligator – O jacaré gigante

Filhote de jacaré, despejado por uma família no vaso sanitário, cresce nos esgotos alimentando-se de restos de animais que serviam de experiências genéticas de um laboratório. O gigantesco animal sai dos dutos à noite para atacar a população da cidade.

Ágil filme de terror muito lembrado pelos fãs do gênero, que era exibido com frequência em sessões da tarde na TV Aberta. Ganhou agora uma edição em DVD bem legal, pela Classicline: um box duplo, com o filme em boa qualidade e acompanha ainda a continuação, “Alligator II: A mutação” (1991), com Joseph Bologna, Dee Wallace e Richard Lynch – é outro filme, com novo diretor e mais sangrento e absurdo.
“Alligator”, feito em 1980 e lançado em 1981 nos cinemas, foi inspirado em “Tubarão” (1975) e também em uma lenda urbana sobre bebês jacarés abandonados no vaso sanitário que cresciam nos esgotos e invadiam os dutos da cidade atacando as pessoas (como ocorre no filme). A partir dessa ideia o diretor Lewis Teague rodou seu primeiro sucesso de público, um filme de terror tenso e com mortes caprichadas (e realmente toda a construção do clima lembra “Tubarão”, com o animal sondando as vítimas). A história é original, assinada por Frank Ray Perilli, de fitas de terror B como “Zoltan: O cão vampiro do Drácula” (1977) e “O dia do juízo final” (1977), e roteiro desenvolvido por John Sayles, o mesmo de “Piranha” (1978) e “Grito de horror” (1981). Apesar das ideias impossíveis, mas próprias de cinemão entretenimento, toca na questão da mutação, de animais modificados no meio quando contaminados (ou seja, uma crítica à destruição do meio ambiente e das experiências radicais em laboratórios com bichinhos indefesos).



Assim como “Tubarão”, foram utilizados dois animais para o filme: um jacaré real e um animatronic (um jacaré robô, apelidado de Ramon). No elenco há essencialmente nomes masculinos, como dois indicados ao Oscar, Robert Forster e Michael V. Gazzo, e ainda Dean Jagger, Jack Carter e Sydney Lassick.
O diretor Lewis Teague voltaria com filmes de terror com animais, em “Cujo” (1983), baseado em livro de Stephen King, e “Olhos de gato” (1985), com várias histórias de terror, sendo uma delas com um gato. Dirigiu ainda a continuação de “Tudo por uma esmeralda” (1984), “A joia do Nilo” (1985), e fitas de ação como “Comando imbatível” (1990) e “Aliança mortal” (1991).


Alligator – O jacaré gigante (Alligator). EUA, 1980, 91 minutos. Terror. Colorido. Dirigido por Lewis Teague. Distribuição: Classicline

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023

Cine Lançamento


Morte a Pinochet

Já se passaram quinze anos desde o golpe de Estado que depôs o presidente Salvador Allende e colocou no poder o ditador Augusto Pinochet no Chile. Um grupo de jovens revolucionários tenta então matar Pinochet para pôr fim àquele regime autoritário.

Com uma trama ágil e bem arquitetada, que ajuda a compreender os tempos sombrios que varreram a América Latina nos anos de 1970 e 1980, o filme independente chileno “Morte a Pinochet” (2020) estreou ontem em alguns cinemas brasileiros pela A2 Filmes. Tem drama, ação e suspense na medida certa para uma fita crítica e certeira, reunindo diálogos sérios sobre política e luta armada. Remonta uma história verídica, ocorrida em setembro de 1986, quando um grupo de jovens revolucionários planejou matar o ditador chileno Augusto Pinochet para pôr fim ao regime ditatorial no país. Eram homens e mulheres engajados no movimento armado do Partido Comunista Chileno, que tinham um ideal absoluto: mudar os rumos da História do Chile, mesmo que partindo para um ataque criminoso sem precedentes. Mas o plano, como já era imaginado, seria difícil de ser cumprido.
No filme o grupo é composto por um professor de educação física idealista, uma psicóloga que abandonou a família rica para viver na clandestinidade e um rapaz nascido nas favelas de Santiago que gosta de futebol e começa a se interessar por política. Entre eles nascerá um elo de confidencialidade – durante o filme constrói-se um lado humano dos personagens, como lidam com seus problemas pessoais, com a família e a profissão etc.



A ditadura militar no Chile, entre 1973 e 1990, deixou mais de três mil mortos (número contestado, pois se acredita que o número passou de nove mil), além de 38 mil torturados, e forçou mais de 200 mil chilenos ao exílio. E destruiu a economia do país, algo que se reflete nos dias atuais.
Anotem aí e tentem ver, é uma boa descoberta! Curtinho (84 minutos), foi indicado ao Golden Frog no festival polonês Camerimage.

Morte a Pinochet (Matar a Pinochet). Chile, 2020, 84 minutos. Drama/Suspense. Colorido. Dirigido por Juan Ignacio Sabatini. Distribuição: A2 Filmes

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Cine Lançamento


A conferência

Em uma mansão à beira de um lago na região de Wannsee, em Berlim, um grupo de 15 homens do alto escalão do regime nazista marca presença em uma reunião no dia 20 de janeiro de 1942. Durante a conversa, que durou quase duas horas, determinariam o ato derradeiro do extermínio judeu nos campos de concentração. O encontro ficou conhecido como “Conferência de Wannsee”.

Feito para a TV alemã, foi distribuído como filme de cinema em centenas de salas do mundo, inclusive no Brasil, onde também foi exibido no Festival do Rio, no ano passado. "A conferência" (2022) é um drama contundente, difícil de acompanhar até o final, pois trata de um tema complexo, amargo e angustiante, o Holocausto. Mas o Holocausto visto de outra forma, sem morte ou cenas de sofrimento de pessoas. Ele acompanha como se deu a Solução Final, de como foi pensado o assassinato em massa de milhões de judeus na Segunda Guerra Mundial. O genocídio devidamente organizado ocorreu a partir da “Conferência de Wannsee”, em que parte da cúpula nazista se reuniu numa sala fechada e rascunhariam tal atrocidade. Era um dia comum, 20 de janeiro de 1942, quando o diretor do Departamento de Segurança do Reich, Reinhard Heydrich, convidou 14 secretários do alto escalão da SS, como representantes do Ministério da Justiça e das Relações Exteriores, para um encontro seguido de um café da manhã em sua casa, um palacete localizado numa rua tomada por mansões, na Am Grossen Wannsee, idílica vila no sudoeste de Berlim. Era meio-dia, e a conversa teria aproximadamente duas horas de duração, entrando para a História como a reunião mais terrível e desumana já registrada, com consequências inimagináveis. Não houve documentos formais assinados, nem protocolos oficiais – descobriu-se, depois, apenas um papel de 15 páginas, rabiscado por Adolf Eichmann, diretor do departamento que cuidava de questões judaicas na Polícia do Reich. Na reunião/conferência, foi sistematizada a morte de mais de 11 milhões de judeus, ali decretada a “Solução final da questão judaica” - apesar de que o plano de matar judeus teria começado, em menor escala, sete meses antes. A conferência foi, em suma, deu start a um ato administrativo, sistemático, burocrático e organizado para o genocídio judeu, tanto que uma semana depois, Hitler propagaria o ódio publicamente a judeus em seus discursos e em mídias de massa, como campanhas no rádio.



O telefilme, em seus 108 minutos, fica todo dentro da sala mostrando, em ângulos diversos, os 15 homens em suas conversas sobre o plano mortal - parece um teatro filmado, muito bem interpretado e com momentos de tensão. Matti Geschonneck é o diretor, que fez dezenas de fitas para a TV (nenhuma conhecida ou lançada no Brasil); é casado com a atriz e diretora Ina Weisse, que dirigiu em 2019 um filme de destaque, exibido por aqui, “A professora de violino”.
“A conferência” estreou nos cinemas brasileiros em 03 de novembro de 2022, passou no Festival do Rio e acaba de ser lançado em cinco plataformas online: AppleTV, Claro TV+ (antigo Now), GooglePlay, Youtube Movies e Vivo play, e ainda pode ser alugado na Amazon Prime Video.
PS: A Conferência de Wannsee foi tema de dois telefilmes no passado, “A Conferência de Wannsee” (1984, coprodução Alemanha/Áustria, com Gerd Böckmann) e “Conspiração” (2001, de Frank Pierson, coprodução EUA/Reino Unido da HBO, com Stanley Tucci, que ganhou o Globo de Ouro de coadjuvante, e Kenneth Branagh, indicado ao Globo de Ouro de ator). E teve ainda um documentário alemão sobre o tema, o média-metragem “Die Wannseekonferenz - Die Dokumentation” (2022), inédito no Brasil.

A conferência (Die Wannseekonferenz). Alemanha, 2022, 108 minutos. Drama. Colorido. Dirigido por Matti Geschonneck. Distribuição: A2 Filmes

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Cine Especial


Velozes & furiosos 5 – Operação Rio

Dominic Toretto (Vin Diesel) escapa da cadeia com intervenção do amigo e ex-policial Brian O'Conner (Paul Walker) e da irmã, Mia Toretto (Jordana Brewster). Para ganhar a liberdade definitiva, Toretto reúne os comparsas para uma última e perigosa missão, dessa vez no Rio de Janeiro: o roubo de um cofre. O grupo, para tanto, enfrentará criminosos liderados por um magnata corrupto, Reyes (Joaquim de Almeida).

Na semana passada a Universal Pictures divulgou o trailer do novo filme da franquia, “Velozes & furiosos 10”, que estreia em maio. No trailer é possível ver a sequência mais eletrizante de “Velozes & furiosos 5 - Operação Rio” (2011), a do roubo do cofre da família Reyes, que causa uma destruição lascada nas ruas do Rio de Janeiro. Pois bem, a cena aparece no novo longa porque, segundo a sinopse, o filho do magnata corrupto do quinto capítulo (interpretado por Joaquim de Almeida) será o vilão agora, Dante (Jason Momoa), que quer recuperar o cofre e se vingar da morte do pai. Por causa disso resolvi rever o filme de 2011, seguindo uma tradição que faço há tempos (de assistir a filmes anteriores quando uma continuação será lançada, para lembrar da trama, dos personagens, e nesse, em especial, ver como ficará o gancho para a história).
Comecei a gostar da franquia a partir da reinvenção dos filmes, da nova fase surgida no capítulo quatro, em 2009: fitas explosivas que beiram o absurdo, mas com um lado humanizado na construção dos personagens (a partir do quarto capítulo aparecem situações como divórcio, luto, os dilemas na prisão, crises de identidade etc). Nesse quinto capítulo tem isso e traz um gostinho a mais, pois grande parte foi rodada no Brasil (nos morros e ruas do Rio de Janeiro). Reuniram o elenco original, com destaque para Vin Diesel, Paul Walker e Jordana Brewster, exceto Michelle Rodriguez, que só fez as partes 1, 4 e retornaria no 6 participando até do último, o 9 – ela ameaçou várias vezes deixar o filme, alegando que as mulheres não tinham papel à altura dos homens, reivindicando também uma roteirista mulher para escrever as histórias, e trouxeram de volta três atores do segundo capítulo, “+Velozes + Furiosos” (2003), Tyrese Gibson, Ludacris e Eva Mendes, e escalaram o grandalhão Dwayne Johnson pela primeira vez – o ator deu tão certo que faria quase todas as sequências depois. O vilão ficou para o ator português Joaquim de Almeida (que interpretou muitos criminosos em fitas de ação), que diz muito o que ocorre no Brasil: ele é um homem poderoso que oprime os pobres da favela e rouba dinheiro deles, como faz a milícia.



Há inúmeras cenas movimentadas, ficando para a metade final as artimanhas estrondosas do grupo ao se confrontar com os bandidos. Até então esse filme era o filme mais longo da franquia (as quatro primeiras partes tinham entre 104 e 107 minutos, esse foi finalizado com 130 minutos, e os que viriam depois seriam mais longos ainda, sem contar o acréscimo de situações malucas e nonsense nas tramas – os filmes começaram com corrida de carro e rachas, e depois veríamos escapadas com tanques de guerra, submarinos, voos de carros pelos arranha-céus etc).


Essa parte 5 foi a maior bilheteria até então (custou U$ 125 milhões e rendeu cinco vezes mais, U$ 625milhões), e a partir dele o rendimento só aumentaria – os capítulos 7 e 8, por exemplo, passariam dos U$ 1,3 bilhões de bilheteria cada um.
A franquia completou 22 anos e faz tanto sucesso que ganhou um spin-off bem bacana, “Velozes & Furiosos: Hobbs & Shaw” (2019) e uma série animada da Netflix, “Velozes & furiosos: Espiões do asfalto” (2019-2021).
Quem dirige esse capítulo 5 é Justin Lin, nascido em Taiwan, que realizou os dois anteriores e retornaria na parte 9. Ele assina também a produção ao lado de Vin Diesel.

Velozes & furiosos 5 – Operação Rio (Fast five). EUA, 2011, 130 minutos. Ação. Colorido. Dirigido por Justin Lin. Distribuição: Universal Pictures

domingo, 12 de fevereiro de 2023

Cine Cult



Um lobisomem americano em Paris


Andy (Tom Everett Scott) viaja com dois amigos para Paris. Numa noite, sobem ao topo da Torre Eiffel para apreciar a vista da cidade. Até que encontram Serafine (Julie Delpy), uma jovem suicida que pretende pular do alto da torre. Andy a salva e ficam amigos. Ele descobre que Serafine herdou do pai um gene que a transforma em lobisomem.

Fracassou nas bilheterias, mas virou cult entre os jovens fazendo certo sucesso em VHS na época esse filme que presta uma homenagem a uma das mais populares fitas de terror com lobisomem, “Um lobisomem americano em Londres” (1981), de John Landis. A história assume outro tom, é um terrir (terror com humor, e um humor bem macabro), com cara de fita independente e conta com efeitos especiais interessantes num período em que a computação gráfica atingia outro nível no cinema mundial – mas devido aos efeitos estrondosos que vemos atualmente, os desse filme soam precários. É quase uma paródia em cima do filme original de 1981, com sequências que lembram o de John Landis, como os espíritos dos mortos que visitam o personagem, e aos poucos vão apodrecendo, e as do ataque do lobisomem a grandes multidões. O lobisomem agora é uma mulher (no anterior era um rapaz, interpretado por David Naughton), e o protagonista, depois, também se transforma na criatura. A violência nas cenas de morte é contida, até para evitar maior classificação indicativa. Tem um ritmo ágil e vira um passatempo legalzinho. Nem se vê a hora passar (tem apenas 98 minutos de duração).



Além da trama central aproveitada do filme de 1981, o diretor e roteirista Anthony Waller acrescentou situações que beiram o impossível, como a jovem suicida (papel da francesa Julie Delpy) que procura uma cura da licantropia e frequenta uma sociedade tomada por lobisomens e ainda descobre uma droga que faz as pessoas se transformarem em lobisomem sem a presença da lua cheia. O diretor, libanês, naturalizado britânico e que morou grande parte da vida na Alemanha, impressionou o mundo com uma das fitas mais perturbadoras dos anos de 1990, sua estreia na direção, “Testemunha muda” (1995), uma coprodução Alemanha e Rússia com muita violência, proibida para menores de 18 anos (vi quando adolescente, e na minha memória era uma fita impressionante e inovadora no tema de psicopatas, com uma personagem muda fugindo de um criminoso durante a gravação de um filme ‘snuff’) – foi exibido na Semana da Crítica de Cannes e depois no Festival de Toronto. Depois Waller teve a oportunidade de produzir, dirigir e roteirizar longas mais “industrializados”, para lançar nos EUA; seu segundo trabalho foi esse “Lobisomem”, em seguida veio a fita policial “O culpado” (2001, com Bill Pullman) e mais tarde o irregular suspense com ficção científica “Nove milhas para o inferno” (2009, com Adrian Paul e com o próprio diretor contracenando em papel maior, já que em todos os que dirigiu aparecia como figurante).
Para fazer “Um lobisomem americano em Paris”, Waller escalou um ator americano iniciante, Tom Everett Scott, de “The Wonders: O sonho não acabou” (1996), e que depois faria um monte de filmes teen, e a atriz francesa Julie Delpy, de “A igualdade é branca” (1994) e da trilogia que começou com “Antes do amanhecer” (1995) – a presença dos dois garantia repercussão, no entanto o filme não vingou nas salas e depois popularizou-se no extinto VHS.
Agora, para relembrar dele, a Classicline o lançou em DVD numa edição de colecionador muito bonita. Vem o filme, sem extras, com um card colecionável – e traz dublagem em português.

Um lobisomem americano em Paris (An american werewolf in Paris). Reino Unido/ Países Baixos/ Luxemburgo/ EUA/ França/Alemanha, 1997, 98 minutos. Comédia/Terror. Colorido. Dirigido por Anthony Waller. Distribuição: Classicline

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

Cine Especial


Em DVD, dois filmes distribuídos pela The Originals: "O anjo malvado" (1993, com Macaulay Culkin e Elijah Wood) e "The Square - A arte da discórdia" (2017, com Claes Bang e Elisabeth Moss).


O anjo malvado

Após a morte da mãe, o menino Mark (Elijah Wood) é levado para passar uma temporada na casa dos tios. Fica próximo do primo, Henry (Macaulay Culkin) e ambos se divertem à beça caçando, brincando e andando pelas montanhas. Com o transcorrer dos dias, Mark suspeita que Henry tem comportamento violento e ameaçador, o que pode colocar em risco sua vida. 

Originalmente da 20th Century Fox, “O anjo malvado” (1993) repercutiu muito na época do lançamento e depois passou inúmeras vezes na TV. Fala de um menino aparentemente tranquilo que acolhe o primo quando sua mãe morre. Mas com o passar dos dias, ele se demonstra sádico, com comentários ofensivos e violento, mas sempre é visto pela família como um garoto acima de qualquer suspeita. O roteiro é bem construído, com um suspense que cresce e atinge níveis de filme de terror, assinado pelo inglês Ian McEwan, escritor de quatro romances que foram bem adaptados para o cinema, “Uma estranha passagem em Veneza” (1990), “O inocente” (1993), “Amor obsessivo” (2004) e “Desejo e reparação” (2007). McEwan se inspirou no suspense “A semente maldita” (1956), também conhecido como “Tara maldita”, sobre uma garotinha boazinha que esconde um lado psicopata – o filme foi polêmico quando lançado nos anos de 1950 e teve quatro indicações ao Oscar, incluindo a atriz mirim Patty McCormack, então com 11 anos. O resultado dá certo não só devido ao roteiro de impacto, com momentos perturbadores e um desfecho memorável e triste, mas também pelas mãos do diretor Joseph Ruben, que realizou filmes de terror e suspense conhecidos do público, como “Morte nos sonhos” (1984), “O padrasto” (1987), “Dormindo com o inimigo” (1991) e “Os esquecidos” (2004). Outro ponto que mantém a credibilidade é a atuação dos dois atores mirins em início de carreira e que se tornaram astros: Macaulay Culkin e Elijah Wood (eles ficaram muito amigos durante a produção e mantém fortes laços até hoje).



Macaulay Culkin (que está sumido, é pai de uma menina e tem 42 anos) viu a carreira crescer três anos com “Esqueceram de mim” (1990), pelo qual foi indicado ao Globo de Ouro de ator, e depois faria outro sucesso do cinema, “Meu primeiro amor” (1991). Parou de atuar em 1994, com o filme “Riquinho”, e só voltou em 2003, com o polêmico drama “Party monster” (2003). De lá pra cá, fez uma ou outra participação em séries. Publicou um livro autobiográfico em 2006, depois fundou uma banda de rock com humor e atualmente trabalha com podcast. Teve problemas com drogas e álcool, foi preso por posse de maconha e viveu intensas brigas com o pai, que era uma espécie de agente/agenciador, considerado pelo próprio filho um explorador.
Já Elijah Wood também firmou carreira como ator mirim e nunca mais parou: completou 42 anos em janeiro, iniciou no cinema com oito anos e fez mais de 80 filmes, incluindo um dos maiores sucessos da História do cinema, a trilogia “O senhor dos anéis” (entre 2001 e 2003), no papel do principal, Frodo Baggins. Hoje é produtor de cinema, atua bastante em filmes alternativos, fundou uma gravadora de música e ainda é DJ. Em “O anjo malvado” podemos apreciar um trabalho de corpo e alma desses dois atores, quando estavam em formação e já tinham talento de sobra.
Aparecem no filme a irmã e o irmão de Macaulay, Quinn e Rory Culkin – somente Rory seguiu carreira no cinema. O filme teve problemas na produção, principalmente por causa do pai de Macaulay, Kit Culkin, que era ator e levava o filho pra cima e pra baixo interferindo nas cenas e exigindo muito dele e dos contratantes – para se ter uma ideia o diretor original seria Michael Lehmann, de “Atração mortal” (1988), porém houve uma briga entre Michael e Kit, que pediu a substituição imediata do diretor, o que acabou ocorrendo. Houve ameaças de parar as gravações, demorou para terminar as gravações, até que saiu – e isso tudo não interfere no produto final, pois o filme é bom, carregando cenas que nunca mais esqueceremos, como a do boneco arremessado de cima do viaduto que termina em acidentes de carro, a da pista de patinação no gelo e o atordoante final, no desfiladeiro. Revendo hoje, depois de 30 anos que assisti no cinema, continua instigante, e Macaulay permanece sinistro no papel do vilãozinho.
Completam o filme a trilha sonora de Elmer Bernstein, de “Sete homens e um destino” (1960), e a ótima montagem de George Bowers, que trabalhou em vários filmes do diretor, Joseph Ruben, como “Justiça corrupta” (1988), e outros filmes como “Atirando para matar” (1988) e “Do inferno” (2001). No elenco coadjuvante, participações de Wendy Crewson, David Morse e Jacqueline Brookes.
Recém-lançado em DVD pela The Originals, um site de venda de filmes que agora vem lançado DVDs e Blurays de filmes novos e antigos, como “Os monstrinhos” (1989), “The Square – A arte da discórdia” (2017) e “Em chamas” (2018).
O filme em DVD não tem extras, apenas uma luva e dois cards colecionáveis (tem áudio com dublagem em português da época).

O anjo malvado (The good son). EUA, 1993, 86 minutos. Suspense. Colorido. Dirigido por Joseph Ruben. Distribuição: The Originals



The Square – A arte da discórdia

Um curador de arte entra em colapso para lançar uma exposição contemporânea no museu de Estocolmo.

Ganhou, até de maneira inesperada, a Palma de Ouro em Cannes em 2017 esse filme de arte controverso que destila uma crítica feroz ao mundo das artes, ou melhor, do circuito de arte, tanto de quem produz quanto de quem consome (a crítica se faz especificamente às artes visuais contemporâneas, campo em que quase tudo é visto como arte). Em Cannes ganhou ainda um prêmio técnico, e o filme foi indicado ao Oscar e ao Globo de Ouro de filme estrangeiro, representante da Suécia.
Com “The Square” o diretor sueco Ruben Östlund alcançou prestígio fora de sua terra natal, onde havia dirigido pelo menos três fitas independentes – “Involuntário” (2008), “Play (2011) e “Força maior” (2014 – essa indicada ao Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro). Em “The Square” trabalhou com dois nomes do cinema americano, Elisabeth Moss, do filme de terror “Nós” (2019) e das séries “Top of the lake” (2013-2017) e “O conto da aia” (2017-), e Dominic West, do filme “300” (2006) e da série “A escuta” (2002-2008). E agora está vendo o auge da carreira: seu último trabalho, “Triângulo da tristeza” (2022), acaba de receber três indicações ao Oscar, e nas categorias, a de melhor diretor (as outras são melhor filme e roteiro original, escrito por ele também). É o segundo longa de Östlund a ganhar a Palma de Ouro (“The Square” foi o primeiro), e “Triângulo da tristeza” é o mais fora da curva e extremamente escatológico (que dividiu opinião e amores), previsto para estrear nos cinemas do Brasil no dia 02 de março. 
“The Square” está a milhas de ser uma obra de fácil acesso – tem todo um emaranhado de simbologias, é longo demais para grande parte do público (tem 150 minutos) e conta com um humor sofisticado e ácido. Ou seja, um filme particular, típico de festival, de um diretor que experimenta novas técnicas. Quem frequenta museus, galerias de arte e exposições vai rir de piadas como a do título, em referência a uma arte que é um quadrado (“square”) numa praça, que vai gerando situações à beira do ridículo e conflitos diversos, e em outro momento, a da explicação confusa do curador do museu de Estocolmo (Claes Bang - ator dinamarquês, de “Millennium: A Garota na Teia de Aranha”, de 2018), sobre os caminhos da arte para uma jornalista (Elisabeth Moss) durante uma entrevista, ou das várias cenas com os montinhos de terra como uma instalação que ninguém visita... Mas tem sequências mais esculachadas, quase nonsense, como a do homem com Síndrome de Tourette que xinga na plateia quando um artista (Dominic West) vai falar sobre suas obras ou da transa entre os personagens de Moss e Bang com preferências incomuns. Há subtramas que se alongam e permeiam outras histórias, como o sumiço da carteira, e ainda uma em especial que chega a ser angustiante, uma espécie de arte de intervenção com Oleg, um “homem macaco” (papel impressionante e bem rápido de Terry Notary) num jantar cheio de gente rica, que acaba em violência.



É uma sátira provocadora e perspicaz, inteligente, em cima da arte contemporânea e do que é considerado arte hoje. Eu, como professor de artes visuais, curti na primeira vez que assisti, na Mostra de Cinema de São Paulo em 2017, e ontem revi o filme em DVD, recém-lançado pela The Originals em parceria com a Pandora Filmes – a “The Originals” é um site de venda de filmes que agora está lançado DVDs e Blurays de longas novos e antigos, com seu selo próprio; já lançaram em DVD e BD “The Square” e “Em chamas” (2018), e em DVD títulos como “Onda de crime” (1985), “Os monstrinhos” (1989), “O anjo malvado” (1993), “Acertando as contas com papai” (1994) e “Kids” (1995).
O DVD não traz extras, apenas o filme (em ótima cópia) junto com uma luva de proteção.

The Square – A arte da discórdia (The Square). Suécia, 2017, 150 minutos. Comédia/Drama. Colorido. Dirigido por Ruben Östlund. Distribuição: The Originals

domingo, 5 de fevereiro de 2023

Resenha Especial


Oito mulheres e um segredo

A golpista Debbie Ocean (Sandra Bullock) planeja há anos o maior roubo da história, e para que tudo corra bem, reúne um grupo de mulheres para o crime. O alvo: U$ 150 milhões em diamantes que estarão expostos no famoso evento Met Gala.

Em Hollywood virou moda atualizar filmes antigos em versões com mulheres, como vimos recentemente em “Caça-fantasmas” (2016), “Do que os homens gostam” (2019 – que vinha de “Do que as mulheres gostam”) e esse “Onze mulheres e um segredo” (2018), adaptação da fita de ação “Onze homens e um segredo” (1960, com o Rat Pack, incluindo Frank Sinatra e Dean Martin), e que já havia um remake dele de mesmo título em 2001, com grande elenco, como George Clooney e Brad Pitt. Agora a trama de um roubo milionário é pelas mãos das mulheres, golpistas interessadas em capturar mais de U$ 150 milhões em diamantes. Para isso, o plano não pode falhar, pois os diamantes estarão no famoso Met Gala - o pano de fundo é o verdadeiro evento Met Gala, também chamado de Met Ball ou Costume Institute Gala, uma festa de gala anual que arrecada fundos para manutenção do Metropolitan Museum of Art em Nova York, e que existe desde 1948. A trama é ágil e bem bacana, e o time escalado é formidável: Sandra Bullock, Cate Blanchett, Anne Hathaway, Mindy Kaling, Awkwafina, Sarah Paulson, Rihanna, Dakota Fanning, Helena Bonham Carter e outras (sem falar em participações de atores veteranos, como Griffin Dunne e Elliot Gould). Essa homenagem ao clássico filme de roubo “Onze homens e um segredo” dá um novo vigor à história e com novos elementos que entrega um bom resultado. Custou U$ 70 milhões e rendeu boa bilheteria, com mais de U$ 297milhões pelo mundo.



Entretenimento descompromissado e de primeira, com cenas bem orquestradas de perseguição e ação, do diretor Gary Ross, dos dramas indicados ao Oscar “A vida em preto e branco” (1998) e “Seabiscuit: Alma de herói”, da primeira parte de “Jogos vorazes” (2012) e da fita de ação com traços biográficos “Um estado de liberdade” (2016) - vale destacar que Ross também atua como roteirista, escreveu uma dezena de roteiros, como “Quero ser grande” (1988), “Dave, presidente por um dia” (1993), e é dele o roteiro de “Oito mulheres e um segredo”, ao lado de Olivia Milch, a partir dos personagens criados por George Clayton Johnson para o filme original de 1960. Em DVD e bluray, além das plataformas de streaming.

Oito mulheres e um segredo (Ocean’s eight). EUA, 2018, 109 minutos. Ação. Colorido. Dirigido por Gary Ross. Distribuição: Warner Bros.