segunda-feira, 3 de maio de 2021

Cine Cult


Florbela

A poetisa portuguesa Florbela Espanca (Dalila Carmo) se vê presa em um casamento de puro tédio. Ela não enxerga mais o marido com os mesmos olhos de quando o conheceu. Um dia recebe uma carta do irmão, Apeles (Ivo Canelas), com quem tem muita afinidade, e resolve abandonar o lar para encontrá-lo na capital, Lisboa. Na cidade grande, Florbela aproxima-se de escritores importantes, cria um forte laço com o irmão, por quem desenvolve uma paixão, e produz suas poesias inspiradoras. Até que é forçada pelo marido a voltar para casa, no interior.

O cinema português é pouco apreciado no Brasil, talvez por não termos aqui uma distribuição das obras de forma efetiva. Lá na terrinha há cineastas de qualidade impressionante, sendo Manoel de Oliveira o maior representante, seguido de Miguel Gomes, João Cesar Monteiro, Teresa Villaverde e um que gosto especialmente, Miguel Gonçalves Mendes, com quem passei uma tarde quando estive em Lisboa no Festival de Cinema Itinerante da Língua Portuguesa, o Festin, em 2013. E nessa lista incluo Vicente Alves do Ó, o diretor e roteirista de “Florbela” (2012), um filme poético, de beleza e textura admiráveis, inspirado na vida da escritora e poetisa portuguesa Florbela Espanca (1894-1930).


Foi a produção mais vista nos cinemas de Portugal naquele ano, acredito que pelo fato de a poetisa exercer forte tradição na cultura popular do país. De narrativa lenta (próprio de um cult português), o longa se passa na década final de vida da escritora, 1920-1930, colocando a poetisa como uma mulher à frente de seu tempo. Entediada no casamento, cheia de inquietações, ela deixa o marido para seguir com o irmão (com quem é apegada) para Lisboa. Uma tragédia (que não vou contar, apesar de o fato ser notório na biografia da escritora) faz o mundo de Florbela ruir, então escrever se torna sua salvação, uma maneira de expurgar os sentimentos dolorosos e também de fugir da pressão da realidade.
Como disse, o roteiro não segue a biografia de cabo a rabo da personagem-título, muitos fatos da infância e meninice dela ficam nos diálogos e entrelinhas, como seu nascimento fruto de um casamento extraconjugal, e o abandono pelo pai, que não a reconheceu em vida.


É bom dizer que o filme é bem formal, de extremo rigor técnico, que beira o literário, e conta com locações bem cuidadas, dentro de uma fotografia iluminada – várias locações são da cidadezinha onde Florbela nasceu, Vila Viçosa, na região de Évora, além de externas em Lisboa.
Como muitos escritores por aí, Florbela só ficou conhecida em seu país depois de seu falecimento. No caso, foi uma morte prematura - ela era suicida, tentou a morte várias vezes, até que conseguiu aos 36 anos, por overdose de remédios. Sem sombra de dúvida permanece no topo das maiores escritoras de Portugal, ao lado de Mariana Alcoforado, Agustina Bessa-Luís e Maria Gabriela Llansol.
Ganhador de mais de 20 prêmios em festivais pelo mundo, o longa está disponível em DVD pela Imovison.

Florbela (Idem). Portugal, 2012, 114 minutos. Drama. Colorido. Dirigido por Vicente Alves do Ó. Distribuição: Imovision

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