quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Resenha Especial


Meu jantar com André

Wallace (Wallace Shawn) e André (André Gregory) são dois velhos amigos que se encontram para jantar em um sofisticado restaurante francês em Manhattan. Os anos caminharam e eles não se viram mais, e nesta noite especial deixam fluir uma conversa filosófica sobre as experiências acumuladas em diversos âmbitos: na família, nos relacionamentos amorosos, no teatro e nas andanças pela cidade grande.

Um grandioso filme conceitual de Louis Malle (1932-1995), um dos papas da Nouvelle Vague, em sua fase americana. Apaixonado por teatro, Malle reuniu o novato ator Wallace Shawn, que seguia os primeiros passos de roteirista, e o diretor teatral francês André Gregory, para escrever a quatro mãos relatos de suas experiências sobre a arte que tanto os inspirava e de mais 25 assuntos aleatórios. Dos encontros saiu um roteiro pessoal, inteligente e sincero de Gregory e Shawn, e a partir daí Malle levantou uma grana miúda para produzir o filme, destinando ao projeto pouquíssimos dias de gravação. O cineasta trouxe os próprios roteiristas como atores, com a condição de interpretarem eles mesmos, não como num documentário, mas em formato de cinema. O que vemos é uma joia da Sétima Arte norte-americana dos anos 80, uma aula magna sobre o diálogo e a vida.
Tudo começa com um ator desempregado (Shawn) que percebe um sentido em sua existência durante um jantar, em uma longa conversa filosófica com o diretor de teatro André Gregory. Sentados um de frente para o outro, os dois amigos que há anos não tinham contato dialogam por uma hora e meia sobre Grotowski, morte, arte, viagens, encontros, crenças, solidão, o ser humano e relacionamentos. Shawn é pontual nas breves colocações, ouve mais, enquanto Gregory expressa-se em comentários convictos, acalorados – o primeiro exerce função de pupilo, e o segundo, de veterano, de mestre. Para o efeito esperado, Malle abstraiu cenários, reduziu figurantes, deixou a câmera captar somente imagens da dupla na mesa para, da discussão, pautada por perspectivas de vida diferentes, eclodir um rico ensaio sobre as transformações na cidade de Nova York no campo político e, sobretudo, artístico, que também reflete na mudança de comportamento no mundo daquela década. Fascinante a ideia!
Sensorial e conceitual, o filme aborda as conexões, quando já se notava a falta de tato e aproximação das pessoas nas metrópoles e a ausência de conversas com profundidade (hoje mais gritante com as tecnologias).
Obra magistral do final de carreira de Louis Malle, “Meu jantar com André” sai em DVD este mês pela distribuidora Obras-primas do Cinema (há no disco dois extras imperdíveis: uma entrevista com os atores gravadas em 2011, e um episódio do programa Arena BBC, onde Wallace Shawn entrevista Louis Malle).

Meu jantar com André (My dinner with Andre). EUA, 1981, 111 min. Drama. Dirigido por Louis Malle. Distribuição: Obras-Primas do Cinema

Nenhum comentário: