Confira a resenha de três
filmes cultuados, de gêneros diferentes e produzidos em épocas distintas.
Disponíveis em DVD, bluray e no streaming.
Uma viúva (Katalin Berek)
envolve-se com um homem casado. Ela deseja ser mãe, porém atingiu os 40 anos. Caminhando
pela rua, entra numa instituição que abriga órfãos, e lá conhece uma jovem moça
abandonada pelos pais. Entre elas nasce um forte vínculo que testará os limites
das duas mulheres.
A distribuidora
Obras-primas do Cinema destaca em seus últimos lançamentos em DVD o cinema de Márta
Mészáros, cineasta socialista e feminista de origem judia, expoente do Novo
Cinema Húngaro, que reformulou as bases e as teorias da produção
cinematográfica do país no pós-guerra. Suas obras sociais e críticas tratam
justamente do trabalho das mulheres no país intercalando temas como maternidade
e solidão na meia-idade. ‘Adoção’ (1975), seu principal filme, trata desses
temas, com enfoque nos dois últimos. De forma delicada, com muitas cenas de troca
de olhares e longas sequências de silêncio, a diretora - e também roteirista
aqui - conta a história de uma mulher solitária e cheia de amarguras, viúva,
que deseja ser mãe agora com mais de 40 anos. Ela fica fixada em uma menina
prestes a atingir a maioridade, que vive em uma instituição de caridade, uma
espécie de orfanato para jovens. De início as duas mulheres de mundos tão
opostos têm crispações, mas aos poucos uma encontra conforto ao lado da outra.
No filme acompanhamos a crise de meia-idade da protagonista, feito pela grande
atriz húngara já falecida Katalin Berek, e os dilemas da jovem que cresce sem
lar, sem pais, sem futuro – outro bom papel, o da atriz Gyöngyvér Vigh.
Mészáros filma tudo numa
belíssima fotografia preto-e-branca, e com este trabalho ganhou o Urso de Ouro em
Berlim - foi a primeira mulher a receber o prêmio no festival.
É um filme belo e
trágico, que merece ser descoberto, ainda mais agora nessa grande cópia em DVD pela
Obras-primas do Cinema – recomendo assistirem também ao making of de quase uma
hora sobre a diretora, que vem como extra.
Adoção (Örökbefogadás). Hungria, 1975, 89 min.
Drama. Preto-e-branco. Direção: Márta Mészáros. Distribuição: Obras-primas do
Cinema.
A sétima profecia
O fim dos tempos está
próximo. A chegada de um misterioso andarilho (Jürgen Prochnow) em uma cidade
coincide com graves alterações climáticas ao redor do mundo - os mares se
agitam, o calor aumenta, as catástrofes da natureza levam milhares à morte. O
andarilho segue até a casa de Abby Quinn (Demi Moore) e seu marido (Michael
Biehn), que esperam um bebê. Um padre vindo do Vaticano (Peter Friedman)
investiga as estranhas ocorrências.
Lançado no finalzinho
dos anos 80, quando já se profetizava o fim do mundo com a chegada do próximo
milênio, esse filme de drama, suspense e terror foi um dos tantos nessa linha catastrofista.
Na história, fenômenos climáticos entram em choque e colocam a vida de milhões
em risco com a chegada de um andarilho misterioso numa cidadezinha. Um casal
que espera o nascimento do primeiro filho é procurado incessantemente por esse
homem, que tem uma revelação a fazer. Do outro lado, um padre, emissário do
Vaticano e ligado à ciência, desconfia desses fenômenos e inicia uma longa e
perigosa investigação que colocará a vida de todos em jogo.
O filme popularizou-se
em VHS, não é uma obra impressionante, mas serve como entretenimento nessa
linha de filmes sobre o Apocalipse, ou como queiram, o Juízo Final. Há uma
ambientação estranha, um clima de perturbação que nos deixa angustiados e
atentos para o desfecho. Qual o segredo que o andarilho guarda?
Quem dirige é Carl
Schultz, que trabalhou mais em séries de TV, e o roteiro é de Clifford e Ellen
Green, casados na época, de ‘SpaceCamp – Aventura no espaço’ (1986) e que
depois fariam um filme semelhante a esse, ‘A filha da luz’ (2000). Demi Moore
estava em início de carreira, logo se tornaria estrela, e Michael Biehn já se
projetava no cinema após ‘Aliens, o resgate’ (1986). O alemão Jürgen Prochnow,
de ‘O barco – Inferno no mar’ (1981), faz o papel do andarilho que não sabemos
ser anjo ou demônio.
Disponível em DVD,
recém-lançado num digipack especial pela Classicline, com cards.
A sétima profecia (The seventh sign). EUA, 1988, 97
minutos. Drama/Terror. Colorido. Dirigido por Carl Schultz. Distribuição:
Classicline
Verão de 85
No verão francês de 1985, prestes a completar 16 anos, Alexis (Félix
Lefebvre) é salvo de um acidente de barco na costa da Normandia. Quem o resgata
das águas é David (Benjamin Voisin), um rapaz de 18 anos que gosta de nadar e trabalha
com a mãe na loja da família. Alexis e David tornam-se grandes amigos, até que
se apaixonam.
Em parceria com a distribuidora California Filmes, a Versátil Home Video
lançou há pouco tempo, em bluray, esse simpático drama romântico gay de um dos
diretores mais aclamados da França atual, François Ozon, de ‘8 mulheres’ (2002),
‘Swimming pool - À beira da piscina’ (2003), ‘Dentro de casa’ (2012) e ‘Graças
a Deus’ (2018). O diretor realizou mais de 30 longas-metragens, grande parte
autoral e semiautobiográfico; muitos retratam o universo feminino e há alguns
polêmicos que tocam em tema tabu, como pedofilia. Além de diretor, Ozon é
roteirista, montador e produtor.
De forma crível, sem flertar com o melodrama barato, em ‘Verão de 85’ ele
apresenta o relacionamento de dois garotos na fase de amadurecimento, em que se
conhecem após um incidente de proporções quase trágicas. A amizade entre eles
aumenta, passam a dormir na casa um do outro, até que um inevitável
relacionamento amoroso acontece. Um deles tem fixação com a morte e é
pensativo, enquanto o outro quer curtir a vida e as baladas e nadar. Dois
jovens estranhos nos anos 80, de personalidades diferentes, no desabrochar da
vida e das curiosidades amorosas, que procuram se confortar quando estão
juntos. Suas famílias não sabem do romance secreto, mas desconfiam. Só que, de
maneira abrupta e chocante, o romance, que parecia engrenar, sofrerá uma
fatalidade do destino.
Ozon escreveu o delicado roteiro levemente inspirado no romance
infanto-juvenil ‘Dance on my grave’, uma obra literária do início dos anos 80 e
que faz parte de uma série, do britânico Aidan Chambers – o título inusitado aparecerá
em uma cena emocionante do filme. Ozon tem apuro com a técnica, trabalhou bem
com o diretor de fotografia belga Hichame Alaouie, de ‘Propriedade privada’
(2006), que usa paletas de cores variadas, de cores fortes e sensuais aos tons
pastéis. A trilha sonora é muito boa, com clássicos como ‘Cruel summer’, de
Bananarama, ‘In between days’, de The Cure, e ‘Sailing’, de Rod Stewart, que
dão sentido ao enredo e às experiências dos dois personagens.
Exibido nos Festivais de Cannes, San Sebastian e no César, o filme é
contado por meio de flashbacks pelo ator principal, o bom Félix Lefebvre, de ‘O
professor substituto’ (2018).
Um filme com uma história singela e verdadeira que merece ser
descoberto.
No bluray lançado pela Versátil, o filme vem em caixa com luva reforçada
e traz o filme com comentários em áudio do cineasta e uma hora de vídeos
extras, incluindo o curta-metragem ‘Um vestido de verão’ (‘Une robe d'été’, de 1996),
de François Ozon, exibido na Semana da Crítica em Cannes e que está na origem
de ‘Verão de 85’. Na caixa vem um livreto de 16 páginas, um pôster e dois
cards. O filme também está disponível no Telecine, e para aluguel no Prime
Video, Apple TV e Youtube Filmes.
Verão de 85 (Été 85). França, 2020, 101 minutos. Drama/Romance.
Colorido. Dirigido por François Ozon. Distribuição: Versátil Home Video
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