Duas resenhas especiais, de filmes lançados em DVD recentemente pela Obras-primas do Cinema.
Ao descobrir a traição da mulher, o engenheiro Ed (Jeff Goldblum), que
sofre de crises de insônia, dirige à noite pelas ruas em seu carro. Acaba dando
carona a uma modelo, Diana (Michelle Pfeiffer), que está em fuga. Ela é
perseguida por criminosos que mataram seu marido. Juntos, Ed e Diana seguem uma
longa jornada noite adentro para escapar dos bandidos.
Clássica aventura oitentista, engraçada e com ótimas cenas policiais,
com Jeff Goldblum um ano antes de ficar famoso em ‘A mosca’ (1986), e Michelle
Pfeiffer recém-lançada no cinema. É uma aventura tresloucada e infernal que
cruza uma noite inteira, de um engenheiro traído e insone e uma desconhecida
perseguida por perigosos bandidos. A dupla tem de escapar de balas, facas,
explosões.
Aos poucos a história dos dois é revelada – ele foi traído pela esposa e
vive cansado de tudo, e ela, uma ex-atriz, casada com um mafioso ligado a roubo
de joias, que acaba assassinado e, por consequência, vira alvo da vez. Na noite,
em fuga, eles cruzam com pessoas estranhas, como se fosse um sonho
interminável, e não contam com ajuda de ninguém.
O diretor John Landis, de ‘Um lobisomem americano em Londres’(1981),
recrutava, em seus filmes, nomes de destaque, em participações pequenas, e
costumava ele mesmo pintar como ponta – aqui interpreta um dos quatro bandidos
que perseguem a protagonista. Contei mais de 20 aparições rápidas, como os diretores
Paul Mazursky, Richard Franklin, Colin Higgins, Daniel Petrie, Jack Arnold,
Lawrence Kasdan, Jim Henson, Jonathan Lynn, Jonathan Demme, Roger Vadim, Amy
Heckerling, Don Siegel e David Cronenberg, além de coadjuvantes como David
Bowie (no papel de um homem misterioso), Irene Papas (como a matriarca do crime),
Clu Gulager (um agente da polícia), Vera Miles, Richard Farnsworth, Dan Aykroyd
e Bruce McGill. Espere tudo desse roteiro frenético de Ron Koslow, que escreveu
pouco, e antes havia roteirizado os dramas ‘Verão de ilusões’ (1976) e ‘Quando
se perde a ilusão’ (1984).
O papel central, de Jeff Goldblum, seria de Jack Nicholson e depois de
Gene Hackman, e o da garota, de Jamie Lee Curtis. No mesmo ano, Martin Scorsese
lançou uma fita de aventura e humor muito parecida, ‘Depois de horas’, sobre
uma noite maluca pelas ruas de Manhattan, quando um rapaz (Griffin Dunne)
resolve ir atrás de uma jovem atraente (Rosana Arquette) que conheceu num café
- porém tudo dá errado, e o personagem também passará por apuros, como
sequestro, perseguições etc.
Lançado em DVD pela Obras-primas do Cinema, apenas com um extra, muito
bacana por sinal, que é uma entrevista atual de 25 minutos com o diretor John
Landis.
Um romance muito perigoso (Into the night). EUA, 1985, 115 minutos. Comédia/Aventura. Colorido. Dirigido por John Landis. Distribuição: Obras-primas do Cinema
Vivendo no abandono
O diretor de cinema independente Nick Reve (Steve Buscemi) tenta, de
todas as formas, terminar um filme de baixo orçamento, em meio a um set de
filmagens maluco, com atores neuróticos e diversos problemas técnicos.
Premiado no Festival de Sundance e indicado ao Film Independent Spirit
Awards, o segundo longa-metragem de Tom DiCillo – que antes havia dirigido Brad
Pitt em ‘Johnny Suede’ (1991), é uma pérola do cinema alternativo/independente,
que custou parcos U$ 500 mil e rapidamente se tornaria cult nos EUA. Aqui no
Brasil passou despercebido na época – e confesso que fiquei sabendo da existência
dele há pouco tempo.
É um filme metalinguístico por natureza, mostra os bastidores da
gravação de uma fita pequena, de baixo orçamento. Quem assiste a making of de
filmes, vai entender o jogo aqui criado e rir das piadas internas. Produzir um
filme é difícil, e sem recursos financeiros, com atores complicados e uma
direção sem pulso firme, piora. As situações no filme envolvem erros de
marcação do elenco, atores que esquecem as falas, brigas entre eles, gente que
se apaixona no set, irritação do diretor e equipamentos, como câmera, que pifam.
DiCillo, que realmente vinha do cinema independente, trouxe um mundo que
conhecia bem com uma linguagem acessível e com humor para contar um dia numa
gravação desastrosa. Elencou nomes em início de carreira que depois
despontariam, como Steve Buscemi, no papel do diretor (um ano depois faria o
excepcional ‘Fargo’), Dermot Mulroney, de ‘O casamento do meu melhor amigo’
(1997), como o diretor de fotografia com um tapa-olho, Catherine Keener, a
atriz principal da produção – seria depois indicada a dois Oscars de
coadjuvante, por ‘Quero ser John Malkovich’ (1999) e ‘Capote’ (2005), e Peter
Dinklage, da série ‘Game of thrones’, como um mágico. DiCillo continua até hoje
no cinema independente, realizou, por exemplo, ‘A chave da liberdade’ (1996,
com John Turturro, Sam Rockwell e novamente Catherine Keener), ‘Uma loira de
verdade’ (1997, com Daryl Hannah e Matthew Modine) e ‘Delírios’ (2006, com
Steve Buscemi e Michael Pitt).
‘Vivendo no abandono’ saiu em DVD recentemente pela Obras-primas do
Cinema, numa boa edição, com uma hora de extras, incluindo cena deletada,
making of e entrevista do diretor e com Steve Buscemi.
Vivendo no Abandono (Living in oblivion).
EUA, 1995, 89 minutos. Comédia/Drama. Colorido/Preto-e-branco. Dirigido por Tom
DiCillo. Distribuição: Obras-primas do Cinema
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