Últimos dias no deserto
Jesus (Ewan McGregor) vaga pelo deserto, peregrinando rumo a
Jerusalém. Encontra pelo caminho um garoto (Tye Sheridan) cuja mãe está doente,
e que possui um relacionamento complicado com o pai (Ciarán Hinds). Jesus então
acompanha essa família ao mesmo tempo que lida com a tentação do Diabo, que
aparece a ele de diversas formas.
Livre
reconstituição dos últimos dias da vida de Jesus, quando vagou em jejum pelo
deserto antes de sua missão final ao retornar a Jerusalém. Filosófico, com
narrativa lenta (por isso uma fita cult), é um drama sério para público adulto,
com um ponto de vista de um Jesus diferente de tudo que já vimos no cinema. Em
um tour-de-force incrível, o ator escocês ganhador do Globo de Ouro Ewan
McGregor, de “Trainspotting: Sem limites” (1996) e “Moulin Rouge: Amor em
vermelho” (2001), encarna um Jesus solitário, indeciso, no calor infernal do deserto.
Naquele território hostil, aproxima-se de uma família cheia de problemas, os
únicos viventes que vê por ali – o pai, um marceneiro (Ciarán
Hinds, que eu adoro), o filho adolescente em crise (maltratado pelo pai
e que quer ir embora da região), e a mãe do rapaz, doente, no leito de morte.
Jesus opta em ajudá-los nos afazeres diários, enquanto o diabo aparece a ele
inúmeras vezes – como na forma de uma velha pedinte e também como reflexo de
sua própria imagem, quando dialoga com seu lado mais sombrio. Não é uma obra
brilhante ou derradeira sobre Cristo, mas tem sua importância pela realização
diferenciada, além de ter seus apreciadores, como eu. Uma proeza do diretor
Rodrigo García, colombiano, que também escreveu o roteiro adaptando passagens bíblicas
com momentos ficcionais; ele é filho do maior escritor do seu país, Gabriel
García Márquez, e estreou no cinema com um drama que chamou a atenção da
crítica na época, “Coisas que você pode dizer só de olhar para ela” (2000); instalado
nos Estados Unidos, realizou filmes dramáticos fora das convenções
hollywoodianas, como “Destinos ligados” (2009), até atingir o melhor momento da
carreira com o excepcional “Albert Nobbs” (2011). “Últimos dias no deserto”
(2015) se insere com notoriedade na filmografia do bom cineasta, um criador de
histórias que merece ser descoberto!
Rodado
no deserto de Anza-Borrego, em Borrego Springs, na Califórnia (que remete ao
deserto real da Judeia), o filme tem uma fotografia deslumbrante, assinada pelo
mexicano Emmanuel Lubezki, três vezes ganhador do Oscar (venceu três anos
seguidos, por “Gravidade”, “Birdman” e “O regresso”).
Exibido
em sessão especial no Festival de Sundance, dividiu a opinião do público, e é
indicado para quem gosta de filmes com tema religioso – segue a linha do novo “Maria
Madalena” (2018), a versão de Garth Davis que causou polêmica; em ambos há uma
desconstrução dos personagens centrais, que podem gerar burburinho.
Últimos dias no deserto (Last days in the desert). EUA, 2015,
98 minutos. Drama. Colorido. Dirigido por Rodrigo García. Distribuição: Mares
Filmes. Disponível em DVD e no Netflix
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