Capitão Fantástico
Em
uma floresta no noroeste do Pacífico, nos Estados Unidos, vive Ben (Viggo
Mortensen), um homem fora dos padrões, que lá cria os filhos, no meio da
natureza, longe de qualquer contato com a sociedade, onde prega suas regras,
ritos e ensinamentos específicos. Quando a esposa morre, após ficar
hospitalizada na cidade grande, Ben leva os filhos para se despedir da mãe, no
funeral. Fora da floresta, aquela família será obrigada a enfrentar o
verdadeiro mundo real.
Viggo
Mortensen recebeu merecidamente sua segunda indicação ao Oscar de melhor ator
neste grandioso e criativo filme independente, uma das melhores produções
americanas de 2016. Ele faz um pai libertário, que abandonou a cidade para
viver de forma primitiva na floresta, onde cria seus seis filhos, de idades bem
distintas. Isolados do contato humano exceto da própria família, eles possuem
nomes diferentes, uma mistura de apropriação indígena com mitologia nórdica
(Bodevan, Kielyr, Vespyr, Zaja, por exemplo) e praticam rituais de passagem
para a vida adulta, como comer o fígado de animais que caçam no mato. O pai
ensina os filhos na defesa pessoal, treinamentos para escalar montanhas,
proteção uns aos outros, todos são expert em caça, plantio e cultivo, com mínimos
traços de consumo (como um rádio na cabana onde vivem e livros técnicos).
Fechados como um clã, são críticos ferrenhos ao American Way of Life e ao
capitalismo. Ele adultiza os filhos, fala abertamente sobre sexo, política,
teorias de Física, e no seio do ambiente familiar, as três crianças e os três
jovens aprendem e reproduzem, ou seja, o pai desperta neles o senso crítico, de
autovigia e autoavaliação para argumentar e refletir qualquer assunto que
esteja presente no cotidiano da floresta.
Esta
é uma das óticas do filme. Em momento paralelo conhecemos, em diálogos e breves
lembranças, a esposa de Ben, a mãe dos seis filhos, budista, que está doente no hospital, sob cuidados da família dela. Quando morre, a mulher deixa um
testamento informando que gostaria de ser cremada, mas a família cristã quer
enterrá-la, contrariando a vontade também do marido, isolado na floresta. Em
razão de antigos atritos, o pai dela (papel austero de Frank Langella) dá o
aviso ao genro: não apareça no funeral. Os filhos se revoltam com a morte e
querem dar adeus à mãe, e o pai mesmo assim os leva para a cidade. A partir daí o filme sai do enfoque das apresentações
da excêntrica família, cria as situações-problema e vira um road movie dramático discretamente cômico, discutindo questões pertinentes a
choque cultural, com os filhos conhecendo o mundo exterior da redoma onde
viviam, em contato com a vida em sociedade, numa jornada de descobertas e
despertares. Para representar o retorno ao útero materno, viajam em um ônibus paramentado com livros, cozinha e dormitórios,
apelidado de Steve, no caminho cometem pequenas contravenções, como despistar a
polícia e furtar um supermercado, práticas inconcebíveis na cidade,
relacionando a forma como o pai cria os filhos a partir de suas verdades e
crenças, o que fará questionar seus métodos.
Com
coesão e sensibilidade, “Capitão Fantástico” é uma aula de vida, expõe o tema
da maturidade, das descobertas e das decisões para o futuro através do laço
familiar, com a mensagem: como criamos nossos filhos e que tipo de pais somos
ou queremos ser?
Prepare-se
para um desfecho inusitado e não usual, aliás, todo o filme é ricamente criativo. Incrível como há bons cineastas no cinema independente, este aqui
chama-se Matt Ross, em seu primeiro longa na direção, mais lembrado como ator,
de filmes como “A outra face” (1997) e “Psicopata americano” (2000).
O
elenco trabalha certinho, em sincronia, com bons atores revelação,
especialmente as crianças. Viggo, um caso particular como sempre. Para o papel
do pai, mudou-se para Idaho, no centro das Montanhas Rochosas, para aprender técnicas
de sobrevivência no mato. Pelo trabalho foi indicado também ao Globo de Ouro e
ao Bafta, enquanto o filme ganhou prêmio de direção no “Un certain regard”, em
Cannes, e foi exibido em Sundance.
Em
DVD pela Universal, sai em boa edição com apenas um extra curto, mas importante
- um rápido documentário sobre os bastidores, com entrevistas e cenas das
gravações.
Capitão Fantástico (Captain Fantastic). EUA, 2016, 118
min. Drama. Dirigido por Matt Ross. Distribuição: Universal Pictures
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