Monstros
Em
um circo de horrores de quinta categoria, a bonita trapezista Cleopatra (Olga
Baclanova) rejeita o amor do anão Hans (Harry Earles), que é o gerente do empreendimento.
Quando descobre que ele herdará uma grande fortuna, elabora, com o amante, um
plano maquiavélico: casar-se com o pequenino para depois matá-lo e assim ficar
com todo o dinheiro. Mas as “criaturas” que habitam o circo passarão a
desconfiar da mudança de atitude de Cleopatra.
Até
que enfim chega ao Brasil uma das obras mais polêmicas da História do Cinema, cult
classic dramático com convite ao horror que abalou a sociedade na época, foi rejeitado
por décadas e censurado em vários países. O motivo do rumor: a utilização de
pessoas, no elenco, com deficiências físicas e intelectuais, apresentadas como
criaturas repugnantes, num desfile chocante de aberrações. Xifópagos, anões,
mulher barbada, portadores da Síndrome da Talidomida, em suma, os freaks, atrações
comuns do mundo do circo de horrores, interpretam eles mesmos, desnudados, aguçando
e atraindo o olhar do telespectador às suas reais deficiências. Diante do
burburinho, o roteiro meio policial, com trama de assassinato, cai para segundo
plano. Não se permite margem para enxergarmos o filme além da fronteira do
estranho, da condição humana adversa, pois o projeto nasceu com esse duro e
tenebroso propósito e assim foi vendido, como fita de terror.
Nessa
versão definitiva e restaurada há, como extra, um prólogo de três minutos, uma
mensagem especial sobre a triste história das “criaturas”, dos deformados,
forçados a viver à margem, ridicularizados pela sociedade, e que criaram um
código entre eles, bem discutido no filme: “a alegria de um é a de todos, e o
sofrimento de um é o de todos”.
Emblemático
na galeria dos filmes bizarros do cinema, “Monstros” causa inquietação e
consternação, perturba, questiona o preconceito atroz e a pobreza do
comportamento do ser humano frente aos marginalizados e nos deixa estarrecidos pela
forma como os deficientes eram tratados no início do século passado (o filme é
de 1932). É um dos trabalhos mais estranhos feitos em estúdio nos EUA, produzido
com dificuldade pela MGM, numa onda de filmes de horror de entretenimento que a
Universal estrearia com “Drácula” e “Frankenstein”. Aliás, o diretor, Tod
Browning (1880-1962), havia rodado no ano anterior o notório “Drácula” e por
ter trabalhado em circo soube como encarar um diálogo direto, cruel, sobre os
bastidores desse ambiente único.
Em
DVD pela Obras-primas do Cinema, “Monstros” é um filme seríssimo, melancólico,
controverso e pungente, pioneiro do ponto de vista do processo criativo,
indicado aos cinéfilos de primeira ordem.
Monstros (Freaks). EUA, 1932, 64 min. Drama/Horror.
Dirigido por Tod Browning. Distribuição: Obras-primas do Cinema
* Publicado na coluna 'Middia Cinema', da revista Middia Magazine, edição de abril/maio de 2017
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