segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Cine Lançamento


Maria Madalena

Numa comunidade pesqueira, a devotada Maria Madalena (Rooney Mara), contra a vontade dos pais, foge de casa para se juntar a Jesus Cristo (Joaquin Phoenix) e seus apóstolos, que percorrem a região para transmitir ao povo mensagens positivas de amor ao próximo. Ela vai ajudá-los nas pregações, com destino a Jerusalém, numa jornada espiritual que a transformará, assim como irá mudar o rumo daquele grupo de homens de fé.

Uma excelente versão revisionista de uma personagem bíblica controversa, Maria Madalena, que nesta atualização ganha novos entendimentos, por isto uma produção polêmica e que dividiu a opinião do público, principalmente os religiosos.
O promissor cineasta australiano indicado ao Emmy e ao Bafta Garth Davis, que havia feito um belo trabalho em “Lion: Uma jornada para casa” (2016), optou por uma fita de arte de base cristã, porém com amplitudes feministas, de uma outra Maria Madalena, contemporânea, não mais aquela mulher apontada como prostituta, o que produz um efeito catártico aos que estão diante da tela da TV, abrindo reflexões sobre o papel da mulher atual.
Garth Davis contou com a ajuda de duas roteiristas para recriar a difícil versão, Helen Edmundson (de telefilmes britânicos) e Philippa Goslett (que tinha escrito o bom, mas pouco assistido “Poucos cinzas”, de 2008, sobre o pintor Salvador Dalí), e escalou para o papel principal Rooney Mara, numa interpretação impecável, uma das melhores da carreira. Assim acompanhamos de perto a vida de uma jovem humilde, devota e inteligente, isolada numa comunidade de pescadores, na região de Magdala, na antiga Galiléia (por isto Maria Madalena, ou Maria de Magdala). Ela quer sair de lá, briga com a família inteira por não aceitar imposições de um casamento, inclusive pais e irmãos acreditam que ela está possuída por demônios (tem até uma cena discreta de exorcismo, feito nas águas do rio). Contra todos, vai embora de casa e se junta a Cristo e aos apóstolos, que visitavam os arredores. O grupo criava ali um movimento social considerado radical, mal visto pela comunidade – e Maria também passa a ser desprezada, já que as mulheres não se juntavam aos homens nessas andanças. Ela parte para pregar a palavra de Cristo e aprender com ele o resgate dos pobres e oprimidos, cruzando terras infecundas, onde habitam pessoas com lepra e outras doenças.
Corajosa e à frente de seu tempo, Maria rompeu com as tradições familiares e quebrou as rígidas hierarquias da época, tornando-se uma figura messiânica e destacável seguidora de Jesus até a crucificação dele. Para se ter uma ideia da relevância de Maria Madalena, em 2016 o Vaticano a reconheceu como uma mulher fundamental na história de Jesus, que acompanhou de fato os apóstolos em suas peregrinações (no filme ela dividia as caminhadas com o apóstolo Pedro, papel de Chiwetel Ejiofor), e atualmente é reverenciada em diversas culturas e religiões.
Rooney Mara, duas vezes indicada ao Oscar (por “Carol” e “Millennium: Os homens que não amavam as mulheres”), cria a personagem com extrema distinção e brandura, com olhar penetrante e poucas palavras, e o filme narra sempre o seu ponto de vista no grupo dos apóstolos. Joaquin Phoenix faz Jesus, num papel-espelho de Maria, a ponte que liga a razão e a emoção entre a aprendiz e o mestre, numa interpretação incrível de um homem adorado, mas preocupado com o seu destino. Uma curiosidade: Phoenix e Rooney já haviam trabalho duas vezes juntos, em “Ela” (2013) e “Don't worry, he won't get far on foot” (2018, ainda inédito e sem tradução no Brasil).
Outro bom ator que aparece é o francês Tahar Rahim, de filmes como “O profeta” (2009) e “O passado” (2013), no papel de Judas, além de Chiwetel Ejiofor.
Dou destaque ainda para a emocionante trilha sonora, último trabalho do compositor islandês indicado ao Oscar Jóhann Jóhannsson, falecido prematuramente aos 48 anos em fevereiro deste ano, que realizou uma parceria com Hildur Guðnadóttir. O figuro é bonito, de Jacqueline Durran, seis vezes indicada ao Oscar e ganhadora por “Anna Karenina” (2012), e a fotografia, digna de suspiros (de Greig Fraser, indicado ao Oscar por “Lion” e de obras como “A hora mais escura”), rodada em lindas regiões da Itália, como Sicília e Apúlia.
Coproduzido entre Estados Unidos, Reino Unido e Austrália, “Maria Madalena” é uma das grandes surpresas do ano, filme lindíssimo e com uma discussão necessária para abrir a nossa mente! Fresquinho em DVD pela Universal!

Maria Madalena (Mary Magdalene). EUA/Reino Unido/Austrália, 2018, 120 min. Drama. Colorido. Dirigido por Garth Davis. Distribuição: Universal Pictures

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