sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

Resenha Especial


Afterimage

O artista plástico polonês Władysław Strzemiński é censurado pela ditadura soviética nos anos 40. Sem um braço e sem uma perna, ele tenta seguir com sua arte de vanguarda enfrentando o sistema autoritário de seu país.

Último trabalho do premiado cineasta polonês Andrzej Wajda (1926-2016), que morreu um mês depois da premiére do filme, no Festival de Toronto. Ao lado de Roman Polanski, Krzysztof Kieślowski, Wojciech Has e Agnieszka Holland, Wajda foi um dos grandes nomes do cinema da Polônia e atuou frente às mudanças culturais de seu país nos anos 50 – ele integrou o movimento do Novo Cinema Polonês, realizando obras-primas como a ‘Trilogia da Guerra’, que criticava o domínio nazista na Polônia (com os filmes "Geração", de 1954; "Kanal", de 1957; e "Cinzas e Diamantes", de 1958), as fitas de arte políticas e críticas ao sistema comunista “O homem de mármore” (1977) e “O homem de ferro” (1981), o biográfico “Danton: O processo da revolução” (1983), os indicados ao Oscar de filme estrangeiro “Terra prometida” (1975) e “Katyn” (2007) e muitos outros. Wajda acumulou na carreira os principais prêmios do cinema mundial, como Bafta, Palma de Ouro em Cannes, César e prêmios em Berlim e Veneza, e em 2000 ganhou um Oscar honorário pela contribuição à Sétima Arte.


Em “Afterimage” (2016) ele narra parte da biografia do artista plástico polonês Władysław Strzemiński (1893-1952), com foco nos últimos dez anos de sua vida, quando enfrentou a ditadura stalinista que assolou a Polônia, jogando o país numa profunda crise (em uma cena emblemática, o pintor rasga a bandeira de Stalin – vale lembrar que Wajda foi um crítico ao sistema comunista da Polônia e participou de movimentos em defesa do fim do regime soviético no país). Strzemiński revolucionou o campo das artes nos anos 20 e 30, foi professor da Escola de Artes de Łódź e ganhou notoriedade, mesmo com problemas sérios de saúde (ele não tinha uma perna e um braço e usava muletas para andar). Seu ateliê juntava alunos do mundo inteiro para conhecer sua arte neoplástica controversa, que rompia com os padrões estéticos da época. Foi duramente perseguido, proibido de pintar (em dado momento, não conseguia nem mais comprar tintas, pois os vendedores se recusavam a vender para ele). Presenciou a famosa Sala Neoplástica de Łódź ser desmanchada, mas não abaixou a cabeça: dentro de casa, escondido, continuava a pintar. Ele foi um homem à frente de seu tempo, que deixou profundas marcas na arte contemporânea polonesa (e pouco lembrado pelas pessoas hoje).


Com uma fotografia precisa da Polônia stalinista e um bom trabalho do ator principal, o veterano Boguslaw Linda, o drama nos apresenta um artista praticamente desconhecido no Brasil, e ao conhecer sua trajetória, vemos como ela foi difícil, marcada por perseguições, ruínas e abandono. Wajda aproveita para lançar uma crítica ao autoritarismo, e em seus comentários percebemos como a arte incomoda e ao mesmo tempo como ela é fundamental para a sociedade, ainda mais em tempos de caos social. E viva Wajda, que fez uma belíssima obra e viveu até os últimos minutos respirando cinema! PS: ‘Afterimage’ é uma ilusão de ótica, uma imagem que persiste na retina após o estímulo visual – e é uma simbologia à arte única de Strzemiński, que fica em nossa memória para sempre.

Afterimage (Powidoki). Polônia, 2016, 99 minutos. Drama. Colorido/Preto-e-branco. Dirigido por Andrzej Wajda. Distribuição: Imovision

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