O estranho que nós
amamos
Estado
americano de Virginia, 1864, final da Guerra Civil. Em um colégio interno
feminino, cinco mulheres abrigam um soldado ferido, da União, chamado McBurney
(Colin Farrell). Quem dirige a instituição é Miss Martha (Nicole Kidman), senhora
rígida, com seus inabaláveis princípios religiosos. Afastadas de qualquer
contato humano, Martha e as garotas se verão, pouco a pouco, seduzidas pelo
soldado em reabilitação.
Indicado
à Palma de Ouro, este coerente drama que flerta com o suspense psicológico ganhou
o prêmio de melhor direção no Festival de Cannes em 2017, inserindo finalmente
Sofia Coppola no rol das cineastas de peso do cinema americano contemporâneo.
Justiça seja feita! É um destacável trabalho da diretora, que reforça a
genética artística do pai, o lendário Francis Ford Coppola. Ela também o produziu,
com ajuda do irmão, Roman, adaptando o roteiro original de Albert Maltz e Irene
Kamp (que havia sido filmado em 1971, com Clint Eastwood e Geraldine Page, com
outro resultado, tão bom quanto), com breves modificações no romance histórico
de Thomas Cullinan. E aproveitou duas atrizes de seus filmes anteriores, Elle
Fanning (com quem trabalhou em “Um lugar qualquer) e Kirsten Dunst (de “As
virgens suicidas” e “Maria Antonieta”), somando ao bom elenco feminino Nicole
Kidman e a novata Oona Laurence, além de Colin Farrell, único papel masculino,
um soldado acamado, doente.
Nos
passos de Francis, Sofia soube ser mestre no uso dos elementos cinematográficos
não-humanos - ao arriscar um remake tinha a grande chance de errar, mas não foi
o que se sucedeu (para quem conhece “O estranho que nós amamos” de 1971 vai
perceber a diferença das ricas composições da nova versão). Ela manteve a
penumbra do original, com troca do ponto de vista, do masculino para o feminino,
agora. Tornou o clima obscuro, reforçado pela fotografia inebriante de Philippe
Le Sourd (indicado ao Oscar por “O grande mestre”, em 2013), com muita névoa e
madeira, e deu maior abertura ao confinamento – os personagens ficam trancados
em um casarão no meio do nada, em uma região pantanosa, e nós, como público,
somos cercados a todo o momento por sons repetidos de grilos, corujas e rãs.
Dentro
de um ambiente impenetrável, a relação entre as cinco mulheres reprimidas por
lei se altera com a aparição de um estranho, o soldado baleado, homem narcisista
que desperta sentimentos fervorosos em todas elas, até na durona Miss Martha. Envolto
por forte tensão sexual, o filme metaforicamente discute a quebra de tabus
pelas mulheres em uma época de regras sociais rígidas, levanta pontos sobre o
papel da religião na sociedade americana no século XIX e traça as amargas consequências
da Guerra de Secessão. E tem um desfecho desconcertante!
Rodado
na região de fazendas do estado de Louisiana, mesma locação do primeiro, o
filme é um objeto de arte inesquecível pelo seu perfeito conjunto em sincronia:
direção, roteiro, fotografia, figurino, direção de arte etc. Não deixe de
conferir! Já em DVD.
O estranho que nós
amamos (The
beguiled). EUA, 2017, 93 min. Drama. Colorido. Dirigido por Sofia Coppola.
Distribuição: Universal
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