domingo, 27 de outubro de 2024

Especial de cinema


Os melhores filmes da Mostra de SP – Parte 10

 

A 48ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo segue na capital paulista até a próxima quarta-feira, dia 30/10. Nesse ano, serão exibidos 419 títulos de 82 países, distribuídos em mais de 20 salas de cinema de São Paulo. A programação completa da Mostra está no site oficial, em https://48.mostra.org. Confira abaixo drops de mais filmes da Mostra que assisti e recomendo.

 



 

Through the graves the wind is blowing

 

Documentário certeiro que analisa o crescimento dos grupos de extermínio aliados ao neonazismo na Croácia atual. Quem narra e conduz o filme de forma corajosa, mostrando rosto e nome, é o investigador de polícia Ivan Perić, que busca pistas de crimes chocantes ainda não resolvidos. Ele é uma voz solitária, desprezado pelos colegas e pela corporação, e por bater de frente contra o sistema, é alvo de ameaças nas redes sociais. Enquanto o detetive percorre as ruas, vai mostrando as suásticas pichadas pelos muros e postes na cidade turística de Split, uma das maiores da Croácia, região balcã da antiga Iugoslávia. Um filme que discute a ascensão do fascismo contemporâneo não só lá, mas em várias partes do mundo. Em preto-e-branco – a única cor que aparece em uma ou outra cena é um vermelho escorrido nas paredes, simbolizando o sangue e a violência dos discursos neofascistas que tomaram conta da sociedade croata. Um dos melhores docs da Mostra desse ano, foi exibido na seção ‘Encontros’ do Festival de Berlim. Sessões na Mostra no dia 28/10, porém pode ser assistido até o dia 30/10 na plataforma Sesc Digital, com limite de 600 visualizações.

 



 

Memórias de um caracol

 

Uma animação para adultos das melhores já feitas, triste e emocionante, que deve entrar na lista dos indicados na categoria ao Oscar de 2025. Do mesmo diretor de ‘Mary e Max – Uma amizade diferente’ (2009), o australiano Adam Elliot. Seu novo filme remete aos personagens desiludidos de ‘Mary e Max’; agora conhecemos uma garota solitária que sofre bullying devido ao lábio leporino. Coleciona caracóis de decoração e ama livros. Ela conta sobre sua vida, marcada por perdas, a caracóis reais que andam pela sua horta – quando criança viu a mãe morrer, em seguida o pai doente também falece, e depois é separada do único irmão, gêmeo, levados para lares adotivos diferentes. Tomada por ansiedade e tristeza, não consegue contato com ninguém, até uma velhinha bem humorada surgir em sua vida; já o irmão está a milhares de quilômetros, do outro lado da Austrália, criado em uma família maníaca, extremamente devotos de uma religião que inventaram. Os dois, por meio de cartas, tentam se reencontrar. Com boas doses de humor, a animação é um autêntico e sofrido drama sobre tragédias familiares, esperança e reencontros, produzido em um incrível stop-motion. Saí emocionadíssimo da sessão, desse que é um dos grandes títulos da Mostra de 2024. O filme venceu o prêmio de melhor animação no festival mais importante da categoria, o Annecy. Sessão na Mostra de SP ainda no dia 27/10.

 



 

Dying – A última sinfonia

 

Um dos filmes que mais me marcaram na edição desse ano da Mostra, um drama familiar rodado na Alemanha, com humor negro intenso, que explora a falta de comunicação de uma família em deterioração. Eles são os Lunies. O patriarca sofre de Parkinson em estágio avançado, prestes a ir a uma casa de repouso; a matriarca não revela a ninguém que está com um câncer agressivo; o filho é um maestro em ascensão que reside em outra cidade e se comunica com os pais por telefone, e está em um processo delicado de trabalho e com uma crise em casa envolvendo a ex-namorada grávida de outro; e a filha alcoólatra, irmã distante do maestro, que trabalha como assistente de dentista e vive de porre pelos bares. A morte está chegando na casa dos Lunies, e aquela família marca um reencontro que será decisivo. O filme, de 3h de duração, é dividido por capítulos que apresentam cada um dos personagens, e a montagem caprichada liga com exatidão uma passagem a outra. Não é uma fita fácil, é um drama pesado, às vezes descontruído pelo humor cáustico e cruel, em que damos risos nervosos e ficamos com algo entalado na garganta. Todos do elenco, sem exceção, entregam atuações magistrais, com destaque para Lars Eidinger, Corinna Harfouch e Lilith Stangenberg, respectivamente nos papéis do filho, mãe e filha. No meio haverá subtramas explosivas, como a crise do nascimento do bebê da ex-namorada do maestro, o novo relacionamento da filha alcoólatra e a relação do maestro com o compositor suicida. Um filmaço que surpreende e nos chacoalha, vencedor do prêmio de melhor roteiro no Festival de Berlim. Sessões na Mostra de SP nos dias 27, 29 e 30/10 – o filme estreia nos cinemas brasileiros em 05/12, distribuído pela Imovision.

 



 

Não nos moverão

 

Está na Competição Novos Diretores esse drama mexicano todo feito em um bonito preto-e-branco, sobre uma advogada disposta a tudo para se vingar da morte do irmão, ocorrido 50 anos antes, durante o massacre de Tlatelolco, em que centenas de estudantes foram mortos em protestos contra os Jogos Olímpicos no país. Ela descobre informações sobre os militares por trás do crime e segue para fazer justiça com as próprias mãos, contratando um rapaz para auxiliá-la na difícil empreitada. Exibido e premiado nos Festivais de Guadalajara e Toulouse, é um filme de cunho político até no título, um grito de vingança e esperança contra os algozes dos nossos tempos. São obras como essa que engrandecem ainda mais a Mostra de Cinema de São Paulo. Sessões encerradas na Mostra, porém o filme pode ser assistido até o dia 30/10 gratuitamente na plataforma Sesc Digital, com limite de 600 visualizações.

 



 

Dias (2019)

 

Exibido na 44ª edição da Mostra, em 2020, o drama ‘Dias’ (2019), de Tsai Ming-liang, retorna esse ano ao festival na seção ‘Apresentação especial’, apenas online, disponível nas plataformas Spcine Play e Sesc Digital, gratuitamente, com limite de 1500 visualizações. Quem não assistiu, vale ver esse bom trabalho do cineasta malásio, um exercício de linguagem e narrativa que acompanha os dias de um homem solitário em seu apartamento em Bangcoc, na Tailândia. Acometido por uma estranha dor que se espalha pelo corpo, procura atendimento de massagens para aliviar a tensão. Vemos o aquele homem preparando diariamente os pratos típicos da aldeia onde cresceu. Também o vemos se encontrar com um jovem solitário igual ele, e ambos iniciam um relacionamento. Há apenas um diálogo no filme, bem curto, na cena da massagem, e toda a obra é de um silêncio sepulcral. É o ponto de vista de um personagem solitário na cidade grande, ouvindo o barulho da chuva, fazendo seu almoço, tomando banho e saindo pelas ruas movimentadas. E flagramos tudo isso com ele. Filme de arte para público bem específico, protagonizado por Kang-sheng Lee, rosto memorável do cinema de Taiwan, que já trabalhou outras vezes com o diretor Ming-liang, como em ‘Que horas são aí’ (2001) e ‘O sabor da melancia’ (2005). Coprodução Taiwan/França, escrita, dirigida e produzida por Ming-liang, ganhou prêmio especial no Festival de Berlim (menção especial no Teddy Bear), indicado lá ao Urso de Ouro, e exibido ainda nos festivais San Sebastián, Taipei e Chicago.

A Mostra de SP já exibiu, ao longo de suas edições, 10 filmes do diretor, e nesse ano há um lançamento dele na programação, o documentário ‘Permanência em lugar nenhum’, que passou nos festivais de Berlim e Hong Kong (ainda há uma sessão do doc, no dia 28/10). 

 


Rocinante

 

Exibido nos festivais de Tóquio e Istambul, o drama turco de título simbólico e ambíguo marca a estreia na direção de Baran Günduzalp, que também escreveu o roteiro. Uma fita pessoal que se passa na Istambul contemporânea, no meio de ruas agitadas e gente andando sem parar pelas calçadas. Um casal faz de tudo para sustentar o filho mudo, de seis anos. O marido está desempregado, e a esposa trabalha como telefonista, até que resolvem investir numa área em pleno crescimento no país: transportar passageiros por meio de mototáxi. Compram uma moto e a nomeiam de Rocinante, em homenagem ao cavalo de Dom Quixote, enfrentando uma série de obstáculos pelos próximos dias. Uma análise profunda sobre as relações de trabalho na Turquia e as transformações do país – sem contar na discussão apropriada que o filme faz sobre crises familiares. Sessões na Mostra nos dias 28 e 30/10, porém pode ser assistido até o dia 30/10 na plataforma Sesc Digital, com limite de 600 visualizações. 



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