segunda-feira, 24 de maio de 2021

Cine Clássico


A loja da esquina

Na capital da Hungria, Budapeste, Alfred (James Stewart), que é funcionário de uma loja de confecções, flerta com Klara (Margaret Sullavan), e passa a trocar correspondência com ela. A jovem é admitida na loja em que Alfred trabalha e sem saber que é ele o cidadão que manda cartas para ela, começa a hostilizá-lo. Até que uma situação delicada surge na loja, que colocará à prova a paixão de Alfred por Klara.

Uma das comédias românticas mais queridas de Ernst Lubitsch, cineasta judeu nascido na Alemanha, que deixou o país em 1922 para produzir seus filmes em Hollywood - e lá causou com seus toques de sensualidade e erotismo nas décadas de 20 e 30, conseguindo escapar da censura imposta pelo moralista ‘Código Hays’ (o código era uma censura que vigorou 20 anos em Hollywood condenando filmes considerados provocadores, quer seja por críticas à igreja e religião, quer seja pela amostra de nudez, beijos quentes etc). Lubitsch dava toda uma elegância e sofisticação para suas produções, utilizava um humor cínico com diálogos de duplo sentido, tanto que surgiu na época um estilo chamado de ‘Toque Lubitsch’ (diretores tentaram imitá-lo, a fórmula pegou nos Estados Unidos, mas a originalidade estava mesmo nas mãos daquele grande criador).
“A loja da esquina” é um dos mais acessíveis do diretor, baseado numa peça do dramaturgo húngaro naturalizado americano Miklós László. A peça tinha tanto carisma e originalidade que deu origem a dois outros filmes nos EUA, o musical da MGM com Judy Garland “A noiva desconhecida” (1949) e a notória comédia romântica dos anos 90 “Mens@gem para você” (1998), que trazia toques modernos para a antiga história (por exemplo, antes os personagens principais trocavam cartas, nesse aqui o contato era via email).
Há uma excelente química do casal, com momentos de puro humor, um romance no ar e diálogos cheios de atritos, sem contar as reviravoltas típicas de Lubitsch. James Stewart era um ícone do cinema, de comédias clássicas a suspense de Hitchcock (com quem trabalhou várias vezes), e Margaret Sullavan caiu no esquecimento, pouco lembrada hoje (infelizmente morreu de maneira prematura, de overdose de drogas, aos 50 anos).


O diretor Lubitsch se tornou popular em Hollywood, dirigiu 70 filmes, dentre alguns sucessos imortalizados pelo público, como “Sócios no amor” (1933), Ninotchka” (1939 – com Greta Garbo) e “Ser ou não ser” (1942). Recebeu três indicações ao Oscar durante a carreira e ganhou um prêmio honorário da Academia em 1947, poucos anos antes de falecer.
Original da MGM, o filme foi lançado anteriormente pela Warner em DVD e agora acaba de ser relançado pela Classicline.

A loja da esquina (The shop around the corner). EUA, 1940, 99 minutos. Romance. Preto-e-branco. Dirigido por Ernst Lubitsch. Distribuição: Warner Bros. (DVD, de 2001) e Classicline (DVD, de 2021)

sábado, 22 de maio de 2021

Na Netflix


Oxigênio

Liz (Mélanie Laurent) acorda numa cápsula criogênica sem saber como foi parar lá. Ela tem poucas horas para escapar daquele lugar fechado, pois o oxigênio está no fim. Sua única ajuda é a de um robô que controla o sistema onde ela se encontra, chamado M.I.L.O. (voz de Mathieu Amalric).

Suspense eletrizante, o filme scifi continua na parada de sucesso da Netflix Brasil, ainda no ranking como o 3º mais assistido dessa semana. É uma coprodução França /EUA que seria lançada nos cinemas, porém, devido à pandemia, teve os direitos adquiridos pela Netflix, com distribuição mundial há duas semanas.
O filme dá uma agonia danada de ver a personagem o tempo inteiro presa em uma capsula criogênica, com o oxigênio quase no fim, e um robô que a deixa maluca, sem parar de falar. É um tour-de-force da belíssima atriz francesa Mélanie Laurent, amarrada, sem poder se mexer (numa situação parecida com a de Ryan Reynolds em “Enterrado vivo”, lembram?). Enquanto encontra forças e formas para escapar daquele lugar, ela tenta recordar o que a levou até lá. Flashes de sua vida passam na tela como se fossem vagas lembranças da jovem.


Laurent está bem, num papel difícil, mas ela sempre esteve à frente de personagens à prova de bala, como os que fez em Hollywood, “Bastardos inglórios” e “Truque de mestre”. A voz grave de Mathieu Amalric, como o robô, ajuda na tensão daqueles instantes de agonia.
Mais um bom feito do diretor francês de filmes fortes de terror como “Alta tensão” (2003) e “Predadores assassinos” (2019).

Oxigênio (Oxygène). França/EUA, 2021, 100 minutos. Suspense/Ficção científica. Colorido. Dirigido por Alexandre Aja. Distribuição: Netflix


segunda-feira, 17 de maio de 2021

Cine Especial


Texto de estreia da coluna 'Top Cinema', da revista Top, de Catanduva.
Obrigado pelo convite para escrever, Antonio Jayme e Marcelo Fernandes!


Ilha dos cachorros

Na cidade de Megasaki, no Japão, o corrupto prefeito Kobayashi (voz de Kunichi Nomura) põe em prática uma lei para limpar os cachorros das ruas, devido a uma praga canina, abandonando os animais em uma ilha deserta no meio do mar, chamada “Ilha do Lixo”. Um dia o garoto Atari (voz de Koyu Rankin) vê, desesperado, seu cão de estimação. Spots, ser levado para a ilha. Constrói então um pequeno aeroplano para resgatá-lo. Ao chegar na ilha, ajuda os cães a organizar uma revolução contra os abusos de autoridade do prefeito, o que dá início a uma guerra.

Indicado ao Oscar de melhor animação e melhor trilha sonora (e nessas mesmas categorias ao Globo de Ouro e Bafta), essa divertida animação em stop-motion com forte comentário social é assinada pelo visionário cineasta de outra animação adulta, “O fantástico Sr. Raposo” (2009), Wes Anderson. Ele também dirigiu obras premiadas, como “Os excêntricos Tenenbaums” (2001) e “O grande hotel Budapeste” (2014), acumulando sete indicações ao Oscar, que vão de melhor filme a melhor roteiro original.
Pois bem, “Ilha dos cachorros” é a jornada incrível de um garoto de 12 anos num Japão autoritário para salvar os cachorros abandonados em uma ilha deserta. Olhe a coincidência dos nossos tempos, já se falava de um vírus terrível (o filme é de 2018, e o tal vírus é uma espécie de gripe que os cães transmitem aos humanos), e na mentalidade do prefeito corrupto, a contenção do mal era deixar os animais morrerem numa ilha, sem comida, sem água... Até que o garoto ajuda os cachorros a organizar um motim contra os abusos.
Prepare-se para uma aventura criativa, engraçada, cheia de peripécias e de referências políticas – aliás, é um filme politizado, que critica os abusos de autoridade e a corrupção, sem falar dos crimes contra os animais.
Tem a marca autoral do diretor (um cineasta com obras pessoais e incomuns), que criou aqui um visual oriental autêntico, que mistura luxo e decadência, com uma estranha sensação no ar de vingança e brutalidade. Nada voltado às crianças, a animação é para jovens e adultos.


Wes Anderson firmou novamente parceria frente ao roteiro com Roman Coppola (filho do notório diretor e produtor Francis Ford Coppola), escreveu-o também com o ator de seus filmes, Jason Schwartzman, e para o projeto trouxe o roteirista e multiartista japonês Kunichi Nomura (que também empresta a voz para o prefeito). Falando em voz, tem um time de peso na dublagem original, como Bryan Cranston, Edward Norton, Bob Balaban, Jeff Goldblum e Bill Murray, e, claro, um ótimo grupo feminino, Greta Gerwig, Scarlett Johansson, Frances McDormand e até Yoko Ono.
Assista! Disponível em DVD e Bluray pela 20th Century Fox.com muitos extras.

Ilha dos cachorros (Isle of dogs). EUA/Reino Unido/Alemanha/Japão, 2018, 101 minutos. Animação/Aventura. Colorido. Dirigido por Wes Anderson. Distribuição: 20th Century Fox


domingo, 16 de maio de 2021

Dica de Leitura


"Duna: Graphic novel - volume 1" (2021, 176 páginas). Lançamento da @intrinseca, essa é a adaptação em quadrinhos do famoso romance scifi de Frank Herbert por Brian Herbert e Kevin J. Anderson. Uma nova experiência visual do mundo distópico de Duna, cheia de detalhes, imagens fortes e uma trama altamente filosófica, que segue os passos do original. Ótimas ilustrações de Raúl Allén e Patricia Martín. Confira!! 




Cine Especial


A colina escarlate

Órfã, filha de um milionário, Edith (Mia Wasikowska) se casa com um empreendedor inglês chamado Thomas Sharpe (Tom Hiddleston), e com ele se muda para um velho castelo no meio do nada. Lá reside a irmã de Thomas, Lucille (Jessica Chastain), uma mulher misteriosa. Edith, cada vez mais sozinha, começa a ser assombrada por sinistros fantasmas, que dão um alerta para ela. A jovem então resolve por conta investigar um antigo segredo, guardado a sete-chaves nos porões do castelo.

O estimado cineasta mexicano Guillermo del Toro prestou sua homenagem ao cinema de horror gótico nesse seu filme menos experimental, mais com cara de blockbuster (e orçamento para isso), e ainda assim soturno e com certa inventividade. Escrevendo o roteiro ao lado do veterano Matthew Robbins, que juntos haviam feito o gosmento e escatológico “Mutação” (1997), trouxe traços do Romantismo, com claro diálogo com o romance “Jane Eyre”, um pouco do espírito de Edgar Allan Poe, personagens alusivos ao mundo de Roger Corman, e até do suspense de Hitchcock “Rebecca, a mulher inesquecível” (1940). Tudo isso para contar uma história melancólica, de um terror que oscila entre o psicológico e o evidente, cujo enredo segue numa montanha russa do medo, com reviravoltas envolvendo crimes brutais, espíritos feiosos ensanguentados (que não sabemos se são amigáveis ou mortais) e uma estranha argila que circunda o decrépito castelo.


Notadamente é uma produção bem cuidada e bem cara (custou U$ 55 milhões), com elementos visuais estridentes, de forte impacto, como a fotografia, o figurino e a direção de arte, que lembram o estilo das fitas populares da produtora britânica Hammer (esses elementos ficarão na nossa memória por um bom tempo). Infelizmente não teve a bilheteria esperada (U$ 75 milhões no mundo), e posso dizer que assumiu o lado cult, assim como ocorreu com grande parte da filmografia do diretor.


O elenco se esforça (gosto em particular de Hiddleston, que casa bem com filmes de época), e o filme pode cair no gosto de quem curte “gore” (terror com mortes macabras e muito sangue) – e há até uma investida numa trama de “mistério” (só para aguçar a curiosidade de quem não viu, existe um assassino na história, meio fácil de descobrir quem seja, e só revelado no desfecho).
Assisti no cinema em 2015, depois revi duas vezes, na época do lançamento em DVD pela Universal e essa semana novamente em DVD. Continuo gostando da obra, e confesso que na revisão melhorou... não é um Del Toro megaespecial, mas ele faz jus ao tema, e há seu estilo marcante, com criaturas estranhas, o tom macabro, os elementos visuais com suas cores fortes – dele, na linha do “gore” com fantasia como esse, destaco “Cronos” (sua estreia em longa-metragem, de 1993) e “A espinha do diabo” (2001 – um exercício com espíritos, de forma inventiva), ambos rodados no México.

A colina escarlate (Crimson Peak). EUA/Canadá/México, 2015, 119 minutos. Terror. Colorido. Dirigido por Guillermo Del Toro. Distribuição: Universal Pictures

sábado, 15 de maio de 2021

Cine Cult


A infância de Ivan

Na Segunda Guerra Mundial, o garoto órfão Ivan (Nikolay Burlyaev), de 12 anos, atua como espião no Exército Vermelho, a mando dos soviéticos, cruzando as linhas inimigas para conseguir informações do lado alemão. Ele faz esse trabalho como forma de se vingar dos nazistas, que assassinaram sua família.

Esse foi o longa-metragem de estreia do cineasta Andrei Tarkovsky, na época com 29 anos, que venceu o Leão de Ouro no Festival de Berlim em 1962. Rodado na cidadezinha ucraniana de Kaniv, às margens do rio Dniepre (que corta a Rússia e é um dos extensos do país), é um drama dos mais bem fotografados do cinema, com imagens descomunais que trazem uma carga realista misturada a um tom onírico, de um interminável pesadelo no front de guerra. Aliás, Tarkovsky prezava pela fotografia, que tinha uma voz consonante com a trama e os personagens - vide em seus filmes como ela é um elemento primordial, e todo o rigor técnico capaz de elevar cada filme ao status de obra-prima, dentre eles “Solaris”, “Stalker”, “Andrei Rublev”, “O espelho” e “O sacrifício”. Em “A infância de Ivan” Tarkovsky exercitou suas técnicas que virariam uma marca autoral, como a câmera lenta, as passagens com gruas, o panorama, a profundidade, a manipulação/intervenção de imagens com pura semiótica e deslocamentos. É um diretor único, que infelizmente nos deixou cedo demais, em 1986, aos 54 anos, vítima de câncer no pulmão.

O filme foi um dos primeiros a mostrar o olhar de uma criança diante de uma guerra atroz, depois viriam tantos outros, como o aclamado “Vá e veja” (1985, também russo), o lírico “Esperança e glória” (1987) e o perturbador e recém-lançado “O pássaro pintado” (2019). É baseado num conto de 1957 de Vladimir Bogomolov e Mikhail Papava, que traz um garoto cuja família foi morta pelos nazistas, alia-se aos soviéticos e vira um espião (pelo corpo miúdo, consegue atravessar florestas e cercas sem ser visto, ou seja, escapa com facilidade, e assim se infiltra no meio alemão para obter informações e repassá-las ao outro lado das linhas inimigas). Protegido de oficiais soviéticos, ele permanece até o fim para se vingar dos alemães, mesmo diante de um iminente embate entre as duas tropas.
Na época o bom ator Nikolay Burlyaev tinha 15 anos (interpretando um garoto de 12), sendo essa sua estreia, e depois trabalharia com Tarkovsky no épico “Andrei Rublev” (1966).


Lançado esse mês em DVD e Bluray pela CPC-Umes Filmes, numa cópia restaurada digna de elogios. Vale lembrar que o filme também está disponível em DVD pela Versátil no box “A arte de Andrei Tarkovsky”, junto de “O espelho” (1975), “Nostalgia” (1983) e “Tempo de viagem” (1983).

A infância de Ivan (Ivanovo detstvo). URSS, 1962, 95 minutos. Drama. Preto-e-branco. Dirigido por Andrei Tarkovsky. Distribuição: CPC-Umes Filmes (DVD e Bluray, de 2021) e Versátil Home Video (DVD, de 2015, no box ‘A arte de Andrei Tarkovsky)

quinta-feira, 13 de maio de 2021

Dos livros para a tela


"Deixo Sue com seu segundo sanduíche de bacon e vou até o consultório de David ligar a máquina de café. De um modo idiota, é como fingir brincar de casinha com ele. Sinto um frio na barriga e não consigo conter a animação. Sempre gostei do trabalho, mas agora há uma outra emoção".

Trecho do livro "Por trás de seus olhos" (2017), de Sarah Pinborough, relançado recentemente pela editora Intrinseca devido ao sucesso da minissérie da Netflix que é uma adaptação da obra literária.
Um dos livros mais vendidos pelas listas do Sunday Times e do New York Times, traduzido em 25 países, o eletrizante romance conta a história de Louise, uma mãe solteira, que trabalha como secretária, e acaba de conhecer um homem num bar. Os dois trocam um beijo, despedem-se, e ela planeja um novo encontro. Quando descobre que o cara é o seu chefe, e é casado, Louise leva um baque, porém não deixa de se envolver, e ambos começam um romance. Numa reviravolta da vida, Louise fica amiga da esposa do amante. Aquele trio então irá se envolver numa série de equívocos surpreendentes.
Misturando suspense, romance e drama, com muitos plot twists, o livro deu origem à minissérie britânica lançada em fevereiro de 2021, produção da Netflix, que conta com os atores Simona Brown, Eve Hewson e Tom Bateman. Leia o livro da Intrínseca e depois assista à série!




sábado, 8 de maio de 2021

Na Netflix


A família Mitchell e a revolta das máquinas

Os Mitchells são uma família unida, amorosa, mas atrapalhada. Pai, mãe, os dois filhos pequenos e o cachorro partem para uma viagem de carro, que será interrompida por uma revolta tecnológica onde as máquinas adquirem vida própria, ameaçando a humanidade. Eles encaram então a missão de salvar o planeta.

Divertida fita de animação que é justamente a primeira parceria da Sony Animation com a Netflix, e que acaba de estrear nessa plataforma de streaming que é a mais querida do público. Tem toda a inventividade e anarquia estética dos produtores Christopher Miller e Phil Lord, que venceram o Oscar pela incrível animação “Homem-Aranha no Aranhaverso” (2018), e haviam produzido antes “Uma aventura Lego” (2014).
De um lado vemos uma família disfuncional, desajustada, mas unida e de bom coração... do outro, robôs destrutivos que ameaçam a vida humana, depois de ser instalada uma revolta tecnológica, em que celulares, computadores e máquinas criam vida. No meio do caos, os Mitchells tentarão ser menos atrapalhados para ajudar na salvação da Terra.
No meio da animação em CG surgem memes da internet, fotos de pessoas e até uma cena da clássica comédia de Mel Brooks “O jovem Frankenstein” (1974), em que aparece Gene Wilder. Humor é o que não falta, sem falar na quantidade de momentos de ação e adrenalina! Crianças, jovens e adultos vão adorar, anote na agenda!
Estreia na direção a dupla Jeff Rowe e Mike Rianda, roteiristas da série animada da Disney “Gravity Falls” – aliás, o filme é inspirado numa viagem de carro que o diretor Rianda fez com seu pai, repare a homenagem nos créditos finais. A dupla começou a produzir o longa em 2015, a ideia era lançá-lo em 2020, mas devido à pandemia estreou oficialmente na Netflix somente na semana passada (dia 30 de abril).


Depois de assistirmos, dá para refletirmos como a tecnologia afeta nosso dia a dia (pro bem e pro mal), como a inteligência artificial vem dominando as tarefas cotidianas, além das delícias e das dificuldades do mundo virtual.
A animação conta com as vozes de Abbi Jacobson, Danny McBride, Maya Rudolph e da vencedora do Oscar Olivia Colman. Deve pegar indicação ao Oscar de animação em 2022. Está como top 3 de ‘filmes mais vistos’ na Netflix Brasil.

A família Mitchell e a revolta das máquinas (The Mitchells vs the machines). EUA/Canadá/Hong Kong/França, 2021, 113 minutos. Animação. Colorido. Dirigido por Mike Rianda e Jeff Rowe. Distribuição: Netflix

Cine Cult


Rapaziada!

Pavel (Aleksandr Mikhaylov), que está servindo o exército, recebe uma carta de sua mãe informando que a noiva dele comete traição. Abalado, ele decide não mais retornar para a cidade onde vive com a noiva. Uma década se passa, Pavel descobre que a ex-noiva faleceu, e que ela havia deixado três filhos órfãos – um deles é sua filha. Decide então cuidar dos três e passa a desconfiar que a notícia da traição era falsa.

Melodrama soviético produzido em 1981, é uma fita rara e pela primeira vez em DVD no Brasil, lançada esse mês pela CPC-Umes Filmes. Vale um destaque: a cópia é restaurada, contando com uma imagem excelente, bem nítida, que parece em alta definição (talvez uma das melhores cópias da distribuidora).
É a jornada interior de um homem solitário em busca da verdade, ao mesmo tempo em que, tomado por um espírito de consciência e de responsabilidade, resolve cuidar dos três filhos da ex-noiva falecida. Ele segue com os meninos órfãos, desconfiando que uma amarga notícia do passado que tanto o abalou pode ter sido inventada pela própria mãe – ela não gostava de sua noiva, o havia informado numa carta que a mulher o traía, o que fez com que Pavel abandonasse o lar. Muito tempo depois o engano é colocado à prova, porém não há formas de reconciliação ou entendimento mais claro, pois as duas envolvidas morreram (mãe e noiva). Como se desfazer daquela devastadora notícia que tanto o atormentou?


Pavel é um protagonista marcante, com várias camadas e desdobramentos, mesclando autoridade, lucidez e coragem, interpretado pelo bom ator russo Aleksandr Mikhaylov. Assista a esse filme raro e tire suas conclusões.
Dois rápidos comentários: o filme recebeu, no Festival de Berlim, uma menção honrosa, além de indicado ao Urso de Ouro. E é o longa mais conhecido da falecida diretora Iskra Babich, que só fez quatro obras ao longo da carreira – ela escreveu o roteiro em parceria com Vadim Mikhaylov.

Rapaziada! (Muzhiki!). URSS, 1981, 92 minutos. Drama. Colorido. Dirigido por Iskra Babich. Distribuição: CPC-Umes Filmes

quarta-feira, 5 de maio de 2021

Cine Clássico


Círculo do medo

O criminoso Max Cady (Robert Mitchum) deixa a cadeia disposto a se vingar de seu advogado, Sam Bowden (Gregory Peck), que pode ter interferido propositalmente em sua prisão.

Está aí um clássico do cinema hollywoodiano de tirar o chapéu, um thriller classe A sobre vingança que ganhou, trinta anos depois, um remake tão fenomenal quanto esse, “Cabo do medo” (1991, de Martin Scorsese). Do início ao fim o público é envolto num eletrizante (e sádico) jogo de gato e rato, que deixa qualquer um atônito. Na história, um criminoso (Robert Mitchum, sinistro) sai da cadeia e bola um plano para acabar com o advogado (Gregory Peck, sempre bem) que o colocou lá, preparando uma série de armadilhas que atingirão toda a sua família (no caso a esposa e a filha, interpretadas por Polly Bergen e Lori Martin). Para ajudar o advogado a sair dessa, entram na trama um chefe de polícia (Martin Balsam) e um detetive particular (Telly Savalas).
É baseado num livro de sucesso da literatura americana policial, e polêmico pela violência, “Os executores”, de 1956 (intitulado no Brasil de “Os algozes” e recentemente lançado pela Darkside Books com o título “Cabo do medo”), do escritor John D. MacDonald. O roteiro enérgico é de James R. Webb (que no mesmo ano ganharia o Oscar de roteiro por “A conquista do Oeste”), e inspirou o roteiro do remake de 1991 (há muitas diferenças entre o livro e esse primeiro filme, e mais diferenças ainda com o remake, como o desfecho, a relação de Cady com a filha adolescente do advogado etc).


A dupla Peck-Mitchum mantém um clima de sintonia em cena, com todos os aspectos de comportamento exigidos pelos personagens, do olhar de ódio à rivalidade com brigas corporais – o Cady de Mitchum lembra um de seus vilões mais marcantes do cinema, o fanático religioso Harry Powell de “O mensageiro do diabo” (1955). Curiosidade: parte do elenco voltaria em papéis menores no segundo filme, como Peck, Mitchum e Balsam.
Memorável é a trilha sonora de Bernard Herrmann, que inspirou a do remake e ainda podemos ouvi-la na série da Netflix “Ratched”.


A direção é o ponto alto de “Círculo do medo”, do mestre do cinema policial J. Lee Thompson, um ano depois de ter sido indicado ao Oscar de melhor direção pelo clássico de guerra “Os canhões de Navarone” (1961) – nas décadas seguintes faria fitas passageiras de ação, muitas com Charles Bronson (“O grande búfalo branco”, “Cabo Blanco”, “Kinjite”), além de dois filmes da franquia “O planeta dos macacos”, no caso “A conquista do planeta dos macacos” e “A batalha do planeta dos macacos”, e ainda um clássico da Sessão da Tarde, “As minas do rei Salomão” (1985).
Esse filmaço de suspense não envelheceu, continua intacto nos deixando atônitos, com os nervos à flor da pele. Em DVD pela Universal.

Círculo do medo (Cape Fear). EUA, 1962, 106 minutos. Suspense. Preto-e-branco. Dirigido por J. Lee Thompson. Distribuição: Universal

segunda-feira, 3 de maio de 2021

Cine Cult


Florbela

A poetisa portuguesa Florbela Espanca (Dalila Carmo) se vê presa em um casamento de puro tédio. Ela não enxerga mais o marido com os mesmos olhos de quando o conheceu. Um dia recebe uma carta do irmão, Apeles (Ivo Canelas), com quem tem muita afinidade, e resolve abandonar o lar para encontrá-lo na capital, Lisboa. Na cidade grande, Florbela aproxima-se de escritores importantes, cria um forte laço com o irmão, por quem desenvolve uma paixão, e produz suas poesias inspiradoras. Até que é forçada pelo marido a voltar para casa, no interior.

O cinema português é pouco apreciado no Brasil, talvez por não termos aqui uma distribuição das obras de forma efetiva. Lá na terrinha há cineastas de qualidade impressionante, sendo Manoel de Oliveira o maior representante, seguido de Miguel Gomes, João Cesar Monteiro, Teresa Villaverde e um que gosto especialmente, Miguel Gonçalves Mendes, com quem passei uma tarde quando estive em Lisboa no Festival de Cinema Itinerante da Língua Portuguesa, o Festin, em 2013. E nessa lista incluo Vicente Alves do Ó, o diretor e roteirista de “Florbela” (2012), um filme poético, de beleza e textura admiráveis, inspirado na vida da escritora e poetisa portuguesa Florbela Espanca (1894-1930).


Foi a produção mais vista nos cinemas de Portugal naquele ano, acredito que pelo fato de a poetisa exercer forte tradição na cultura popular do país. De narrativa lenta (próprio de um cult português), o longa se passa na década final de vida da escritora, 1920-1930, colocando a poetisa como uma mulher à frente de seu tempo. Entediada no casamento, cheia de inquietações, ela deixa o marido para seguir com o irmão (com quem é apegada) para Lisboa. Uma tragédia (que não vou contar, apesar de o fato ser notório na biografia da escritora) faz o mundo de Florbela ruir, então escrever se torna sua salvação, uma maneira de expurgar os sentimentos dolorosos e também de fugir da pressão da realidade.
Como disse, o roteiro não segue a biografia de cabo a rabo da personagem-título, muitos fatos da infância e meninice dela ficam nos diálogos e entrelinhas, como seu nascimento fruto de um casamento extraconjugal, e o abandono pelo pai, que não a reconheceu em vida.


É bom dizer que o filme é bem formal, de extremo rigor técnico, que beira o literário, e conta com locações bem cuidadas, dentro de uma fotografia iluminada – várias locações são da cidadezinha onde Florbela nasceu, Vila Viçosa, na região de Évora, além de externas em Lisboa.
Como muitos escritores por aí, Florbela só ficou conhecida em seu país depois de seu falecimento. No caso, foi uma morte prematura - ela era suicida, tentou a morte várias vezes, até que conseguiu aos 36 anos, por overdose de remédios. Sem sombra de dúvida permanece no topo das maiores escritoras de Portugal, ao lado de Mariana Alcoforado, Agustina Bessa-Luís e Maria Gabriela Llansol.
Ganhador de mais de 20 prêmios em festivais pelo mundo, o longa está disponível em DVD pela Imovison.

Florbela (Idem). Portugal, 2012, 114 minutos. Drama. Colorido. Dirigido por Vicente Alves do Ó. Distribuição: Imovision

sábado, 1 de maio de 2021

Cine Cult


A noite dos demônios


Um pequeno grupo de amigos, na noite de Halloween, invade uma casa abandonada para fazer uma festa. No passado o local foi palco de um terrível massacre. Nas altas horas da madrugada, os amigos fazem uma sessão espírita, despertando demônios adormecidos que passam a possuir o corpo de cada um deles.

Outra fita cult de terror dos anos 80 que a distribuidora Obras-Primas do Cinema resolveu lançar no Brasil em DVD (para a felicidade dos fãs do gênero). Nunca mais eu tinha ouvido falar dela, e revi dias atrás, com bastante empolgação (o filme marcou a memória dos cinéfilos que curtem filmes de possessão, pela história macabra parecida com “Evil dead”, e a horripilante maquiagem dos demônios). Na verdade, mistura humor (por isso é um ‘terrir’), é notadamente uma produção B, e devido à representação que teve nos Estados Unidos, originou duas continuações (1994 e 1997) e um remake, em 2009.
Conta com a velha fórmula (e esperada) do cinema de horror: demônios feiosos, sustos, Halloween como pano de fundo, casa abandonada, sessão espírita e mortes sangrentas.
Mais um acerto da competente distribuidora Obras-primas do Cinema, que trouxe o filme em DVD no box “Sessão de Terror Anos 80 – Volume 4”, junto de “Leviathan” (1989 – que comentei na coluna passada), “Sonho mortal” (1988 – de Andrew Fleming) e “Witchtrap: A noite das bruxarias” (1989, do mesmo diretor desse aqui, Kevin Tenney).


Foi o segundo filme desse diretor nascido no Hawaii, que costuma trabalhar o tema de demônios e ocultismo - antes ele fez um longa de tema próximo, “Espírito assassino” (1986), e depois faria o fraco “Witchtrap: A noite das bruxarias” (1989).

A noite dos demônios (Night of the demons). EUA, 1988, 90 minutos. Comédia/Terror. Colorido. Dirigido por Kevin Tenney. Distribuição: Obras-primas do Cinema