Os melhores filmes do
Festival do Rio 2024 – parte 2
A 26ª edição do Festival
do Rio segue até hoje, dia 13/10, com uma rica programação de filmes. É um dos
eventos de cinema mais importantes do Brasil e vem levando ao público dezenas
de estreias mundiais, com longas e curtas-metragens premiados em festivais como
Berlim, Cannes, San Sebastian e Veneza. E se você perdeu algum dos filmes, fique
tranquilo – a repescagem já foi anunciada e será entre os dias 14 e 18 de
outubro.
Mais uma vez estou no
Festival e lá pude conferir filmes imperdíveis, que recomendo agora nesses
drops. Confiram abaixo.
As aventuras de uma
francesa na Coreia do Sul
Os filmes do sul-coreano
Hong Sang-soo se tornaram prata da casa em festivais brasileiros como o Rio e a
Mostra de SP, e o público parece gostar do estilo do diretor, que chega a
realizar de dois a três longas-metragens por ano. Por esse filme, ganhou o Grande
Prêmio do Júri no Festival de Berlim, e mais uma vez trabalha com a francesa
Isabelle Huppert. A atriz está à vontade na frente das lentes do peculiar
Sang-soo, num filme bonitinho que é novamente uma longa conversa entre pessoas.
Huppert interpreta uma professora de francês na Coreia do Sul; conhecemos a
rotina dela – em um dia - visitando alunos para as aulas, e que na oportunidade
ela e eles discutem outros assuntos. Huppert é a alma dessa fita de arte graciosa,
de narrativa tácita, voltada para quem conhece o estilo do cineasta. Em
exibição no Festival do Rio ainda no dia 13/10. O filme deve estrear em breve no
Brasil, com distribuição da Pandora Filmes.
Emília Perez
Foi o filme de abertura
do Festival do Rio desse ano, um filme que mistura gêneros e mexeu com a
plateia. Rodado no México, com elenco de lá e dos Estados Unidos, é um musical
efusivo com drama e que reserva bons momentos de ação, e que discute assuntos
pertinentes como identidade e gênero – de uma forma que nunca tinha visto
antes, e toca numa ferida aberta do México que é a relação das milícias
sanguinolentas com os milhares de desaparecidos que somam as tristes
estatísticas do país da América do Norte. Zoe Saldana é uma advogada em crise
com seu trabalho que é sequestrada por criminosos fortemente armados. Ela é
colocada frente a frente com um temido chefe de cartel de drogas que pede a ela
um favor um tanto inusitado: conseguir, em total sigilo, um cirurgião para que
ele passe pela mudança de sexo. Ela consegue, e o cruel Manitas se torna Emília
Perez. O criminoso é dado como morto, sua mulher e filhos enviados para a
Suíça, e Emília agora vive sua liberdade no corpo feminino, abrindo uma ONG
para encontrar/investigar os desaparecidos das milícias das quais fazia parte
no passado. Um filmão que é ver para crer, que mexe com nossa cabeça e nossos
sentidos. Ganhou o prêmio coletivo de atriz em Cannes e no mesmo festival,
recebeu o do Júri. Zoe Saldana, Selena Gomez (que faz a esposa de Manitas) e
Karla Sofía Gascón dão um show, com especial destaque para Karla, que está formidável
e pode ser indicada a Oscar em 2025. Baseado no romance homônimo de Boris
Razon, tem a direção do francês Jacques Audiard, realizador de filmes sérios e complexos,
como ‘O profeta’ (2009), ‘Ferrugem e osso’ (2012) e ‘Dheepan – O refúgio’
(2015), que ganhou a Palma de Ouro em Cannes. Sessões encerradas no Festival do
Rio. O filme tem data de estreia no Brasil: 06/02/2025, pela Paris Filmes.
Tudo vai ficar bem
Outro bom destaque do
Festival do Rio, ‘Tudo vai ficar bem’, produção Hong Kong/China, ganhou o Teddy
no Festival de Berlim (premiação dada a filmes com temática gay). Aliás, o
diretor Ray Yeung costuma trazer reflexões acerca das relações homoafetivos em
seus trabalhos, seja em curtas ou longas-metragens. Seu filme anterior tem
relação com esse, ‘Suk Suk – Um amor em segredo’ (2019), sobre dois homens a
beira dos 70 anos que escondem da sociedade o relacionamento. Em ‘Tudo vai
ficar bem’, o casal é composto por duas mulheres, já idosas, que estão juntas
há 40 anos. Uma delas morre repentinamente, e a companheira, desnorteada, fica
sozinha no apartamento que ambas têm juntas. Mas é aí que surge o ponto-chave
da história: o apartamento passa a ser reivindicado pelo irmão da falecida, que
promete ir até o fim para conseguir o imóvel. Todo delicado, o filme emociona e
nos faz refletir, e tem um trabalho primoroso do elenco inteiro. Sessões
encerradas no Festival do Rio.
A verdadeira dor
Segundo filme de Jesse Eisenberg na direção, com roteiro dele. E tudo funciona, mesmo que de maneira discreta. É um filme pessoal, que aborda assuntos de interesse ao ator, no caso o Holocausto. Ele também atua, no papel de um jovem que viaja com seu primo (papel muito legal de Kieran Culkin, que deve ser finalista de prêmios na temporada do ano que vem) à Polonia. Eles estão numa pequena excursão em busca das raízes da família e nos próximos dias irão visitar pontos turísticos de Varsóvia e um campo de concentração (a cena do campo é a melhor do filme). Nessa viagem, emoções vão aflorar, e os primos terão de suportar os problemas um do outro. Participação especial de Jennifer Grey, de ‘Dirty Dancing’. Prêmio especial no Festival de Sundance. Em exibição no Festival do Rio ainda no dia 13/10.
O aprendiz
O diretor e roteirista iraniano
Ali Abbasi já havia nos surpreendido com ‘Border’ (2018) e ‘Holy spider’
(2022), dois trabalhos ímpares de suspense com drama psicológico, o primeiro
sobre um homem deformado que desenvolve o dom de sentir o cheiro do medo, e o
segundo, sobre a captura a um cruel serial killer de prostitutas. Agora, em ‘O
Aprendiz’, ele arrebenta a porta do mundo dos negócios de Nova York dos anos 70
trazendo para a tela ninguém menos que Donald Trump. É ele o protagonista desse
filme sagazmente crítico que aborda sua ascensão no ramo imobiliário. Sebastian
Stan está feroz com o jovem Trump disposto a tudo para obter fama e sucesso.
Ele será ‘o aprendiz’ do advogado Roy Cohn, um homem temido, inescrupuloso e
cheio de manias – papel impressionante de Jeremy Strong, um provável candidato
a Oscar de ator coadjuvante. O drama aborda a Era Trump, com todas as suas lateralidades,
como os anos da Aids, o boom imobiliário de Nova York, o neoliberalismo durante
e pós-Reagan. E o filme não é tímido em mostrar os embates de Donald com o pai
e a crise no casamento com Ivana (papel rápido, mas de destaque de Maria
Bakalova) – tem até uma cena forte em que ele estupra a esposa. Curiosa é a
maneira de filmar de Abbasi – ele insere cenas aéreas e das ruas de uma NY real,
com apelo de documentário, fazendo com que algo tenha envelhecido nas imagens, resultando
numa fotografia ambígua e original. Indicado à Palma de Ouro em Cannes. Um dos
melhores filmes do Festival do Rio junto de ‘Emília Perez’. Em exibição no
Festival do Rio ainda no dia 13/10. O filme estreia no Brasil no dia 17/10,
pela Diamond Filmes.
Vibrante, colorido e de
visual surrealista único, a versão restaurada de ‘Dublê de anjo’ (2006), em
parceria com a Mubi, entrou na programação do Festival do Rio na mostra ‘Clássicos
& Cults’. O diretor indiano Tarsem Singh, que antes havia realizado ‘A cela’
(2000) criou uma história de aventura fora dos padrões e de estética memorável.
E na tela grande o filme fica ainda melhor. Um dublê ferido, na cama do
hospital, conta para uma garotinha várias histórias de heróis imaginados, e
ambos são transportados para esses mundos. Uma obra deliciosa, divertida, que
impressiona. Vencedor do Crystal Bear em Berlim, o filme acaba de entrar no
catalogo da Mubi. Sessões encerradas no Festival do Rio.
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