terça-feira, 29 de novembro de 2011

Resenha

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Os amantes da Ponte Neuf

Alex (Denis Lavant) é um rapaz viciado em álcool e sedativos que mora nas ruas e faz bico com performances circenses. Conhece Michèle (Juliette Binoche), uma pintora de classe média que, abandonada pelo namorado, fugira de casa para viver sozinha na marginalidade. Ela sofre de uma doença que a deixará cega em poucas semanas. Na ponte mais antiga da França, Neuf, Alex e Michèle inicia uma história de amor pouco convencional, marcado por violência e obsessão.

Fita de arte francesa que obteve repercussão no circuito independente de cinema quando do seu lançamento, em 1991, virando cult anos mais tarde. Trata-se de um exercício de estilo delirante, todo rodado na parte “suja” de Paris, em especial na Ponte Neuf, a mais antiga e famosa da capital francesa, que serve de abrigo a centenas de sem-teto. A edição rápida e o colorido dos freqüentes fogos de artifício e das luzes da parte underground da cidade viram atípicos elementos desse drama romântico sobre personagens nada convencionais: os marginalizados.
Na tela projetam-se andarilhos moradores da Neuf, que vivem em condições precariamente sub-humanas. Desse grupo de gente destaca-se duas pessoas que aos poucos viram o casal central da história: Alex, um viciado em álcool, com perturbações mentais (Denis Lavant está correto, mudo, sempre imundo, com traços fortes de bandido), e Michèle (Juliette Binoche, que mesmo como uma mendiga quase cega, sempre com tampão no olho, continua com a beleza exuberante). Esta, no passado, era da classe média, e agora, por desilusão amorosa, caiu na sarjeta. Aos poucos o relacionamento entre eles fica obsessivo e conflituoso, marcado pela violência.
“Os amantes da Ponte Neuf” é um estranho love story entre marginais, com cenas reais das indigentes nas ruas de Paris que se aproximam do documentário. Pela temática fora dos padrões, dificilmente veremos outra fita igual.
Indicado ao Bafta de filme estrangeiro e a dois Césars – atriz (Juliette) e produção, o drama foi dirigido por um cineasta independente chamado Leos Carax, pouco lembrado já que não realizou outros filmes expressivos – este sem dúvida é o seu melhor momento, com roteiro dele inclusive. Por Felipe Brida

Os amantes da Ponte Neuf (Les amants du Pont-Neuf). França, 1991, 125 min. Drama. Dirigido por Leos Carax. Distribuição: Lume Filmes

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Morre o diretor inglês Ken Russell

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O diretor, roteirista e produtor inglês Ken Russell morreu na noite de ontem aos 84 anos, após ficar internado vários dias em um hospital na Inglaterra.
Indicado ao Oscar em 1969 por "Mulheres apaixonadas", Russell fez de tudo um pouco: curtas, documentários e fitas para TV (nos anos 50 e 60, início de carreira) e longas importantes do cinema alternativo, como "Delírio de amor" (1969 - biografia de Tchaikovsky), "O namoradinho" (1971), "The devils" (1971), "Mahler" (1974 - biografia do compositor Gustav Mahler), "Tommy - O filme" (1975 - baseado na ópera-rock do The Who), "Lisztomania" (75), "Viagens alucinantes" (1980) e "Crimes de paixão" (1984). Por Felipe Brida

Cine Lançamento

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A árvore da vida

Pai, mãe e três filhos pequenos. Em torno de uma típica família norte-americana na década de 50, o cotidiano marcado por frustrações, alegria, perda da inocência, angústias, repressão e dúvidas transformará para sempre a vida de cada um deles.

Premiado com a Palma de Ouro em Cannes esse ano, “A árvore da vida” marca o retorno do cineasta bissexto Terrence Malick, que realiza aqui a obra mais autoral de sua carreira. É o quinto trabalho do diretor e roteirista em quatro décadas – antes fez “Terra de ninguém”, “Dias de paraíso”, “Além da linha vermelha” e “O Novo mundo”. Hoje, aos 68 anos, continua com as velhas manias: não se expõe em público, evita festivais de cinema, não concede entrevistas à imprensa, vive recluso.
A nova obra é a própria essência vital de Malick, uma autobiografia velada, sem créditos para tal. Um filme tácito, lento, com breves diálogos e imagens deslumbrantes captadas a partir da belíssima fotografia. Considero-o um poema visual, que explora as relações familiares, muitas delas conturbadas, e ao mesmo tempo faz um paralelo com a criação do mundo – o Big Bang, a era dos dinossauros, o surgimento da vida etc.
Por ser uma experiência cinematográfica única, diferente pela narrativa fragmentada em que troca a voz pela trilha sonora (há sequências de 15 minutos sem uma conversa sequer, apenas com músicas compostas pelo ótimo Alexandre Desplat, quatro vezes indicado ao Oscar), “A árvore da vida” volta-se para poucos, restrito a um público de filme de arte.
Repleto de referências semióticas, não é para ser entendido por completo e sim sentido. Por isso, deve-se assistir mais de uma vez.
A simbologia da árvore no quintal da família (título do filme) nutre as relações interpessoais dos filhos com o pai severo (papel de Brad Pitt, super firme na atuação) e de todos eles com a mãe atenciosa, por ora submissa (Jessica Chastain, em momento especial que poderá lhe render prêmios futuros). A história sempre intercala presente e passado, e no momento atual os poucos personagens apenas aparecem, sem contato maior com o mundo ou com pessoas (o ator Sean Penn interpreta um deles, como o filho crescido. Ele fica em cena cinco minutos, na pele de um empresário em crise, que não diz uma palavra).
Um dos filmes do momento, discutido em todos os cantos do mundo, para público adulto e preparado. Não deixe de conferir e, se possível, rever. Por Felipe Brida

A árvore da vida (The tree of life). EUA, 2011, 139 min. Drama. Dirigido por Terrence Malick. Distribuição: Imagem Filmes

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Viva Nostalgia!

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Desejo

Nova Inglaterra, 1840. O rico proprietário de terras Ephriam Cabot (Burl Ives) vive com os filhos em uma fazenda isolada do mundo. O mais rebelde deles, Eben (Anthony Perkins) mantém pouco diálogo com o pai, considerado homem muito rígido e agressivo. Certa tarde, após chegar de viagem, Ephriam apresenta à família sua nova esposa, Anna (Sophia Loren), mulher bem mais jovem. Eben apaixona-se perdidamente pela moça, e ambos iniciam um relacionamento secreto, o que poderá colocar a vida dos dois em risco.

Indicado ao Oscar de melhor fotografia e à Palma de Ouro em Cannes em 1959, “Desejo” sai na coleção Clássicos pela Paramount, que encontrou um raro achado; o filme ficou pouco conhecido no Brasil e mal foi exibido nos cinemas de outros países. Portanto, agora uma oportunidade exclusiva para o público conhecer esse melodrama baseado na obra do dramaturgo anarquista Eugene O’Neill, duas vezes vencedor do Pulitzer e uma do Nobel (em 1936).
A história segue a disputa entre pai e filho por uma mesma mulher. O primeiro, interpretado pelo grande ator Burl Ives (envelhecido, com peruca e barba branca), tem uma invejável fazenda onde mora com os filhos homens; rude, durão e por vezes violento, Ephriam traz para casa uma mulher no mínimo 30 anos mais nova que ele (Sophia Loren, em seu primeiro papel nos Estados Unidos). Belíssima, a jovem desperta uma paixão alucinada em um dos rapazes da casa, filho do fazendeiro (Perkins, bem novo, dois anos antes de ficar notório como o psicopata Norman Bates em “Psicose”). A partir daí, os dois se envolvem em um romance às escuras, distante dos olhos do pai, que não desconfia de nada. É óbvio que ao longo da história haverá reviravoltas dramáticas, segredos revelados, brigas e afins.
Com produção modesta, rodado em preto-e-branco, o filme se desenrola em poucos cenários (no interior da fazenda e na casa da família, principalmente), condensando ainda mais o clima de indecisão do casal que comete a traição.
Bom texto, com típica tragédia americana no desfecho, “Desejo” foi dirigido por Delbert Mann, premiado com o Oscar de melhor diretor por Marty (1955) e ainda responsável pelos clássicos “Vidas separadas” (1958) e “Carícias de luxo” (1962). Por Felipe Brida

Desejo (Desire under the Elms). EUA, 1958, 111 min. Drama. Dirigido por Delbert Mann. Distribuição: Paramount Pictures

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Cine Lançamento

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A grande virada

O executivo Bobby Walker (Ben Affleck) tem a vida feita: usufrui de um notável emprego, mora em uma casa formidável e tem por perto uma família que o ama. Do dia para a noite, devido à política de redução de funcionários da empresa, é demitido sem mais nem menos. Assim como Bobby, os colegas de trabalho Phil Woodward (Chris Cooper) e Gene McClary (Tommy Lee Jones) enfrentam a mesma situação. Agora desempregados, os três, todos pais de família, terão a dura tarefa de realinhar suas vidas.

Com a crise sem precedentes que mergulhou os EUA num lamaçal há dois anos, uma série de cineastas tratou o tema com eloqüência. Muitos deles levantaram uma velha questão discutida por cientistas sociais, sobre a instabilidade econômica que um dia implodiria a maior nação do mundo. Um destes bons trabalhos é “A grande virada” (que, apesar do sofrível título em português, dá a dimensão exata do que os personagens se propõem a fazer). O drama, sem ser piegas ou amargo, expõe as mazelas desse triste problema que afetou todas as faces do planeta. Explora com formas minimalistas a vida de três homens de negócio, que tinham tudo na vida, e de repente, após uma downsizing (redução de pessoal), vêem-se perdidos, quase à beira da loucura. Um adota falsas aparências, fingindo para os vizinhos que continua no bom emprego, pois sai de casa bem arrumado e de maleta, com destino a lugar nenhum; o outro, não abre o jogo para a família e usa as economias como se fosse o salário do mês. E o último dos três, sem saída, entra em crise emocional. Até que resolvem dar a tal guinada ao organizarem uma espécie de cooperativa ligada à carpintaria, ou seja, viram donos do próprio negócio, braçal e que exige esforço físico para serrar madeira, levantar troncos de árvore etc.
Três histórias de vidas de cidadãos que deram, anos a fio, a alma pela empresa onde trabalhavam e agora precisam usar todas as armas para se manterem vivos depois de serem engolidos (e regurgitados) pelo capitalismo selvagem.
Um roteiro preciso e bem sério, auxiliado pelo elenco masculino em perfeita simbiose, dentre eles Ben Affleck, Tommy Lee Jones, Chris Cooper e ainda Kevin Costner (com aparição modesta, porém marcante).
O ambíguo título original, “The company men”, alude tanto à companhia de trabalho criada pelos ex-colegas como ao antigo emprego na megacorporação.
É o primeiro trabalho do cineasta John Wells, mais conhecido por ser produtor de dois seriados de sucesso, “Plantão médico” e “The west wing”. Não deixe de conferir. Por Felipe Brida

A grande virada (The company men). EUA/Inglaterra, 2010, 104 min. Drama. Dirigido por John Wells. Distribuição: California Filmes

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Cine Lançamento

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Poucas cinzas – Salvador Dalí

Madrid, 1922. Três jovens intelectuais, questionadores e de espírito libertário, criam fortes laços de amizade. São eles Salvador Dalí (Robert Pattinson), Federico García Lorca (Javier Beltrán) e Luís Buñuel (Matthew McNulty), que marcariam seus nomes para sempre como ícones da Literatura, das artes plásticas e do cinema, respectivamente.

Inédito em diversos países, chega diretamente em home video no Brasil uma curiosa fita de arte européia, independente, de investimento injetado por pequenas emissoras de TV, sobre a juventude do pintor surrealista Salvador Dalí e sua relação amorosa com o dramaturgo García Lorca, fato então ocultado pelo artista plástico por dezenas de décadas. Produzido em 2008 na Inglaterra e na Espanha, “Poucas cinzas” (nome de uma das primeiras obras de Dalí, que aparece no início do filme) reconstitui a vida íntima do artista espanhol de traços bizarros (o próprio aspecto físico dele vinha com embrulho excêntrico: olhos arregalados, magérrimo, branco igual cera e com o famoso bigode fino formando um caracol nas pontas). Traz à tona seus primeiros contatos com a arte (influenciado pelo Cubismo), os laços com intelectuais da época, as bebedeiras infernais com o amigo Lorca e a aproximação com o jovem cineasta Luís Buñuel. Com o Manifesto Surrealista em 1924, formalizou parceria com Buñuel no cinema – são deles os curtas “O cão andaluz” (título em homenagem a Lorca) e “A idade do Ouro”, pioneiros pelos recursos de vanguarda tanto no tratamento do roteiro quanto na técnica de cortes – a cena do olho cortado com uma navalha ficou célebre, sequência inicial de “Andaluz”.
“Poucas cinzas”, analogia dos restos que sobram dos artistas, margeia mais a estreita relação entre Dalí e Lorca, sem se aprofundar na trajetória do pintor. O pano de fundo remete a um período de intensa transformação cultura, política e social, em que a Psicanálise revirava a sociedade e as correntes de vanguarda européia disseminavam novos ares; sem contar a Guerra Civil Espanhola que exprimia os primeiros sinais de violência nos anos 20, culminando com atrocidades e assassinatos a mando do general Francisco Franco – Lorca foi um dos fuzilados, em 1936, aos 37 anos de idade.
O drama saiu um ano antes de Robert Pattinson se tornar queridinho das meninas com a saga “Crepúsculo” (o que não deu a ele muitos rumos fora da cinessérie, talvez pela horrenda composição vampiresca sem textura, sem sabor, passível de tudo). Mas como Dalí o ator não compromete, numa interpretação digna e por vezes humana – outro do elenco que está bem é o ator espanhol Javier Beltrán, na pele de Lorca (cujo rosto é bem semelhante ao do dramaturgo).
Uma boa biografia, que deve ser descoberta, em especial para quem curte artes, dirigida por um prestigiado cineasta londrino, que veio da TV e teve um de seus poucos longas indicado ao Oscar de filme estrangeiro - “Solomon e Gaenor” (1999). Por Felipe Brida

Poucas cinzas – Salvador Dalí (Little ashes). Inglaterra/Espanha, 2008, 112 min. Drama. Dirigido por Paul Morrison. Distribuição: Warner Bros.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Viva Nostalgia!

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Começou em Nápoles

O advogado norte-americano Michael Hamilton (Clark Gable) viaja à Nápoles para buscar a única herança deixada pelo seu falecido irmão: o sobrinho, um garoto arteiro e muito sociável. De passagem pela cidade italiana, conhece Lucia Curcio (Sophia Loren), a tia adotiva do menino, que não concorda em deixar o advogado levá-lo embora para a América. Surge então um inesperado envolvimento amoroso entre Michael e Lucia, mudando para sempre os planos daqueles dois.

Nostálgica comédia romântica lançada agora em DVD na coleção ‘Clássicos’ pela Paramount Pictures. No Brasil obteve pouca repercussão esse filme de 1960, que reúne dois notáveis nomes do cinema interpretando o par central, que se vê numa enrascada amorosa na cidade de Nápoles – o antigo galã com cara de cowboy Clark Gable e a belíssima musa italiana Sophia Loren.
Foi o penúltimo trabalho de Gable, que meses depois faria “Os desajustados”, com Marylin Monroe e Montgomery Clift (o ator morreu no ano seguinte aos 59 anos, de problemas coronários). Ele interpreta um advogado de idade em viagem a Nápoles para buscar o sobrinho pequeno, filho do irmão que acabara de morrer. Seriam poucos dias fora, porém os planos se alteram quando se apaixona pela tia “postiça” da criança. Sophia, sempre divertida, cai nas graças daquele homem, e ambos iniciam um romance. Aqui a atriz canta, dança, esbanja o típico charme de suas famosas curvas italianas.
Como resultado, uma fita simpática, leve, toda gravada em locações típicas de Nápoles, seus pontos turísticos, ruas e bares elegantes. O famigerado diretor Vittorio de Sica, ator esporádico, participa como coadjuvante, na pele do advogado que acompanha o personagem de Gable.
Indicado ao Oscar de direção de arte e aos Globos de Ouro de atriz (Sophia) e filme de comédia, “Começou em Nápoles” foi dirigido por Melville Shavelson, o mesmo de “Tentação morena” (com Sophia também), “Os seus, os meus e os nossos” e “A lágrima que faltou”. Por Felipe Brida

Começou em Nápoles (It started in Naples). EUA, 1960, 100 min. Comédia romântica. Dirigido por Melville Shavelson. Distribuição: Paramount Pictures

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Viva Nostalgia!

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O intendente Sansho

No Japão feudal, com o exílio do marido, um governador influente, a esposa e os filhos acabam separados por um grupo a mando do chefe de estado. Os três partem para uma exaustiva jornada ao interior de uma selva. No caminho mercadores de escravos seqüestram as crianças e as vendem. A esposa vai arrastada para uma prisão na floresta, e os filhos são submetidos ao trabalho forçado, crescendo em um ambiente de opressão. Dez anos depois, já crescidos, os garotos recebem a notícia de que uma mulher solitária vive em uma ilha clamando pela volta das suas duas crianças perdidas. Eles entendem o recado e fogem do local em busca da suposta mãe.

A distribuidora maranhense Lume Filmes descobriu esse notório drama amargo sobre opressão e separação familiar, super desconhecido no Brasil – e no restante do Ocidente. Dirigido por um dos mestres do cinema japonês, o falecido Kenji Mizoguchi (morreu de leucemia em 1956 aos 58 anos), que foi contemporâneo de Akira Kurosawa e Yasujiro Ozu, “O intendente Sansho” venceu o Leão de Prata em Cannes e ainda recebeu indicação ao Leão de Ouro, na edição de 1954.
A trágica história de duas crianças raptadas da mãe por mercadores de escravos ganha poesia e amargo lirismo nesse conto moralista baseado em um romance perdido de Ogai Mori, que por sua vez recorreu a ensinamentos do sábio chinês Confúcio. O diretor explora com perfeição o sistema medieval do Japão com foco na escravidão, tanto infantil quanto adulta, com aliados mágicos: a belíssima fotografia PB, as locações em selvas e praias do país, o exato figurino da época.
Na segunda metade do filme, com os filhos crescidos em meio à escravidão, o entristecido canto da mãe, efeito alegórico ao canto das sereias, transforma o enredo e revela minuto a minuto futuras surpresas. O próprio roteirista Yoshikata Yoda declarava que a obra era pessimista e amarga, e que Mizoguchi tinha dificuldades em rodar determinadas cenas, por serem tristes, como a do afogamento como sacrifício e o curioso retorno à casa de praia, no desfecho. Ambas uma aula de cinema, sequências das mais belas já produzidas pelo cinema.
No Brasil a carreira de Mizoguchi passou despercebida. É dele os conhecidos “Utamaro e suas cinco esposas” (1946) e “Contos da Lua Vaga” (1953), além de outras 90 produções em que explora o folclore japonês, dramas familiares existencialistas, opressão, sofrimento e abuso de poder. Obrigatório para fãs. Por Felipe Brida

O intendente Sansho (Sanshô dayû/ Sansho the bailiff). Japão, 1954, 123 min. Drama. Dirigido por Kenji Mizoguchi. Distribuição: Lume Filmes

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Cine Lançamento

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Um novo despertar

Casado e pai de dois filhos, o executivo Walter Black (Mel Gibson) tem um emprego estável e salário digno. Com o passar dos dias, Meredith (Jodie Foster), a esposa, suspeita dos estranhos comportamentos do marido, que tem oscilações de humor demonstrando clara tendência ao suicídio. Até que Black encontra, por acaso, abandonado no lixo do vizinho, o fantoche de um castor, boneco de pelúcia que promete ser a grande salvação de sua vida.

Chega nas locadoras um bom filme independente dirigido pela ótima atriz Jodie Foster, que assinou apenas dois trabalhos como cineasta, “Mentes que brilham” (1991) e “Feriados em família” (1995). Jodie e Mel Gibson estrelam essa história com tom bizarro, sobre um pai de família descontente que adota um castor de pelúcia (Beaver, em inglês, como no título) como guia espiritual. O boneco na verdade é um fantoche de mão, que se torna o fiel conselheiro (e de pulso firme) desse cidadão que precisa urgentemente organizar a vida pessoal, consertar falhas, antes que cometa suicídio, já tentado antes. O animal inanimado cria vida quando passa a ser manipulado pelo executivo em todos os lugares que vai e, assim, vira da noite para o dia o alter-ego desse sujeito descontente. Black dorme com o animal, faz sexo na presença dele, almoçam e tomam banhos juntos. A família o considera louco, os amigos o rejeitam, e cada vez mais ele fica desamparado, na tentativa de entender os reais motivos da angústia que sofre. E aos poucos o mundo dá sinal de querer dar voltas.
A fita explora esse atenuante quê de existencialismo do personagem central, vivido pelo premiado ator e diretor Mel Gibson. Os comentários do castor são extensões do pensamento daquele homem, formulados por este. Em um trecho o executivo faz o resumo da ópera quando descreve que está sob cuidados do boneco para criar uma distância psicológica entre si mesmo e aspectos negativos da sua personalidade. E assim poder mudar o necessário.
Infelizmente fracassou nas bilheterias americanas e mal ficou conhecido no Brasil. A razão: na época do lançamento Gibson envolveu-se em confusões familiares, agrediu a ex-mulher e ameaçou os filhos. O fato caiu na mídia, que divulgou amplamente o caso desse popular ator. Os norte-americanos, em represália, rejeitaram as atitudes desequilibradas do quase veterano Gibson. Mas isto tudo serve apenas como curiosidade para explicar o irreversível naufrágio do filme nas salas de cinema (custou U$ 21 milhões e rendeu 20 vezes menos!).
Se analisarmos, esse trabalho autoral de Jodie reflete a vida de Gibson, que, incrivelmente, está em um momento particular, num de seus melhores papéis dramáticos recentes.
Exibido em Cannes, foi todo rodado no Bronx, em NY, e traz ainda no elenco a competente Jodie (na pele da esposa em dúvida com o casamento) e o jovem ator Anton Yelchin (o filho mais velho). Uma interessante obra autoral que deve ser descoberta. Por Felipe Brida

Um novo despertar (The beaver). EUA/Emirados Árabes, 2011, 91 min. Drama. Dirigido por Jodie Foster. Distribuição: Paris Filmes

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Viva Nostalgia!

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Warriors – Os selvagens da noite

Durante uma grande convenção nas ruas de Nova York, a gangue dos Warriors é acusada injustamente de assassinar a tiros um líder negro que pretendia unificar as diferentes tribos urbanas de Coney Island. Os integrantes, ameaçados de morte, fogem e passam a ser caçados em todos os cantos da cidade. A ardilosa escapada será repleta de confusão e violência, ainda mais quando o cabeça dos Warriors, Swan (Michael Beck), apaixona-se por uma garota pertencente a uma das perigosas gangues rivais.

Apesar do fracasso nos cinemas em 1979, virou cult essa fita de ação sobre gangues de ruas lançada em pleno auge da agressividade estilística do Movimento Punk, com seus adeptos que perambulavam em turma pela noite, vestiam roupas escuras, subvertiam a moda e a cultura, formando as tribos urbanas que compartilhavam mesma ideologia.
O cineasta Walter Hill, em início de carreira, preferiu um tom mais ágil, pesado e, claro, violento para formar o panorama de um grupo de jovens nova-iorquinos acusados de um crime não-cometido (mostrado no início do filme) durante uma unificação pacífica de diversas gangues, como punks, skinheads etc. Eles integram o pequeno Warriors e, para se safarem, partem para uma fuga alucinada, pois são perseguidos a torto e a direita. Cortam metrôs, enfrentam policiais, caem em armadilhas de grupos opostos, alguns morrem no meio do caminho.
Um bom retrato sobre a delinqüência juvenil sustentada pela cultura underground. Todo gravado em Nova York, reúne cenas memoráveis feitas nas locações em Coney Island, no Brooklin, como os confrontos físicos no Luna Park, o famoso parque de diversão nos calçadões. Há uma analogia, na introdução, ao assassinato de Martin Luther King, ocorrido dez anos antes do filme – o discurso do personagem que morre tem fundamentos bem semelhantes ao do notório líder negro. Apenas o final cai no previsível e é bastante moral – para que se chegasse à justiça incutiram a violência como punição.
Quase todo o elenco de “Warriors” não teve carreira promissora. O protagonista, interpretado por Michael Beck, fez apenas filmes menores (indicado inclusive a dois Framboesas de Ouro, por “Xanadu” e “O esquadrão do terror”, nos anos 80) e James Remar foi aproveitado em fitas policiais como ponta e coadjuvante (atualmente mais lembrado por fazer as últimas temporadas da série “Dexter”). Cinco anos depois Walter Hill dirigiria outra fita sobre gangues de rua, inferior, em ritmo de videoclipe e tom musical, “Ruas de fogo”, exibida na TV com grande sucesso.
Relançado em DVD na coleção Clássicos da Paramount. Por Felipe Brida

Warriors – Os selvagens da noite (The Warriors). EUA, 1979, 92 min. Ação. Dirigido por Walter Hill. Distribuição: Paramount Pictures

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

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Dúvida

Em 1964, em uma escola católica do Bronx, a conservadora freira Aloysius Beauvier (Meryl Streep) passa a desconfiar das atitudes do recém-chegado padre Brendan Flynn (Phillip Seymour Hoffman), professor carismático e atencioso com os alunos. Por meio de fofocas, ela acredita piamente que o pároco esteja abusando de um estudante negro de 12 anos dentro do colégio. Com o auxílio da Irmã James (Amy Adams), Aloysius irá investigar por conta própria a situação.

Baseado na aclamada peça de John Patrick Shanley vencedora do Pullitzer, escrita em 2004, esta “ganhou” a crítica, que a apontou como um dos melhores textos dramatúrgicos da década passada. Quatro anos mais tarde, o próprio Shanley adaptou seu trabalho literário como roteiro para cinema e resolveu dirigir com todos os pormenores, recorrendo à Disney para produzir o filme e lançá-lo nos cinemas. É a melhor obra do cineasta, que só havia dirigido o fraco “Joe contra o vulcão” (1990) e havia se dado melhor como roteirista – é dele o drama “Vivos” (1990) e a premiada comédia “Feitiço da lua” (1987).
“Dúvida” é, para mim, uma fita marcante, digna dos créditos iniciais ao letreiro do desfecho, de roteiro consistente, que denuncia e critica sem pudor o sistema conservador da igreja (não a religião católica, e sim a instituição nos Estados Unidos, que é arcaica).
Com texto forte, o drama mexe com polêmicas atuais (a pedofilia cometida por padres) apontando a espada para o sistema tradicional de ensino em escolas religiosas. E o grande lance está no duro embate entre a freira (Meryl Streep, sempre de preto, num papel estonteante, que caminha entre o lado bom e maldoso do ser humano) e o padre acusado de abusar de um menino (Hoffman, igualmente genuíno e sincero). As discussões acaloradas de ambos, com certeza, são o ponto alto desse ótimo filme, indicado a cinco Oscar – melhor atriz (Streep), ator coadjuvante (Hoffman), atrizes coadjuvantes (Amy Adams, sempre perfeita, e Viola Davis) e roteiro adaptado. Concorreu ainda a Globos de Ouro e diversos Bafta. Vale destacar que Viola aparece poucos minutos como a mãe do garoto supostamente abusado, num show de interpretação (em que solta revelações aterrorizadoras).
Os conflitos todos surgem por causa de um boato, e justamente o filme discorre sobre o poder da fofoca em destruir a reputação de pessoas (tem até uma ótima analogia da maledicência, dita pelo padre, com penas soltas ao vento).
Uma obra cinematográfica obrigatória, com final instigante e ambíguo, cheio de referências e baseado em histórias reais vividas pelo autor quando estudou em escola do Bronx mantida pelas Irmãs de Caridade de Saint Anthony. Por Felipe Brida

Dúvida (Doubt). EUA, 2008, 104 min. Drama. Dirigido por John Patrick Shanley. Distribuição: Walt Disney

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Cine Lançamento

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Arthur – O milionário irresistível

O milionário Arthur Bach (Russell Brand) usa e abusa de sua fortuna ilimitada, como um bon vivant. Na mansão onde vive, tem como fiel companheira a babá de longa data, Sra. Hobson (Helen Mirren), que o mantém longe de problemas. Já com mais de 30 anos, Arthur precisa enfrentar com responsabilidade um enorme desafio: casar-se. Para isso terá de escolher entre a ambiciosa executiva Susan (Jennifer Garner), cuja proposta de casamento é arranjada, e o grande amor de sua vida, Naomi (Greta Gerwig), sendo que o futuro com esta é incerto.

Descartável refilmagem da comédia “Arthur – O milionário sedutor” (1981), que fez muito sucesso no Brasil. O original não é assim tão velho, que exija remake, até mesmo porque era bom, com elenco em forma (o falecido Dudley Moore foi indicado ao Oscar de ator e Liza Minnelli interpretava a paixão de sua vida) e trazia a famosa canção-tema do personagem, “Best that you can do”, escrita por Burt Bacharach e cantada por Cristopher Cross, ganhadora do prêmio da Academia. Inclusive inseriram aqui, em tom incidental, trechos da música.
Nessa reinvenção de Arthur, os produtores erraram ao mudar o perfil de Arthur. Ele não é mais beberrão, não faz as típicas piadinhas de mau gosto nem cria situações embaraçosas. Agora ele é mais jovem, com jeito de criança mimada. O ator, Russell Brand, não ajuda em nada com a falta de carisma e excesso de caretas. Outra mudança está na substituição do mordomo conselheiro do original, que era interpretado por Sir John Gielgud, um dos grandes atores do cinema, de origem inglesa, que ganhou um merecido Oscar pelo papel em 1982, aos 78 anos! Botaram agora uma babá que sempre cuidou de Arthur, desde pequeno, para ser a escudeira dele – Helen Mirren está desperdiçada, nem um pouco à vontade na pele dessa governanta moderna.
A história sobre um milionário que tem tudo, menos amor, de um homem sozinho dividido entre duas mulheres super distintas, não convence principalmente pelo ator principal ser insosso e a direção pecar por não recorrer ao tom de romance, e ficar numa farsa contemporânea mal desenvolvida. Quem dirige esse fraco filme, que obteve baixa bilheteria nos cinemas, é Jason Winer, que tem no currículo apenas algumas séries de TV.
A comédia original, além de levar o Oscar de ator coadjuvante e o de canção, recebeu duas outras indicações – a de melhor ator, já mencionado, e roteiro original. Sete anos mais tarde fizeram a continuação inferior “Arthur – O milionário arruinado”, que por pouco não garantiu inúmeras Framboesas de Ouro que concorria.
Um equívoco. Procure o original, disponível em DVD pela Warner. Por Felipe Brida

Arthur – O milionário irresistível (Arthur). EUA, 2011, 110 min. Comédia. Dirigido por Jason Winer. Distribuição: Warner Bros.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Viva Nostalgia!

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Ensina-me a viver

Jovem rico e fissurado pela morte, Harold (Bud Cort) muda completamente de vida quando inicia uma terna amizade com a setuagenária Maude (Ruth Gordon), uma senhora de espírito livre e radical.

Um exemplar Cult movie moderno com roteiro escrito pelo brilhante Colin Higgins, publicado como novela no final dos anos 60. O filme ficou notório também no Brasil, onde se transformou em peça teatral com Glória Menezes no papel de Maude, encenada diversas ocasiões em São Paulo e no Rio.
Esse digno trabalho talvez não teria obtido sucesso se não fosse pela trilha tocante de Cat Stevens, inteiramente composta por ele – na abertura ouve-se “Don’t be shy” e ao longo do filme a alegre “If you want to sing out, sing out”. Stevens, só para constar, converteu-se ao Islã em 1977 e mudou o nome para Yusuf Islam no ano seguinte, atuando hoje como músico em Dubai e Londres.
Se analisarmos bem a essência dessa comédia de humor negro, ela soa excêntrica, por vezes bizarra ao propor um romance improvável entre um menino suicida e uma idosa que leva uma vida como se tivesse cinqüenta anos a menos. Tudo é sugerido, não existe namoro nem relações mais intimas. É mais uma necessidade de companhia que o garoto entende como o primeiro amor.
A veterana Ruth Gordon, ganhadora do Oscar de coadjuvante pelo papel da sinistra bruxa em “O bebê de Rosemary” em 1969, interpreta a elétrica vovozinha idealizada, que dirige em alta velocidade e supostamente sobreviveu ao Holocausto (pelas inscrições que tem no corpo). Foi indicada ao Globo de Ouro juntamente com o rapaz Bud Cort, respectivamente com 75 e 23 anos de idade. E Bud, que começou no cinema jovem, atualmente trabalha em TV, em seriados. É ela quem cria a marcante figura do garoto rico que passa o dia trancafiado em casa planejando suicídios. Frequenta funerais de estranhos e é forçado a ir ao psiquiatra após “morrer” oito vezes (enforcado, degolado, com tiro e até recorrendo à técnica samurai de Seppuku).
Um bonito trabalho sobre existencialismo, amizade de mundos diferentes e mudança de comportamento, realizado pelo falecido mestre do cinema Hal Ashby, o mesmo dos premiados filmes do Oscar “Muito além do jardim”, “Amargo regresso”, “Shampoo” e “Esta terra é minha”.
Lançado agora pela primeira vez em dvd no Brasil, pela Paramount, com extras. Não perca! Por Felipe Brida

Ensina-me a viver (Harold and Maude). EUA, 1971, 91 min. Comédia romântica. Dirigido por Hal Ashby. Distribuição: Paramount Pictures

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Resenha

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Gran Torino

Veterano da Guerra da Coréia, Walt Kowalski (Clint Eastwood) é um homem preconceituoso e bastante arrogante. Após a morte da esposa, passa a viver sozinho em um bairro de imigrantes hmong (grupo étnico de Laos e Cambodja), os quais ele despreza. Porém seu dia-a-dia muda radicalmente quando impede a temível gangue local de roubar seu precioso carro, um Gran Torino.

“Gran Torino” obteve muita popularidade dentro e fora dos Estados Unidos, dirigido e interpretado por um dos monstros sagrados do cinema, Clint Eastwood, que retoma o perfil do personagem durão que o consagrou na cinessérie Dirty Harry nos anos 70 – a de um homem antipático por natureza, brigão, duro na queda. Na pele de Kowalski, um senhor de poucas palavras, este vira o herói do bairro onde mora já que, num ato rápido, consegue pôr em cheque a ação de uma gangue hmong que perturba o sossego do lugar, tomando conta das ruas da cidade. É o ponto de partida de uma história dramática (a vida do personagem viúvo e sem amigos) que tem clima de ação (o mesmo personagem furioso, armado, que protege o lar e aos poucos se prepara para uma guerra na vizinhança).
É um bom Eastwood em fase de renovação. Tem um roteiro frio, sem sutilezas, que trata o tema do preconceito racial sem cair em absurdos de patriotismo.
O filme fez notável carreira – custou U$ 33 milhões e arrecadou quase cinco vezes mais nos cinemas em dezembro de 2008, recebeu indicação ao Globo de Ouro de melhor canção original (“Gran Torino”, cantada por Clint nos créditos finais) e, vai entender a injustiça, não entrou para os finalistas do Oscar. Ainda participou de festivais independentes e europeus, como o César e o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro.
Por ser um projeto pessoal do velho Clint, com marca autoral nítida, merece ser prestigiado. Por Felipe Brida

Gran Torino (Idem). EUA/Alemanha, 2008, 116 min. Drama. Dirigido por Clint Eastwood. Distribuição: Warner Bros.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Cine Lançamento

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Hanna

Hanna (Saoirse Ronan) é uma garota de 16 anos treinada pelo pai, Erik (Eric Bana), para ser uma assassina profissional. A jovem vive com ele em uma gélida floresta da Finlândia. Certo dia os dois passam a ser alvo de uma organização governamental e têm de fugir para não serem mortos. Pai e filha tomam caminhos opostos. Hanna, por sua vez, refugia-se na Alemanha, mas logo é descoberta e fica sob a mira desse grupo, liderado pela agente especial Marissa (Cate Blanchett). Diante da morte que se aproxima, a garota usará as artimanhas de luta para sobreviver em meio a uma caçada sem trégua.

Quem me conhece sabe o quanto sou fã do diretor Joe Wright – do comovente “Desejo e reparação”, do poético “O solista” e do mediano filme de época “Orgulho e preconceito”. Seu novo trabalho, “Hanna”, um autêntico exercício de estilo, confirma a importância desse cineasta para o mundo da sétima arte. “Hanna” é incrível, com notável qualidade técnica, acabamento e elenco. Uma fita que custou quase U$ 30 milhões e rendeu U$ 57 milhões, ou seja, bilheteria razoável. Aqui no Brasil, por exemplo, assim como em muitos países, mal passou nos cinemas e ficou desconhecido do público. Agora em DVD fica fácil conferir o novo Joe Wright.
Primeiramente o filme é de ação, com edição frenética e trilha sonora furiosa. Cortes rápidos, som fumegante, tudo ágil para incorporar o espírito da personagem-título, a garota treinada para matar. Hanna passa o tempo todo correndo (Corra, Hanna, Corra!), perseguida por agentes especiais que querem sua cabeça a todo custo.
A cena de abertura mostra a jovem sozinha em uma paisagem gélida e inóspita, na Finlânida, caçando um animal com flecha (uma das armas que utiliza ao longo do filme). A seqüência, muito bem feita, deixa vestígios do instinto matador da menina, ensinada pelo pai a se defender com verdadeiras estratégias de movimentos de mãos. Separada do seu mestre à força, cada um foge para um canto, e ela passa a ser perseguida por uma organização governamental liderada por uma agente inescrupulosa (a vilã da história, feita com maestria pela sempre notória Cate Blanchett). E aos poucos o público monta as peças do quebra-cabeça em torno da caçada, os motivos etc
Os enquadramentos da fita carregam curiosa fluência, o roteiro intriga, a fotografia fascina (como a do início e a do desfecho). Uma beleza visual em muitos aspectos que requer atenção especial. Prepare-se: o filme nos deixa atônitos, e até agora é um dos melhores do ano.
O diretor Wright volta a trabalhar com empolgação sistemática com a atriz que havia revelado em “Desejo e reparação” – na época mirim, com 13 anos, Saoirse Ronan recebeu indicação ao Oscar de coadjuvante (interpretação espetacular como a garota que causa uma intriga violenta na vida do namorado da irmã, acusando-o de um crime que não cometera). Hoje ela está com 17 anos, sendo uma das melhores atrizes do momento. Por Felipe Brida

Hanna (Idem). EUA/Inglaterra/Alemanha, 2011, 111 min. Ação. Dirigido por Joe Wright. Distribuição: Sony Pictures