Festival de Cinema Italiano
no Brasil segue gratuito até 29/11
A 20ª edição do Festival
de Cinema Italiano no Brasil, que teve início em 28 de outubro, segue até hoje,
dia 29/11. Gratuito e online, com itinerância também em 90 cidades brasileiras
com sessões presenciais, a programação conta com 24 longas-metragens, inéditos
e clássicos restaurados. Para assisti-los basta acessar o site do festival e
dar play no título, em https://festivalcinemaitaliano.com.
Criado em 2005 por Nico
Rossini e Erica Bernardini, o festival é um projeto organizado pela Câmara de
Comércio Italiana de São Paulo – Italcam, em colaboração com a Embaixada da
Itália e com o Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet. Conta com
patrocínio da Pirelli, da Persol e do Istituto Italiano di Cultura di San Polo.
A cada edição, o festival apresenta uma seleção de longas inéditos e filmes que
integram retrospectivas do cinema italiano em cópias restauradas. A iniciativa fortalece
os laços culturais e afetivos entre Brasil e Itália, trazendo de forma gratuita
ao público uma série de filmes, democratizando o acesso ao cinema.
Dentre as produções
inéditas no Brasil estão os dramas de época ‘A ilusão’ (2025), de Roberto Andò,
‘Napoli – Nova York’ (2024), de Gabriele Salvatores, e ‘As provadoras de
Hitler’ (2025), de Silvio Soldini, e os dramas ‘Diamantes’ (2024), de Ferzan
Özpetek, ‘Hey Joe’ (2024), de Claudio Giovannesi, e ‘Irmãos’ (2025), de Greta
Scarano. Na lista dos clássicos estão ‘Ladrões de bicicleta’ (1948), de
Vittorio de Sica, ‘Antes da revolução’ (1964), de Bernardo Bertolucci,
‘Henrique IV’ (1984), de Marco Bellocchio, ‘Tomara que seja mulher’ (1986), de
Mario Monicelli, e ‘O jantar’ (1998), de Ettore Scola.
Confira abaixo alguns
títulos conferidos e recomendados.
Hey, Joe
(2024, de Claudio
Giovannesi)
Descendente de
italianos, portugueses, russos e suecos, James Franco, que fala bem italiano,
viajou para a Itália para rodar este projeto que se encontra num lugar especial
na nova fase da carreira do ator, que completou 47 anos. Ele interpreta um
ex-combatente da Segunda Guerra Mundial, que lutou bem jovem no front em 1944. Transcorridos
25 anos, atualmente reside em New Jersey, Estados Unidos. Uma carta o leva de
volta para Nápoles, para reencontrar um filho perdido, que teve com uma
moradora de lá quando era soldado. Ele desembarca numa nova cidade e descobre
que o rapaz está no mundo do crime trabalhando com um chefão da máfia. Pai e
filho tentam uma conexão, por mais duro que seja. Franco envelheceu, aqui é um
pai solitário, com quase 50 anos, que no início da década de 70 retorna para
uma terra que o marcou duramente, quando lutou na guerra. Ele embarca numa
jornada por lembranças da juventude e redescobertas de um lugar longínquo onde
lá vive um filho que mal sabia da existência. É um filme de visual setentista, com
flashbacks rápidos, e uma história melancólica de reconexão familiar, longe de
ter final feliz. Escrito e dirigido por Claudio Giovannesi, diretor de ‘Fiore’
(2016), foi exibido no Festival de Roma e indicado ao David di Donatello de
melhor fotografia. Está me cartaz no Festival de Cinema Italiano no Brasil e
conta com distribuição da Pandora Filmes, que levará o longa para as salas de
cinema em 2026.
A ilusão
(2025, de Roberto Andò)
Drama histórico exibido
no Festival de Rotterdam, escrito e dirigido pelo diretor Roberto Andó, um
veterano cineasta que faz obras de ar ao mesmo tempo cult e moderno. Novamente
trabalha com o nome mais importante da Itália do momento, premiado este ano em
Veneza, Toni Servillo – eles fizeram juntos pelo menos três longas que gosto
muito, ‘Viva a liberdade’ (2013), ‘As confissões’ (2016) e ‘A estranha comédia
da vida’ (2022). Nesta intrigante história real ocorrida nos anos finais do
Risorgimento, a Unificação Italiana, Servillo interpreta o coronel siciliano Vincenzo
Orsini, que liderou tropas para enfrentar o exército Bourbon, na campanha de 1860,
de Giuseppe Garibaldi (papel aqui de Tommaso Ragno). Orsini e Garibaldi criam a
Expedição dos Mil, na tentativa de conquistar Palermo; para tanto, organizam um
mirabolante plano, de simular a retirada dos soldados para enganar os inimigos.
Um filme de estratégias militares, que lembra uma partida de xadrez, onde cada
movimento é decisivo. Apesar de poucos recursos, Andó realizou um filme diferenciado,
de uma história esquecida e que se tornou emblemática para a Unificação da
Itália na metade do século XIX. Bom figurino de época e diálogos auspiciosos impulsionam
a trama de disputa de território e heroísmo.
Roberto Rosselini –
Mais que uma vida
(2025, de Ilaria de
Laurentiis, Raffaele Brunetti e Andrea Paolo Massara)
Documentário inédito, realizado
neste ano, sobre um dos maiores diretores da Itália de todos os tempos, Roberto
Rosselini, que infelizmente caiu no ostracismo e se tornou uma figura amarga e
complexada. O filme tem um recorte específico da carreira dele, de 1956 a 1977,
período de uma profunda crise pessoal e profissional, quando abandonou o
cinema, desiludido, e separou-se da esposa, a atriz Ingrid Bergman, com quem
fez filmes importantes e teve uma filha, a também atriz Isabella Rosselini. Neste
período mudou-se para a Índia, onde se casou novamente e trabalhou com cinema e
publicidade para o primeiro-ministro Nehru. É nesta fase que o filme é
recriado, com inúmeras entrevistas de Rosselini afirmando que não queria mais ouvir
falar em cinema nem realizar longas ficcionais, pelo menos do molde como sempre
fez – aqueles do Neorrealismo Italiano, movimento do qual foi mentor número 1.
Inclusive em várias passagens do doc ele diz que não se interessa mais pelos
filmes que fez, que não os assistia e que aquilo ficou restrito a um passado
distante. O filme é baseado em escritos que Rosselini deixou, narrados em
primeira pessoa pelo ator Sergio Castellitto. Só com imagens pessoais, fotos e entrevistas
antigas, e pontos de vista de amigos cineastas, como Truffaut, é um doc
revelador. Rosselini realizou obras-primas emblemáticas do movimento neorrealista
nos anos 40, como ‘Roma, cidade aberta’ e ‘Pais à’. Engajado na política, aos poucos viu o fracasso de
público de seus longas, foi mal interpretado por parte da crítica e dos
cineastas e colocado de lado por produtores, tendo de financiar os próprios
trabalhos. Morreu em 1977 – ano final do recorte do documentário, que mostra
cenas do funeral do cineasta. Deixou um legado impressionante de obras sociais que
ajudariam a entender a Itália do pós-guerra, e com o passar das décadas foi
sendo redescoberto. Surpreendi-me com o filme, e vi que não há nada sobre ele
na internet, nem no IMDB. A Pandora Filmes está por trás do lançamento, que
deve levá-lo para as salas em 2026.
O assassino
(1961, de Elio Petri)
Na seção de ‘Clássicos
restaurados’ do Festival Italiano no Brasil de 2025 há 12 filmes disponíveis,
vários com Marcello Mastroianni. ‘O assassino’ é um deles, um título forte para
uma obra poética, um thriller policial de alto teor psicológico e narrativa
ousada. É uma obra circunscrita na fase do cinema social do pós-Neorrealismo,
onde surgiram nomes como Pietro Germi, Valerio Zurlini, Francesco Rosi e Elio
Petri, o diretor deste – quase todos eles se dedicaram a um cinema político a
partir da década seguinte, anos 70. O filme acompanha a estranha prisão de Alfredo
Martelli – papel de Mastroianni, um negociante de antiguidades detido de
maneira inesperada e interrogado na delegacia de polícia por um inspetor sagaz
(Salvo Randone). No interrogatório, Martelli recorda de breves momentos de sua
vida, vindo à luz uma série de segredos guardados e memórias perdidas na mente.
Descobre estar ali por ser o principal suspeito do assassinato da amante, uma
mulher rica e mais velha, Adalgisa De Matteis (Micheline Presle). O drama vira
um suspense que pouco a pouco revela a identidade do protagonista, um homem
aparentemente bem resolvido que vai sendo tragado pela investigação policial.
Mastroianni, um estrondo como ator, entrega tudo em uma história vibrante de desconstrução
de personagem, escrita por Petri e pelo roteirista parceiro de Frederico
Fellini, Tonino Guerra. Um filme essencial do período pós-Neorrealismo, que
critica a hipocrisia na sociedade. A cópia está belíssima, restaurada em 2011,
a mesma do DVD lançado no Brasil pela Versátil Home Video.
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