quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Estreias da semana – Nos cinemas


 
A quem eu pertenço
 
Em 2020, a jovem cineasta canadense de origem tunisiana Meryam Joobeur venceu uma dezena de prêmios em festivais ao redor do mundo pelo curta-metragem ‘Ikhwène’ (2018), um sensível drama de guerra falado em árabe cujas locações retratam a terra natal de seus pais. Anos mais tarde, em 2024, realizou o primeiro longa da carreira, ‘A quem eu pertenço’, que acaba de estrear nos cinemas do Brasil pela Pandora Filmes. O drama tunisiano, rodado na capital, Túnis, coprodução França, Canadá, Noruega, Catar e Arábia Saudita, traz para a tela resquícios do filme ‘Ikhwène’ ao explorar relações familiares conturbadas em meio a uma guerra e as redescobertas de identidade e território de uma mãe de meia-idade. Ela é Aicha (Salha Nasraoui), que mora com o marido e um dos filhos em um povoado no norte da Tunísia. Dois outros filhos dela deixaram a cidade para lutar na guerra. Até que um deles, Mehdi (Malek Mechergui), retorna com a esposa grávida para a casa da família. Aicha não compreende a volta inesperada do rapaz, tampouco a mudança de comportamento dele. O retorno de Mehdi – que se parece com a parábola do ‘filho pródigo’, desencadeia conflitos não só naquele núcleo familiar, mas em toda a comunidade. A Tunísia é marcada pela guerra religiosa, o Estado Islâmico atrelado ao jihadismo, que aparece como contexto na sólida trama – o drama sobre maternidade, pertencimento e de busca de identidade vai se fragmentando em uma história pesada de terrorismo e guerra religiosa, com um desfecho violento, de grande impacto sensorial. A paisagem seca e árida do Norte da Tunísia corresponde ao interior dos personagens, marcado por feridas e medo. É uma obra densa e política, com personagens em constante reconstrução, vivendo no caos de um país ameaçado pelo Estado Islâmico, que nos ajuda a repensar a geopolítica do Oriente Médio e os desdobramentos disso na sociedade. O filme esteve na competição do Festival de Berlim de 2024, indicado lá ao Urso de Ouro.
 

 
O que a natureza te conta
 
Indicado ao Urso de Ouro no Festival de Berlim de 2025, o novo filme do constante diretor sul-coreano Hong Sang-soo acaba de estrear nas salas brasileiras pela Pandora Filmes. Houve a primeira exibição do longa no Festival do Rio, em outubro passado, e agora a comédia dramática chega ao circuito. Mas recomendo apenas para quem curte fitas de arte e que esteja acostumado ao cinema minimalista do veterano cineasta – ele também é roteirista e produtor - que costuma rodar de dois a três filmes por ano, muitos deles curtinhos, que não ultrapassam 70 minutos de duração. Sang-soo optou aqui por uma metragem maior, de 108 minutos, onde celebra uma história de encontros e desencontros, como faz com maestria em seu estilo particular – ele roda tudo em poucos ambientes, sem close no rosto dos personagens, que costumam aparecer de lado, com longas conversas na mesa e pequenos conflitos humanos. Um jovem poeta passa alguns dias na companhia da namorada e dos pais dela – o pai, fissurado por carros antigos, e a mãe, uma poetisa que deixou a carreira. Ele está hospedado na charmosa residência dos futuros sogros, onde lá também estão as irmãs da namorada. Aquele grupo familiar conversará por longas tardes e noites assuntos diversos, ao lado de bebidas e fartas comidas. Sang-soo já demonstrou ser um hábil contador de histórias rotineiras que se passam em núcleos familiares e relações entre amigos, e aqui não faz diferente, retornando com um de seus atores preferidos, o veterano Kwon Hae-hyo – eles fizeram juntos cerca de 10 obras, dentre elas ‘A mulher que fugiu’ (2020) e ‘As aventuras de uma francesa na Coreia’ (2024), ambos lançados pela Pandora. É, novamente, uma obra cíclica, em torno de um pequeno grupo de pessoas do nascer ao pôr do sol que se encontram, comem juntas, andam de lá para cá, resolvem conflitos, e no outro dia tudo se repete. Sang-soo é um diretor que aprendi a gostar, aplaudido em festivais, premiadíssimo, que encontrou no Brasil um seleto número de seguidores – muitos dos filmes dele são exibidos na Mostra Internacional de Cinema de SP, onde passei a vê-lo. Agora o filme disponível para ver na tela grande pela Pandora - aliás, a Pandora, em parceria com o ‘Belas Artes a la Carte’, streaming do cinema Belas Artes, acaba de lançar no catálogo outro de Sang-soo, este exibido em Cannes, ‘De frente para você’ (2021 – também com o ator Kwon Hae-hyo). Está disponível para os assinantes da plataforma, e lá no ‘Belas Artes a la Carte’ há disponível vários títulos de Sang-soo, como ‘O dia depois’, ‘A câmera de Claire’, ‘A mulher que fugiu’ e ‘Encontros’ – acesse em http://belasartesalacarte.com.br/



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