quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Resenha Especial


Resenha escrita especialmente para o livreto da edição em 4k e bluray de "O quinto elemento" (1997), lançada pela Obras-primas do Cinema no mês passado. O filme está em uma edição de colecionador com luva numerada, em disco triplo - disco 1 com o filme em 4k (o primeiro 4k brasileiro), disco 2 com o filme em bluray e disco 3 de extras, em DVD. Inclui um livreto de 48 páginas, seis cards colecionáveis e dois pôsteres.


O elemento que falta

Por Felipe Brida*

O que uma descoberta em 1914, no Egito, tem a ver com o futuro da humanidade? Eis a questão central do filme scifi mais divertido e colorido do cinema, “O quinto elemento” (1997), surgido da mente criativa de Luc Besson, que fez sucesso nas salas e impulsionou a carreira de Milla Jovovich. Nas paredes de uma câmara egípcia, um ser humano que ninguém conhece é apontado como um objeto valioso, o tal ‘quinto elemento’, que ao lado dos quatro já sabidos (água, ar, fogo e terra) será a chave de tudo e reconhecido como “um ser supremo portador da luz da criação que levará a paz para os confins da terra”, conforme acredita padre Cornelius, personagem de Ian Holm. Nessa busca pelo ser divino e também por artefatos cósmicos poderosos que somente ele sabe onde está, juntam-se o referido padre, o motorista de taxi voador Korben Dallas (Bruce Willis) e uma garota nascida em laboratório fruto de uma experiência biotecnológica, Leeloo (Milla Jovovich), que fala uma língua estranha. Eles enfrentarão, numa longa corrida contra o tempo, criaturas e guerreiros a mando de um vilão vindo de outra dimensão, Zorg (Gary Oldman).


A fita mais retumbante, barulhenta, maluca e engraçada da carreira do francês Luc Besson recebeu indicação ao Oscar de melhor edição de som (do ganhador do Oscar por “Mad Max: Estrada da fúria”, Mark A. Mangini), além de vencer o Bafta de efeitos visuais e três prêmios César (diretor, fotografia e design de produção) – por outro lado, foi indicado ao Framboesa de Ouro (que brinca com os piores do ano), no caso pior atriz coadjuvante (Milla Jovovich) e pior revelação (Chris Tucker).
Filme de abertura do Festival de Cannes, onde teve a première mundial em 7 de maio de 1997, “O quinto elemento” começou a ser escrito por Besson ainda na adolescência, na metade da década de 70. E reescrito 20 anos depois, em parceria com Robert Mark Kamen, roteirista-criador de “Karate Kid” (1984). Segundo Besson, recorreu a um mundo imaginário original tomado pela tecnologia e por criaturas espaciais, como uma pequena forma de escape da realidade. Utilizou a figura do motorista de taxi para homenagear o pai, que era um taxi driver – e Besson, sempre que pode, coloca em seus filmes um personagem taxista.
Ele não imaginaria o sucesso do filme, que teve custo alto, de U$ 93 milhões, rendendo, de bilheteria mundial, U$ 263 milhões. O longa entrou no ranking das produções mais caras feitas fora de Hollywood (já que o filme é francês, coproduzido entre Estados Unidos e Reino Unido), e o mais custoso da produtora francesa Gaumont.
Besson viu o sucesso nas mãos. Ele, que acumula na carreira as funções de roteirista, produtor e diretor, vinha de uma série de filmes de ação em sua terra natal, de boa repercussão entre a crítica, como “O último combate” (1983 – sua estreia) e “Subway” (1985), até realizar os explosivos “Nikita: Criada para matar” (1990, coprodução França e Itália) e “O profissional” (1994 – coprodução França e Estados Unidos), passando pelo belíssimo e vistoso cult movie “Imensidão azul” (1988). “O quinto elemento” (1997) resgata seu cinema de ação cheio de reviravoltas, tiros, lutas e maluquices, que voltaria a fazer em “Lucy” (2014) e “Valerian e a cidade dos mil planetas” (2017 – que em certos aspectos lembra “O quinto elemento”).


O diretor optou, aqui, em conceber um futuro menos sombrio que o tema exigia, recorrendo ao humor, às cores que saltam aos olhos, a personagens atrapalhados na pele dos alienígenas infiltrados na Terra. O futuro de Besson é a alegoria da disputa por espaços e controle, reinventando a roda do bem contra o mal, num tempo que procura a diversidade, seja ela tecnológica ou social. Há muitos elementos simbólicos na tela, cuja revisão criteriosa auxilia no entendimento das pistas e dos detalhes deixados pelo cineasta.
A ideia de Besson era fazer uma trilogia, mas não vingou, condensando todas as tramas em uma só. Reuniu para seu megafilme um elenco que vai de astros consolidados, como Bruce Willis, Gary Oldman e Ian Holm, a atores em início de carreira, dentre eles Milla Jovovich, Chris Tucker, Lee Evans, Mathieu Kassovitz e Luke Perry, e convites a coadjuvantes de rostos marcantes, como os falecidos Brion James e John Neville. Trouxe ainda a atriz e hoje diretora e roteirista Maïwenn, na época sua noiva, para uma interpretação pra lá de legal, como a alienígena azul que canta ópera, a Diva Plavalaguna, que imortalizou o filme na mente do público. Outro ponto, agora sobre a equipe técnica: Besson aqui reuniu de novo sua equipe própria, com quem trabalha há mais de 30 anos, como o diretor de fotografia Thierry Arbogast, o compositor de trilhas sonoras Éric Serra, a montadora Sylvie Landra, o designer de produção Dan Weil. Atenção para o figurino radicalmente extrovertido, do renomado estilista Gaultier, em uma de suas raras contribuições à Sétima Arte.
“O quinto elemento” estreou nos principais cinemas do mundo entre 7 e 30 de maio de 1997, como no Brasil, Estados Unidos, França, Canadá e Austrália. Em 2017 teve a restauração em 4K lançada em cinemas como Estados Unidos e Taiwan, muito bem recebida pelo público (e é essa a cópia em 4K que temos presente nessa edição da Obras-primas do Cinema). Vida longa ao cinema de Besson!

* Felipe Brida é jornalista e crítico de cinema, autor do livro “Cinema em Foco: Críticas selecionadas” (2013). Como crítico de cinema, mantém o blog Cinema na Web (de sua autoria, fundado em 2008), a coluna semanal “Cinema em Foco” (no jornal O Regional) e a coluna mensal “Middia Cinema” (na Revista Middia), além dos quadros semanais “Mais Cinema” (na Nova TV/TV Brasil) e “Palavra do Especialista – Cinema” (rádio Câmara de Bauru). Atua como palestrante em festivais de cinema em todo o Brasil e presta trabalho como curador e júri em festivais de cinema. É professor de Cinema, Comunicação e Artes no Senac, Fatec e Imes Catanduva (cidade onde reside). É pós-graduado em Artes Visuais pela Unicamp e Gestão Cultural pelo Centro Universitário Senac SP, e mestrando em Comunicação e Artes pela PUC-Campinas. Para contato: felipebb85@hotmail.com

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