Parthenope – Os
amores de Nápoles
Cineasta italiano nitidamente
influenciado por Federico Fellini, Paolo Sorrentino presenteou o mundo com o imaginativo
‘A grande beleza’ (2013), ganhador do Oscar de filme estrangeiro. Diretor, roteirista,
produtor, é uma das vozes mais autorais do cinema italiano atual, realizador de
‘Um homem a mais’ (2002), ‘As consequências do amor’ (2004) e ‘O divo’ (2008),
e depois com coproduções em outras terras, como EUA e Reino Unido, com astros
renomados, ‘Aqui é o meu lugar’ (2011, com Sean Penn), ‘Juventude’ (2015, com
Harvey Keitel e Michael Caine) e ‘A mão de Deus’ (2020), da Netflix, passando
por duas minisséries incríveis e questionadoras, que são continuação, ‘O jovem Papa’ (2016) e ‘O novo Papa’ (2020), ambas
com Jude Law. Agora chega aos cinemas brasileiros seu novo trabalho, um
Sorrentino de menor potência visual, mas ainda perspicaz, ‘Parthenope – Os
amores de Nápoles’ (2024), coprodução Itália e França, filmada na estonteante costa
de Nápoles e na vizinha ilha de Capri. Inspirado no mito grego de Partenope, a
virgem com face de menina, considerada sereia, a fundadora da cidade de
Neápolis, depois Nápoles, o drama acompanha 70 anos na vida de Parthenope (interpretada
por Celeste Dalla Porta na juventude e por Stefania Sandrelli na vida adulta).
Ela é uma belíssima jovem que chama a atenção por onde passa; nos anos 70, ela
vive intensamente em busca de prazer e liberdade, uma mulher à frente de seu
tempo. Em Nápoles, perambula em um hotel na beira do mar, onde conhece pessoas excêntricas,
apaixona-se e exibe seu corpo no mar resplandecente. Torna-se amiga de um
escritor deprimido e alcoólatra, John Cheever (sim, o verdadeiro contista
americano ganhador do Pulitzer, o ‘Chekov da América suburbana’, num papel de
Gary Oldman em momento brilhante) e tem um caso fugaz com um padre (Peppe
Lanzettaque) cujo estilo e adornos parece um mafioso – como sempre, Sorrentino destila
sua crítica feroz à igreja. Parthenope não pensa em julgamentos da sociedade,
crie seu estilo próprio de absorver os deleites da vida mundana. Belíssimo nas
locações, com roteiro ágil com seus personagens estranhos e caóticos, é um
Sorrentino a se conhecer – assisti numa sessão do Festival do Rio do ano
passado em que o público vibrou.
Indicado à Palma de Ouro
e vencedor de um prêmio especial em Cannes, é produzido pela A24, e no Brasil chega
aos cinemas pela Paris Filmes.
Código Alarum
Chega aos cinemas
brasileiros mais um filme de ação com Sylvester Stallone, só que dessa vez o
ator em papel meramente coadjuvante. Há dois meses a distribuidora Imagem
Filmes trouxe para cá ‘Blindado’ (2024), com ele e Jason Patric, e agora apresenta
‘Código Alarum’ (2025), protagonizado pelo filho de Clint Eastwood, Scott Eastwood,
de ‘Esquadrão suicida’ (2016). No pôster do longa adaptado para o Brasil chama
a atenção a atriz Isis Valverde, que tem uma participação pequenina em sua
estreia internacional. A trama, o que posso dizer, é sofrível... muito mais do
mesmo daquelas fitinhas corriqueiras de espionagem, com cenas rápidas de perseguição
e reviravoltas inconvincentes. Um casal de agentes secretos (Scott Eastwood e Willa
Fitzgerald, atriz de outra estreia da semana, o bom e tenso terror de psicopata
‘Desconhecidos’) abandona o mundo da espionagem. Durante as férias com uma
amiga em comum (Isis Valverde), os dois deparam-se com uma conspiração por
causa de um pendrive com informações ultraconfidenciais. Eles viram presas de
um grupo armado e perigoso, liderado por um agente da CIA em fim de carreira (Sylvester
Stallone). Com jeitão de filme B, daquelas antigas sessões noturnas do SBT e
Record, é um filme superficial, sem gosto, chamativo para nós por um único fato:
a participação de Isis representando o Brasil no cinema hollywoodiano. E fãs de
Stallone, uma notícia decepcionante: o veterano ator aparece minutos na tela,
no início e no desfecho, com ar de desprezo e cansaço.
O Bixiga é nosso!
Os documentários brasileiros
de cunho social estão em alta, e nesse ano já estrearam nos cinemas uma série de
filmes sobre luta e resistência de grupos sociais minoritários. ‘O Bixiga é
nosso!’ (2024), de Rubens Crispim Jr., é um deles e traz uma discussão que
perdura há quatro décadas no tradicional bairro paulistano: a destruição de
áreas patrimoniais por causa da especulação imobiliária e da instalação de grandes
empreendimentos comerciais. Em 1980, no bairro do Bixiga, fundado e ocupado por
imigrantes italianos, iniciou-se o processo de tombamento por apresentar uma
rica arquitetura e manter traços típicos da cultura da Itália. No local há
cantinas/tratorias, residências, comércio e a notória companhia de teatro que
revolucionou as artes, o Teatro Oficina, hoje Cia. Uzyna Uzona. A área ocupada
pela companhia está há décadas em disputa judicial com o Grupo Silvio Santos,
que quer construir ali prédios comerciais, o que descaracterizaria o patrimônio
cultural daquela região. E recentemente, em 2022, devido à escavação de túneis
para obras do metrô na Praça 14 Bis, uma revelação se apresentou: vestígios de
um quilombo urbano, de nome Saracura, um dos primeiros da capital, ou seja, mais
um motivo para a preservação do bairro. Assim, comunidades italianas, negras,
moradores e apoiadores se juntaram para uma luta incansável contra o apagamento
do bairro, com gritos de ‘O Bixiga é nosso!’. O doc reúne imagens das reuniões dos
grupos, de manifestações e momentos de lembrança e história do Bixiga, além de depoimentos
de ativistas, historiadores e moradores, com participação de integrantes de
movimentos populares como o Teatro Oficina, Mobiliza Saracura Vai Vai – a
escola de samba Vai Vai fica no bairro, Bloco Afro Ilu Oba de Min, Casa Mestre
Ananias e Museu do Bixiga. Teve a première na 13ª Mostra Ecofalante, em 2024, onde
recebeu o prêmio concedido pelo público. No dia 31 de março houve a pré-estreia
gratuita do filme em São Paulo, e entre os dias 03 e 09 de abril ficará em exibição
no Espaço Petrobras de Cinema (Rua Augusta, 1475 – Consolação, em São Paulo).
Enxuto com seus 73 minutos de duração, é um filme político, reflexivo e
contestador.

Todo dia é dia de
feira
Outro bom documentário
brasileiro na telona! ‘Todo dia é dia de feira’ faz um preciso registro sobre a
rotina de feirantes do Rio de Janeiro, com foco em quatro personagens da vida
real, Arnaldo, Luiz, Fernando e Cristina. Eles contam sua trajetória nas feiras
livres, e os vemos no incansável batente preparando pasteis e expondo itens
como flores e frutas que vendem nas barracas. É o agitado bastidor de uma
tradição ameaçada, seja pelo descaso das prefeituras e autoridades ou pela concorrência
desleal com mercados. Os feirantes usam da voz e da simpatia para chamar o
cliente, para eles há dias bons de vendas e há aqueles de prejuízo. Atualmente
as feiras livres são uma instituição nacional, um empreendimento popular e que
movimenta as economias formal e informal, e o filme demonstra essa força.
Frequentadora de feiras,
a diretora Silvia Fraiha dá protagonismo a essas pessoas anônimas que vivem da
venda diária de seus produtos nas barracas do Rio e é ela quem narra o filme. O
doc vai além, e não só dentro das feiras – a cineasta acompanha os quatro
protagonistas voltando para seus bairros nas comunidades do Rio de Janeiro, em
momentos privados com a família, que misturam alegria e sofrimento, mostrando o
ser humano com seus dilemas e a profunda desigualdade social no país. Apesar do
recorte ser no Rio, o filme representa todas as feiras livres que resistem pelo
Brasil afora, semelhantes no negócio e com histórias de vida parecidas. Gostei
muito e recomendo. Está nos principais cinemas brasileiros, com distribuição da
California Filmes.
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